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Maternês: a linguagem afetiva e seu papel no desenvolvimento da fala em bebês

Estimular a memória afetiva e facilitar o aprendizado são alguns dos benefícios, aponta especialista

Eva Pires

Deixar a voz mais aguda e cantada, encurtar ou adaptar palavras, mudar pronúncias e usar orações mais simples são tentações difíceis de resistir na hora de falar com bebês. Essa linguagem, conhecida como "maternês" ou "babytalk", inicia na gestação e é a primeira forma de comunicação entre mãe e bebê. Apesar de muitos a considerarem errada ou temerem que isso possa prejudicar o desenvolvimento da fala na infância, especialistas explicam que esse modo de falar pode ajudar a atrair a atenção do bebê, estimular a memória afetiva e facilitar o aprendizado da linguagem.

Conforme a fonoaudióloga Patrícia Holanda, no maternês, diferentemente da fala com adultos, são usados enunciados mais curtos e simples, redundantes, com pequenas palavras isoladas, como 'mamã' e 'papá', além de uma entonação mais carinhosa e afetiva.

"Essas diminuições de palavras e melodia mais carinhosa são facilitadores para os processos do desenvolvimento, como o balbucio e as primeiras palavras. O contato visual também é uma forma de comunicação muito importante entre mãe e bebê. Quando a criança presta atenção na forma de falar, ela observa a linguagem através da boca da mãe", afirma.

A especialista ainda revela que essa forma de comunicação afetiva não se limita apenas aos bebês. Estudos científicos já demonstraram que até mesmo adultos expostos a esse tipo de linguagem experimentam uma maior facilidade de memorização e reprodução.

image Andressa Botelho, de 30 anos, usa o maternês como uma das formas de se comunicar com a filha, Laura. (Carmem Helena / O Liberal)
O uso moderado do maternês facilita o desenvolvimento do bebê

De acordo com a especialista em linguagem, os bebês preferem ouvir o maternês, que estimula um desenvolvimento mais eficaz nessa fase em comparação com a linguagem dirigida aos adultos em uma conversa. "Eles têm uma resposta afetiva muito mais rápida, isso também se aplica inclusive para bebês surdos e neurodivergentes”, pontua.

As competências linguísticas sociocomunicativas, seja no maternês ou em linguagem formal, começam na família, mas a formalização da linguagem é influenciada pelas interações sociais da criança, especialmente ao entrar em ambientes educacionais como escola ou creche. Essa integração ajuda a equilibrar o processo de aquisição de linguagem, segundo a especialista.

A fonoaudióloga alerta também para o uso excessivo do maternês, que pode ser prejudicial à criança. "O uso excessivo dessa fala muitas vezes transcende sua função inicial de aquisição de linguagem, e torna-se um fator de alterações comportamentais. É crucial encontrar um equilíbrio para evitar que isso se torne uma superproteção ou impeça a criança de buscar autonomia. Se ela for constantemente tratada de forma infantilizada em todos os ambientes, isso pode trazer danos, pois ela tende a reproduzir o que aprende", informa.

image "O uso do maternês acontece com maior frequência quando estamos de chameguinho", diz Andressa, mãe de Laura. (Carmem Helena / O Liberal)
Comunicação e trocas afetivas desde a gestação

"Mamãe", "papai", "gato", "água" e "árvore". Essas foram as primeiras palavras da pequena Laura, de 2 anos, que hoje já surpreende a família com a formação de frases com a junção de quatro ou mais palavras. A mãe da bebê, Andressa Botelho, de 30 anos, usa o maternês como uma das formas de se comunicar com a filha e iniciou esse processo desde a gestação.

"Eu entendi que haviam muitas formas de me comunicar com ela desde a gestação. Após o seu nascimento, fazíamos muitas trocas na amamentação, por carinhos e conversas. Por mais que eu soubesse que ela não entendia tudo, eu percebia que ela sentia cada troca. O uso do maternês acontece com maior frequência quando estamos de chameguinho, quando digo, por exemplo : 'mamãe ama muito exa nhenhem', e ela responde com carinhos e sorrisos", diz.

Detalhar as atividades da rotina com a filha é uma das estratégias usadas pela estudante. "Desde a gravidez eu sempre tirava um tempinho para conversar com ela, contar as novidades, como nos sentíamos com a sua espera. Quando ela nasceu, eu mantive esse hábito e como passamos o dia juntas, conversamos sobre cada passo da rotina dela e as atividades realizadas", declara.

"Algo que tenho notado ser bem interessante é que sempre que voltamos de algum passeio ou atividade, conversamos sobre tudo que aconteceu. No início, eu sempre era a que falava, agora ela já tem contado por iniciativa própria tudo o que lembra e algumas percepções", completa.

Para a estudante, é essencial alternar entre diferentes tipos de linguagens para falar com a bebê, de acordo com a resposta à cada interação. "Eu utilizo bastante a linguagem mais interativa, e algumas vezes utilizo uma linguagem mais simples e clara. Em outros momentos utilizo uma fala mais tranquila, um pouco mais devagar. Geralmente observo a nossa interação para entender como guiar", explica.


Diferentes estratégias para estimular a fala

Como  incentivo à prática de novos sons e palavras, Andressa percebe que cantar as músicas, fazer leituras de livros, utilizar brinquedos interativos e educativos, ter diálogos em casa e o contato com outras crianças agregam muito na construção do vocabulário e da comunicação no geral.

"Ela fica super animada quando percebe que está tocando alguma música que gosta e faz todas as coreografias. Do mesmo jeito, quando o livro tem uma linguagem interativa, é bem divertido como ela observa e conta as histórias a partir das imagens e é frequente que as narrativas favoritas sejam repetidas inúmeras vezes", afirma.

Segundo a mãe, o principal marco do desenvolvimento da fala tem sido a extensão das frases com junção de até quatro ou mais palavras. "Nós não esperávamos que evoluísse tão rápido. Ela tem facilidade em aprender palavras novas e aumentar o vocabulário", conclui.

image Renata Brasil usa linguagem mais direta com a filha, Maria. (Arquivo pessoal)
A mistura do maternês com uma fala mais direta
Usar um tom mais carinhoso e agudo são as únicas características do maternês que Renata Brasil usa com Maria, uma bebê alegre de dois anos que adora dançar. A influencer digital conta que opta por uma fala mais direta, sem adaptar ou encurtar palavras.

"Eu sempre fui muito direta nas conversas com a Maria e sempre comuniquei as coisas como se ela estivesse entendendo tudo, como 'Mamãe vai trocar sua fralda agora' ou 'Você dormiu bem?'. É claro que a gente faz uma vozinha, né? É o que acho mais fofo e carinhoso. Mas eu não adapto nenhuma palavra, porque na minha cabeça isso ia ajudar lá na frente para que ela já soubesse a forma correta de falar", conta.

Devido à crença de que as telas poderiam contribuir para o desenvolvimento, Maria utilizou-as com frequência até quase um ano de idade. No entanto, assim que soube dos potenciais danos que o uso das telas pode causar no desenvolvimento infantil, a mãe decidiu restringir ao máximo essa exposição.
"Temi que isso fosse atrasar o começo da fala dela, mas ela ainda continuou dentro da faixa normal de desenvolvimento. Ela começou a falar com um ano e três meses e, a partir dos dois anos, desenrolou a língua de vez. Hoje ela fala o tempo inteiro", relata.

A mãe também destaca a importância de não corrigir a filha em momentos que ela fala "errado", para que o processo de aprendizado seja natural e sem constrangimento à bebê. "No começo ela ainda falava errado algumas coisas e eu não corrigia. Não queria que ela sentisse que eu a estava pressionando. Eu continuava falando correto e deixava ela à vontade para falar como quisesse, até ela mesma ir se corrigindo", conclui.

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