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Justiça Federal proíbe fechamento do PSM da 14 de Março, em Belém

Decisão aponta falta de justificativa técnica para o fechamento da unidade e questiona economicidade de repasses à iniciativa privada

Dilson Pimentel

A Justiça Federal proibiu o município de Belém de fechar, encerrar ou suspender as atividades do Hospital Pronto-Socorro Municipal (PSM) Mário Pinotti (o PSM da travessa 14 de Março ou PSM da 14). A decisão urgente, proferida na sexta-feira (19) e divulgada na segunda-feira (22), também suspendeu os editais da Secretaria Municipal de Saúde (Sesma) que buscavam a contratação de entidades privadas para a gestão de serviços de urgência e emergência.

A decisão acolhe pedidos da ação civil pública ajuizada conjuntamente, na última segunda-feira, pelo Ministério Público Federal (MPF), pela Defensoria Pública da União (DPU) e pelos Conselhos Regionais de Farmácia, Medicina, Odontologia e Psicologia no Pará contra o município de Belém e a União. Ainda de acordo com o MPF, um dos pontos centrais da decisão baseou-se em uma inspeção judicial realizada na manhã da última sexta-feira.

Segundo a decisão, na inspeção a juíza federal do caso, acompanhada de corpo técnico, constatou que não há risco estrutural iminente no imóvel que justifique sua interdição imediata ou desocupação por perigo de desabamento. A decisão destaca que é possível a coexistência de obras de reforma com a assistência hospitalar, contrariando a justificativa apresentada pela administração municipal para a "paralisação integral das atividades". A determinação ressalta ainda que as deficiências observadas (como falta de insumos, medicamentos e manutenção de equipamentos) “estariam mais relacionados à gestão deficiente dos recursos públicos”, e não à necessidade de obras civis que exijam o fechamento do prédio.

Precarização para privatização

A Justiça determinou a suspensão dos editais de chamamento público nº 02 e 03/2025, que preveem a paralisação integral das atividades e a interdição do prédio. O edital nº 02/2025, especificamente, previa também a contratação de pessoa jurídica de direito privado para gestão compartilhada dos serviços de urgência e emergência, com um valor anual estimado em R$ 111 milhões.

Na decisão, a Justiça Federal classificou a medida como um "verdadeiro contrassenso" e um ato antieconômico. Foi comparado o custo do contrato anual com a iniciativa privada (cerca de R$ 111 milhões) com o custo estimado para a construção de um novo hospital, informado durante a inspeção como sendo de R$ 190 milhões. "Portanto, em apenas um ano de contrato, o Poder Público iria repassar à iniciativa privada o equivalente a aproximadamente 60% do custo da aquisição do novo hospital", destacou a Justiça Federal, argumentando que tal repasse fere os princípios da boa gestão e do interesse público.

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A decisão registra que as instituições autoras da ação sustentaram que o PSM da 14, principal unidade de urgência e emergência da região Norte e custeado majoritariamente por recursos federais, passa por um processo deliberado de precarização. A ação judicial narra que a falta recorrente de insumos básicos (como luvas, gazes e antibióticos) não decorre de escassez financeira, mas de uma política de destinação prioritária de verbas federais à iniciativa privada.

A ação aponta, ainda, que há um direcionamento de recursos que beneficiaria desproporcionalmente um único ente particular, o Hospital Beneficente Portuguesa, em detrimento da rede pública. Segundo o MPF, DPU e conselhos profissionais, a tentativa de fechamento do PSM sob pretexto de reforma é uma estratégia para consolidar a transferência dos serviços para o setor privado, violando o princípio constitucional de que a atuação particular no Sistema Único de Saúde (SUS) deve ser apenas complementar.

Plano de recuperação - Além de proibir o fechamento da unidade e suspender os editais, a Justiça Federal ordenou que o Ministério da Saúde e a Sesma elaborem, no prazo de 30 dias, um plano de recuperação para o hospital. O plano deve prever a aplicação imediata e direta de recursos federais para regularizar o estoque de insumos e medicamentos, valorizar profissionais de saúde, melhorar a higiene e a salubridade, além de viabilizar a modernização tecnológica.

O plano deverá ser revisado a cada seis meses e ter como parâmetro as desconformidades apontadas nos relatórios de fiscalização dos conselhos de classe. A Justiça não acolheu, na decisão de caráter urgente, o pedido da ação para que fossem bloqueados novos repasses à iniciativa privada até que se atingisse a aplicação mínima de 50% dos recursos diretamente no hospital público. A Justiça ponderou que a interrupção abrupta desses repasses poderia agravar a desassistência à população e que a análise de eventuais desvios de finalidade exige uma apuração mais aprofundada durante o processo. Em nota, a Prefeitura de Belém informa que vai recorrer da decisão.