Ciúmes: até onde é normal e quando vira um crime? Conheça os sinais de alerta
Especialistas explicam os limites entre o ciúme “normal”, o transtorno psicológico e os comportamentos que configuram violência.

O ciúme é um sentimento humano natural, comum e vivenciado por qualquer pessoa em algum momento da vida, em diferentes tipos de relações, não somente amorosas, mas entre amigos, familiares e de outras ordens. No entanto, é preciso ter cuidado quando esse sentimento passa a causar grandes problemas emocionais e, em casos extremos, se torna crime.
Muitos crimes classificados como passionais têm como principal motivação esse sentimento descontrolado. Especialistas alertam para a importância de identificar atitudes abusivas desde o início e buscar ajuda. Reconhecer o ciúme doentio como um problema real é essencial para prevenir tragédias e promover relacionamentos mais saudáveis.
A psicóloga e sexóloga Amandda Albuquerque explica que, quando esse sentimento é reconhecido com maturidade, pode abrir espaço para diálogos importantes no relacionamento, ajudando a ajustar limites, fortalecer a confiança e esclarecer acordos que não estavam claramente expressos. “O que fortalece o relacionamento não é o ciúme em si, e sim como o casal lida com ele. Se houver abertura, respeito e comunicação, o ciúme pode ser uma oportunidade de crescimento mútuo”, explica a especialista.
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Diferente do ciúme, a insegurança é algo mais profundo e frequente, independentemente da situação externa. Ela dá origem a questões internas, como baixa autoestima, medo de rejeição ou experiências passadas. “A pessoa insegura tende a sentir ciúmes com mais frequência, mesmo sem motivos concretos”, acrescenta a especialista em relacionamentos e sexualidade.
A principal diferença entre ciúmes e insegurança é que o ciúme saudável é uma emoção momentânea diante de algo real, enquanto a insegurança é um estado interno que distorce a forma como a pessoa enxerga a si mesma e os vínculos que constrói.
Ciúme patológico: sinais de que algo está errado
O ciúme patológico, também conhecido como ciúme obsessivo ou excessivo, é um estado emocional caracterizado por um ciúme intenso e irracional, que causa sofrimento e afeta significativamente os relacionamentos. Trata-se de uma forma extrema, que ultrapassa o que seria um ciúme natural e saudável e passa a fazer parte da rotina de forma nociva, gerando sofrimento, controle excessivo e desgaste na relação.
“Se ele começa a aparecer com frequência, gerar brigas, desconfiança sem motivo, se vem acompanhado de tentativas de controlar o outro ou a vida da outra pessoa, aí já passou do saudável”, destaca Amandda Albuquerque.
O ciúme tóxico destrói a autoestima aos poucos. A pessoa começa a duvidar de si, sente que nunca é suficiente, vive com medo de errar, de ser mal interpretada, de ser deixada. Ela começa a deixar de ser quem é para caber na expectativa do outro.
“Com o tempo, vem o cansaço, a tristeza, a ansiedade, o sentimento de não valer nada. E isso não é amor. Amor não anula, não diminui, não controla. Amor real fortalece. Infelizmente, vira uma espécie de prisão emocional”, destaca a psicóloga.
Amor não é posse: quando o ciúme vira crime
Quando o ciúme ultrapassa os limites da legalidade, ele passa a configurar crime, especialmente quando se manifesta por meio de atitudes que violam os direitos da outra pessoa, como a liberdade, a dignidade e a integridade psicológica ou física.
Se esse sentimento resulta em ameaças, humilhações, perseguições, controle excessivo, invasão de privacidade, ofensas verbais ou agressões físicas, ele pode configurar violência psicológica, moral ou física, conforme os artigos 129 (lesão corporal), 147-A (perseguição ou “stalking”) e 147 (ameaça) do Código Penal.
Quando se trata de atitudes que ferem a honra e resultam em agressões contra a mulher, o ciúme pode se enquadrar na Lei Maria da Penha (art. 7º), conforme explica a advogada Tarita Cajazeira, presidente da Comissão das Mulheres e Advogadas da OAB-PA.
A Lei Maria da Penha, em seu art. 7º, inciso II, define como violência psicológica o controle de ações, comportamentos e decisões, além do isolamento da mulher de sua rede de apoio (amigos, família, colegas de trabalho, etc.).
“Esse tipo de comportamento tem por finalidade ou consequência a dominação e a perda de autonomia da vítima, o que é típico de relações abusivas. A jurisprudência e a doutrina feminista têm apontado que o isolamento é uma das estratégias mais perigosas do ciclo da violência doméstica, por impedir que a vítima procure ajuda”, ressalta a advogada.
A importância de procurar ajuda jurídica está em interromper o ciclo da violência, garantir proteção legal e evitar a escalada para agressões mais graves, inclusive o feminicídio. O suporte jurídico permite que a vítima conheça seus direitos, busque reparação e rompa com relações opressoras de forma segura.
A advogada Tarita Cajazeira explica que o ciúme ainda é culturalmente normalizado, sendo romantizado em músicas, novelas e discursos populares como sinal de “amor”. Isso dificulta que muitas vítimas reconheçam comportamentos abusivos como violência.
O controle emocional muitas vezes vem disfarçado de amor, em frases como “é só porque me importo”, “é que eu te amo demais”, “é por cuidado”. No fundo, o que existe é insegurança e necessidade de domínio.
“Se você sente ciúmes demais, isso não te faz uma pessoa ruim. Te faz alguém que está sentindo e que precisa olhar para isso com mais cuidado. É um pedido interno de ajuda. Não ignore”, alerta a psicóloga Amandda Albuquerque.
Sinais para ficar alerta
Quando o ciúme deixa de ser uma reação emocional e começa a se tornar um padrão de comportamento que sufoca, ele deixa de ser um sentimento normal. Alguns sinais são:
- Invasão de privacidade (mexer no celular, redes sociais, senhas);
- Isolamento social (afastamento de amigos, família, vida pessoal);
- Culpa constante;
- Discussões frequentes por motivos banais;
- Medo: de falar, de sair, de ser você.
(Riulen Ropan, estagiário de Jornalismo, sob supervisão de Enderson Oliveira, editor web de oliberal.com)
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