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Ernesto Araújo: Rússia tem estratégia de retomar a União Soviética

Ex-chefe da diplomacia brasileira no governo de Jair Bolsonaro acredita em alinhamento entre Rússia e China por novo cenário geopolítico global

Elisa Vaz
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Em entrevista ao Grupo Liberal, o ex-ministro das Relações Exteriores do Brasil, Ernesto Araújo afirmou que tem acompanhado com extrema preocupação as movimentações da Rússia e acredita que isso faz parte de uma estratégia do presidente Vladimir Putin em retomar hegemonia econômica, territorial e militar na região. E que o ataque e invasão à Ucrânia é apenas o primeiro passo para novas ofensivas. 

Analisando semelhanças e diferenças, o ex-ministro Ernesto Araújo vê sinais, hoje, de que os conflitos entre Rússia e Ucrânia possam gerar tensões similares às vistas no período pré-Segunda Guerra Mundial. Alguns dos paralelos que podem ser colocados, segundo ele, são a agressividade e a justificativa da invasão para proteger populações dentro da Ucrânia. Ele lembra que esse foi um dos motivos postos pela Alemanha Nazista no final da década de 1930. O fato de que uma invasão nessa proporção não era vista desde meados do século passado, para o ex-ministro, mostra a gravidade da situação atual.

Rússia quer uma conquista territorial?

O que acontece agora na Europa, explica, é uma “guerra de conquista onde um país mais forte está tentando tomar o controle de um país mais fraco”, atacando sua capital e todos os pontos de interesse estratégico, e querendo “tomar territorialmente esse país em uma operação de conquista”. O plano, segundo ele, é a expansão do poder e da influência da Rússia por toda a Europa, além da reconstrução de espaço da União Soviética, seja por meio de anexação direta ou por meio de influência política e econômica, ou seja, anexação mais informal.

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Um dos pontos mais preocupantes, de acordo com Ernesto, é a falta de uma estratégia traçada pelos países do Ocidente. “Não sabemos exatamente e em detalhes qual o plano do Putin, mas temos que partir do pressuposto de que existe. Tudo indica que haja uma estratégia. A Rússia há muito tempo está se preparando para esse tipo de operação. Então temos que estar atentos para o fato de que isso não irá parar na Ucrânia. Acho que Putin já tem previsto qual é o próximo movimento e o Ocidente está olhando e reagindo a cada movimento dele sem ter uma estratégia. É um grande problema porque Putin tem uma estratégia tanto do ponto de vista militar, como, até mais importante, o político, do ponto de vista da guerra psicológica, isso está acontecendo também. Temos que tentar começar a adivinhar, a partir dos atos da Rússia, qual é o plano, e acho que o plano não é bom para nós”, declara.

Uma possível reconstrução da União Soviética precisa ser vista não apenas pelo aspecto territorial, mas pelo conceitual, diz Ernesto. Isso significa pensar no mundo como um todo e na projeção da Rússia na esfera da política externa. O ex-ministro ressalta que “assim como a URSS queria, no fundo, implantar o comunismo no mundo todo, estou cada vez mais convencido de que a Rússia, em associação com a China, quer implantar algum tipo de totalitarismo no mundo todo”.

Movimentos totalitários

O diplomata destaca ainda que vê o mesmo movimento, mas ainda na esfera ideológica e política, em outras frentes do mundo. "Isso também está acontecendo na América Latina. Nossos países vizinhos são todos hoje, praticamente, objeto do Foro de São Paulo, das correntes e dos partidos ditos de esquerda, junto com o narcotráfico, como crime organizado e o terrorismo. Na Colômbia, por exemplo, esse conluio é muito claro, muito organizado e estão tomando conta com o apoio russo e apoio chinês. Isso não é dito só por mim, mas por analistas. A invasão da Ucrânia reforça o poder da Rússia e ao passo que isso reforça quem ela apoia aqui na América Latina. Por isso tudo é muito grave e interessa para nós, nas nossas fronteiras", disse, citando o Foro de São Paulo, uma organização criada na década de 1990, que reúne partidos e diversos tipos de organizações da América Latina e Caribe para promover ações que formariam uma estratégia de contraponto à política neoliberal. O grupo é tema de frequentes polêmicas e diferentes visões por apoiadores e críticos.

O alinhamento apontado pelo ex-ministro entre Rússia e China pode também desencadear outras ações orquestradas. Para ele, é alta a chance de uma invasão militar chinesa contra Taiwan. “Isso pode acontecer. Existe uma possibilidade alta. O ocidente mostra que não tem capacidade de reagir à invasão russa à Ucrânia. Com Taiwan é diferente, já existe uma presença militar. Mas, avaliando o cenário, a China percebe essa fragilidade e dúvida existencial do Ocidente, as atenções voltadas para a Ucrânia e pode ser o momento. Mesmo sem invasão, a China já aumenta sua influência nos países asiáticos próximos. E a política da China é essa hoje: olha, os Estados Unidos está lá longe e não está conseguindo defender, então você tem que fazer o que eu quero", avalia.

Críticas ao governo Bolsonaro

Mesmo tendo integrado o governo Bolsonaro entre janeiro de 2019 e março de 2021, Ernesto fez críticas quanto ao posicionamento adotado nos primeiros dias após o início da invasão militar, que ocorreu apenas alguns dias após a missão diplomática do presidente brasileiro à Rússia. “A visita de Bolsonaro a Moscou foi lida por quase todos os países do mundo como uma espécie de apoio à Rússia, no momento em que ainda não tinha acontecido a invasão, mas era iminente. Naquele momento, fazer a visita era um gesto, mas fazer a visita e expressar solidariedade, não fazer nenhum gesto paralelo em relação à Ucrânia e ainda ter na visita o componente militar da defesa como principal, tudo isso faz o Brasil estar do lado da Rússia”, pontua.

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Como a Rússia, por ser um dos cinco países com assento permanente no Conselho, tem poder de veto, a resolução não foi aprovada

Além do mais, mesmo após o início dos conflitos armados, o presidente brasileiro optou por não condenar as ações da Rússia, o que, para o ex-ministro de Relações Exteriores, não passa a imagem de neutralidade, mas reforça a escolha do Brasil por um lado. “Não digo que existe, mas em política exterior a gente tem que estar sempre atento às imagens que a gente está passando”, diz. Ao mesmo tempo, Ernesto não acredita que o país deva ficar isolado, mas defende que aproximações e alinhamentos partem de valores e interesses, e é preciso avaliar quais parceiros estão mais próximos e quais mais distantes desses princípios. “Aqui, princípios clássicos da diplomacia, como a não intervenção e a defesa da soberania, estão sendo violados pela Rússia. Então não é neutro. A neutralidade absoluta e completa não é um princípio”, disse.

Caso o Brasil esteja indo para o lado da abstenção por conta das relações comerciais com a Rússia – o principal produto de exportação ao Brasil são os fertilizantes, utilizados largamente na agricultura – Ernesto também discorda da postura, afirmando que o país estaria passando um sinal de fraqueza para as outras nações. O ex-ministro ainda diz que espera, nos próximos dias, ver Bolsonaro condenando a invasão da Rússia sobre a Ucrânia, algo que, para ele, seria compatível com os princípios do presidente, de seu governo e da política externa do Brasil. Na avaliação dele, apenas uma pressão maior sobre o presidente russo poderia fazê-lo recuar. De fato, na sexta-feira pela noite, após a realização desta entrevista, o Brasil pela primeira vez, se manifestou oficialmente. O embaixador do Brasil na Organização das Nações Unidas (ONU), Ronaldo Costa Filho, disse que o Conselho de Segurança deve agir urgentemente diante da agressão da Rússia contra a Ucrânia.

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