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Cazetta sobre Lava Jato: 'Houve trabalho sério e precisa ser respeitado'

Presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, Ubiratan Cazetta fala sobre força-tarefa criada na AGU para investigar agentes públicos envolvidos na operação Lava Jato e critica acusação de Dias Toffoli: ‘não é razoável dizer que houve tortura no processo’

Keila Ferreira
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A decisão do ministro Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli de anular provas do acordo de leniência da Odebrecht, atendendo a um pedido da defesa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), não chega a ser uma novidade, mas gerou reação entre membros do Ministério Público pelo seu complemento: Toffoli acusou membros da força-tarefa da Lava Jato de terem praticado “tortura psicológica” para obter provas de pessoas “inocentes” e determinou que agentes públicos envolvidos no acordo fossem investigados.

De acordo com a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), no que se refere aos procuradores, essa apuração já foi feita pela Corregedoria-Geral do Ministério Público, que chegou à conclusão de que não havia irregularidade no acordo. “A avaliação já está no Supremo. Já foi apurado. Pode ter havido erros (durante a operação) em razão da suspeita de Moro (Sergio Moro, ex-juiz e atual senador), por conta dos processos terem ficado em Curitiba, mas são problemas processuais, que não querem dizer que alguém cometeu crime. Apuração já foi feita e não há nenhum indicativo que houve desvio funcional”, declarou o presidente da entidade, Ubiratan Cazetta, em entrevista ao Grupo Liberal.

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AGU anunciou força-tarefa para apurar supostos desvios

Apesar disso, no mesmo dia em que a decisão de Toffoli foi divulgada, em 6 de setembro, a Advocacia-Geral da União (AGU) informou que vai tomar providências e anunciou a criação de uma força-tarefa para “apurar desvios de agentes públicos e promover a reparação de danos causados” por decisões contra Lula proferidas pelo Juízo da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba/PR, bem como por membros do Ministério Público Federal no âmbito da operação Lava Jato.

Em matéria publicada no próprio site, a AGU segue afirmando que o grupo a ser criado “analisará a conduta de procuradores da República e membros do Poder Judiciário durante a instrução e julgamento de casos da então operação Lava Jato”. Diz ainda que, após a devida apuração, “poderá ser cobrado dos agentes públicos, em ação regressiva, o ressarcimento à União relativo às indenizações pagas, sem prejuízo da oportuna apuração de danos causados diretamente à União pelas condutas desses agentes”.

Cazetta ressalta que tanto a AGU quanto o Tribunal de Contas da União (TCU) – que já apresentou decisões contra procuradores que atuaram na Lava Jato – não têm atribuição para investigar membros do Ministério Público e do Judiciário. “Acho que até hoje não há nenhum sinal de que a AGU discorde disso”.

ANPR rebate acusação de Toffoli: ‘Não é razoável dizer que houve tortura’

Na decisão da ultima quarta-feira (6), Dias Toffoli afirmou que a prisão de Lula foi “armação” e um erro histórico. Declarou ainda que "sob objetivos aparentemente corretos e necessários, mas sem respeito à verdade factual”, os agentes que participaram os acordo desrespeitaram o devido processo legal, descumpriram decisões judiciais superiores, subverteram provas e agiram com parcialidade fora de sua esfera de competência. “Enfim, em última análise, não distinguiram, propositadamente, inocentes de criminosos. Valeram-se, como já disse em julgamento da Segunda Turma, de uma verdadeira tortura psicológica, um pau de arara do século XXI, para obter ‘provas’ contra inocentes", declarou Toffoli.

Questionado sobre as declarações do ministro, Ubiratan Cazetta informou que, antes mesmo da decisão de Dias Toffoli, a ANPR já defendia que fosse evitada qualquer manifestação que fugisse da objetividade. O procurador afirma que o Judiciário precisa se posicionar de maneira objetiva, “fugindo de qualquer polarização. Não é razoável que sem nenhum tipo de prova e elementos, você afirme que houve crime de tortura nesse processo”. Ele atenta que há o risco de perder “até a importância desse conceito, que é da tortura. Quando se banaliza isso, tira-se a gravidade, o significado perde valor”, continua o procurador. “Quais são os elementos concretos que me permitem afirmar que houve tortura? Nenhum. Não dá pra fazer afirmações com elementos retóricos porque faz mal até pra própria sociedade”, completa.
Em nota publicada no site da ANPR, na última semana, a entidade já defendia que a discussão em torno da operação Lava Jato fosse pautada por uma “análise técnica, objetiva, que preserve as instituições e não se renda ao ambiente de polarização e de retórica que impede a compreensão da realidade”. Para a associação, “não é razoável, a partir de afirmação de vícios processuais decorrentes da suspeição do juízo ou da sua incompetência, pretender-se imputar a agentes públicos, sem qualquer elemento mínimo, a prática do crime de tortura ou mesmo a intenção deliberada de causar prejuízo ao Estado brasileiro”.

O procurador Ubiratan Cazetta, que atuou por vários anos no Ministério Público Federal no Pará, também defende o trabalho dos membros do Ministério Público que atuaram na operação Lava Jato e lembra que ela resultou em centenas de processos. “Não podemos generalizar. Há pessoas que dedicaram sete anos de sua vida a um trabalho sério. Podem ter ocorrido erros, mas se ocorreram, foram em casos bem pontuais. Mas não podem ser usados para colocar toda uma categoria sob suspeição como se fossem pessoas desonestas. Houve trabalho sério e precisa ser respeitado”.

Acordo de leniência com a Odebrecht está mantido

A ANPR e a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) entrarão com recurso contra a decisão do ministro Dias Toffoli para esclarecer alguns pontos e garantir que ela seja válida naquilo que é o seu objeto central, delimitando assim o alcance do despacho. Todas as provas obtidas por meio de acesso aos sistemas Drousys e Mywebday, mantidos pela Odebrecht, foram anuladas.

Ubiratan Cazetta lembra que já havia uma decisão nesse sentido do ministro Ricardo Lewandowski. O que houve, segundo o procurador, foi uma “ampliação” disso, para dizer que a prova é nula para todos os processos, ou seja, os juízes terão que analisar aqueles em que houve uso dos dois sistemas. “Não é novidade, o entendimento em si, mas a extensão para todos os processos”, explica.

“O acordo de leniência em si da Odebrecht continua válido. O que não é válido é um pequeno detalhe desse acordo, que é o uso processual das provas obtidas por esses sistemas”, continua.

Para a associação, não é correto afirmar que o acesso aos sistemas Drousys e Mywebday, mantidos pela Odebrecht para registrar o pagamento de propina, descumpriu o procedimento formal de cooperação internacional. Apesar de discordar do motivo pelo qual as provas foram consideradas nulas, Cazetta entende que a determinação de Toffoli “dá racionalidade” à decisão tomada anteriormente. “Em relação ao acordo de leniência, ele continua válido, nem sequer era o objeto da reclamação”.

A ANPR deve ajuizar um recurso no Supremo no início da próxima semana e o processo será availida pela Segunda Turma da Corte. Ela é composta por Toffoli e pelos ministros Gilmar Mendes, Edson Fachin, Nunes Marques e André Mendonça.

 

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