Santarém não pode sepultar mortos nos três cemitérios públicos; entenda

Liminar proibiu enterros após irregularidades serem apontadas. Prefeitura está custeando vagas em dois cemitérios particulares

Ândria Almeida
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O município de Santarém, como aponta o IBGE, tem uma população estimada em 308.339 pessoas. E a cidade só tem cinco cemitérios, sendo dois particulares. No dia 24 de setembro, uma liminar apontou irregularidades nas três necrópoles públicas: Nossa Senhora dos Mártires, São João Batista e São Sebastião/Mararu. Os sepultamentos estão suspensos.

A interdição atendeu ao pedido de Raimundo Nonato Sousa Castro que, em ação popular, solicitou a medida alegando indícios de algumas irregularidades: ausência de licenciamento ambiental, superlotação e falta de controle na documentação dos entes sepultados, em especial certidão de óbito.

O juiz Cleytoney Passos Ferreira, titular da 6ª Vara Cível e Empresarial de Santarém, estabeleceu multa diária de R$ 50 mil para cada sepultamento após a intimação. O município ficou obrigado a providenciar o enterro de pessoas mais pobres em cemitérios particulares enquanto vigorar a interdição dos cemitérios públicos. Mesmo quem tem jazigo, pela ação, não poderá fazer sepultamento nos locais interditados.

Em entrevista para a Redação Integrada de O Liberal, a professora Lúcia Joseph, que tem jazigo há mais de 15 anos, em um dos cemitérios interditados, disse estar inconformada. "Eu estou achando ridículo e fiquei muito constrangida. Veja bem, eu e mais outras pessoas que temos jazigo no cemitério, investimos para que a gente possa ficar com os nossos entes queridos no dia da partida. Agora vem essa decisão e proíbe. Eu não quero isso. Quero ficar com meu esposo que já está lá”, reclamou.

Dados do Portal da Transparência do Registro Civil Brasileiro apontam que no mês da suspensão dos sepultamentos, foram registrados 151 óbitos. Em outubro já são 71, até o momento. Elismar da Conceição, que é coveiro há 12 anos em um dos cemitérios interditados, a superlotação vem de longa data. "Antigamente, a prefeitura vendia para uso futuro o título de perpetuidade. Nisso, muitas sepulturas foram compradas e não foram construídas", relatou.

 

Sem licença e com risco de danos ambientais e à saúde pública

Na decisão liminar, o magistrado reconhece que os cemitérios públicos não possuem licenciamento ambiental e a prefeitura não os regularizou. Isso deveria ter iniciado em 2010. Além disso, foi constatado que as irregularidades podem gerar danos tanto ao meio ambiente quanto à saúde pública da população.

Para o engenheiro ambiental Edinelson Saldanha, doutor em ciências ambientais, é necessário trabalhar o licenciamento ambiental para se ter uma resposta se o cemitério poderá ser reativado. Ele explicou sobre a contaminação gerada pelo chorume que pode chegar a poços artesianos.

"É semelhante ao lixo orgânico de casa quando começa a gerar o estado de putrefação, mas aqui estamos falando de organismos vivos, então, temos características diferentes. Vai gerar o chorume, porém, com propriedades químicas diferentes, capaz de chegar até o solo e lençóis freáticos da área", disse o engenheiro.

Edinelson enfatiza que essa contaminação gera o que se chama de plumas de contaminação. Tendo uma direção preferencial de deslocamento, por ser um cemitério muito antigo, onde muitas pessoas não foram sepultadas de forma correta, em gavetões, a decomposição gera contaminação nessa área.

"Pelo declive da área, se imagina que a contaminação vá para o rio Tapajós, mas ela pode se espalhar ao longo de toda essa área. Quem tem poço aqui, teria que ter um monitoramento da qualidade da água no que se refere aos parâmetros físicos, químicos e biológicos", pontua. Uma solução apontada pelo engenheiro seria uma gaveta impermeável para os que já tem jazigo nos cemitérios, algo que já ocorre em alguns jazigos.

image Para regularizar definitivamente a demanda por sepulturas, Santarém estuda a criação de um quarto cemitério público (Ândria Almeida / O Liberal)

Prefeitura recorre com defesa do direito de quem comprou jazigos

A Prefeitura de Santarém ingressou com recurso contra a decisão judicial. O pedido liminar será analisado pelo Desembargador Luiz Gonzaga da Costa Neto, no entanto não há prazo para decidir.

No recurso, a Procuradoria Geral de Santarém argumenta que houve vendas de jazigos particulares e, por isso, a decisão afeta o direito de propriedade dessas famílias que, por enquanto, não poderão enterrar seus entes queridos junto dos demais familiares.

Outro argumento também é a Lei Complementar 173/2020, que impede aumento de despesas pelo poder público, o que incluiria os sepultamentos particulares. Os valores cobrados diretamente pelos cemitérios particulares seriam inacessíveis a cerca de 90% da população santarena.

A procuradora-geral do município, Paula Piazza, relatou que o município vem cumprindo a decisão, ou seja, proibindo os sepultamentos nos três cemitérios. Com a proibição dos sepultamentos, as pessoas que são consideradas pobres pela forma da lei, a liminar obrigou que o município arque com os custos em caso de óbitos.

“Santarém tem dois cemitérios particulares que estão sendo procurados pelo município para esses sepultamentos. Ambos os cemitérios, por meio de decreto do executivo, já têm a obrigação de fornecer uma contrapartida para o município, que está sendo utilizada para o cumprimento dessa decisão judicial, então, nesse sentido ninguém está descoberto", reforça Paula.

Para sanar as supostas irregularidades, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente, afirmou a procuradora, está fazendo estudos para viabilizar todas as licenças necessárias. Ao mesmo tempo, um quarto cemitério público poderá ser construído em Santarém.

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