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Tarifaço: queda no preço da carne bovina no Pará é inevitável, mas deve demorar a chegar ao varejo

Com a iminência da taxação norte-americana sobre carne brasileira, o mercado paraense pode ter uma redução no preço da carne, mas representantes de setores ainda têm dúvidas sobre a chegada dessa queda no varejo local.

Jéssica Nascimento e Vitória Galvão| Especial para O Liberal

O impacto das tarifas norte-americanas sobre a carne bovina, que começam em 6º de agosto, tem gerado expectativas entre os setores econômicos paraenses. A recente retração de preços no atacado pode, finalmente, ser refletida nas prateleiras do varejo, mas o caminho até a redução efetiva nos supermercados ainda está longe de ser claro. Representantes de setores da economia do Pará ouvidos pelo Grupo Liberal apontam que a transição entre os mercados pode ser mais lenta do que muitos esperam. O decreto do tarifaço foi assinado pelo presidente norte-americano, Donald Trump, na quarta-feira (30/7).

A queda nos preços do atacado: quando chegará ao varejo?

Conforme dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA), da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da USP, as principais commodities brasileiras exportadas aos Estados Unidos vêm registrando queda, em contraste com a alta verificada no mercado norte-americano. O destaque ficou para a carne bovina. Só em julho, o preço em dólar para o boi gordo caiu 8,05%.

image (Ivan Duarte / O Liberal)

Na mesma direção, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA-15) de julho de 2025 indicou um recuo nos preços de vários cortes de carne bovina em Belém. Foi o caso do fígado (-1,76%), contrafilé (-1,02%), filé-mignon (-2,15%), alcatra (-1%), patinho (-0,29%), músculo (-3,47%) e capa de filé (-1,6%).

Segundo Everson Costa, supervisor técnico do Dieese/PA (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), a redução no preço da carne no varejo já é uma realidade desde junho, mas de forma mais concentrada nos cortes populares. 

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"A carne de primeira, como chã, paulista e cabeça de lombo, tem mostrado uma queda mais significativa. Mas cortes mais nobres, como filé mignon e picanha, não acompanharam a mesma redução", afirma Costa. 

Ele acrescenta que o processo de queda de preços no segundo semestre tende a se intensificar, mas o efeito não será linear.

O impacto das tarifas de Trump: a lenta transição dos preços

Segundo Everson Costa, a aplicação das tarifas de Trump, que reduziriam a competitividade da carne brasileira no mercado externo, está criando uma situação onde mais carne ficará disponível no mercado interno. Isso poderia, teoricamente, reduzir os preços. No entanto, para ele, a complexidade do setor de carnes, tanto no Brasil quanto no Pará, faz com que o efeito dessa mudança seja mais lento.

Jorge Portugal, presidente da Aspas (Associação Paraense de Supermercados), observa que, até o momento, não houve reflexo direto da redução na exportação de carne nos preços no mercado interno

"Se houver uma redução de preços no atacado, ela será repassada imediatamente ao consumidor, tanto no varejo quanto no atacado", diz Portugal. 

No entanto, Portugal admite que, por enquanto, o cenário permanece estável, com preços mantidos há quase um ano.

Fatores regionais: como a logística e a sazonalidade influenciam o preço

Para Genardo Oliveira, economista paraense, a estrutura de custos fixos, como o transporte rodoviário (que representa cerca de 30% do custo final da carne), dificulta o repasse imediato da queda dos preços. Além disso, as festividades regionais e o aumento da demanda por carne durante o Círio de Nazaré e outros eventos tornam o mercado local mais sensível a essas variações.

Genardo destaca que a cadeia de distribuição no Pará tem um efeito de defasagem temporal. 

"Supermercados mantêm estoques de 15 a 20 dias, o que significa que o preço da carne no atacado pode começar a cair agora, mas o efeito real no varejo só será sentido em setembro ou outubro", afirma Oliveira. 

Ele também alerta para o comportamento oligopolista das grandes redes de supermercados, que controlam 65% do mercado local e podem adotar estratégias para manter as margens de lucro mesmo diante da redução dos preços.

Para o administrador de açougue da região metropolitana de Belém, Elson Cardoso, o valor da carne permanece estável e não observou nenhuma variação desde o anúncio do “Tarifaço”. Segundo Cardoso, “A gente ainda não sentiu nenhuma diferença, mas estamos esperando desde o anúncio, porque vai acontecer”.

 Apesar da imprecisão de quando irá acontecer, os funcionários do açougue já esperam que no início do mês de agosto ocorram quedas no valor das carnes. Luiz Barroso, gerente do mesmo local, declara incerteza nos preços e dificuldade em manter as peças em um valor acessível para o consumidor, mas espera diminuição nos preços já na nova remessa de carnes esperadas para receber ainda nesta primeira semana do mês de agosto.

A expectativa de queda: quando será perceptível para o consumidor?

Apesar da expectativa de que os preços de alguns cortes de carne possam cair nos próximos meses, a realidade é que a redução será gradual e seletiva

Segundo Genardo Oliveira, de acordo com os padrões históricos observados no Pará, para cada 10% de queda no preço do boi gordo, o repasse ao consumidor é de apenas 4,2%, e isso leva cerca de 45 a 60 dias para acontecer.

Oliveira acredita que os cortes populares, como paleta e acém, poderão registrar uma queda de 6% a 8% até setembro, enquanto os cortes premium, como filé mignon e picanha, manterão seus preços. 

Além disso, o economista destaca que as feiras livres tendem a repassar de 70% a 80% da queda no preço, enquanto os supermercados repassam apenas 40% dessa redução.

Em um cenário mais otimista, se as tarifas de Trump se prolongarem além de novembro, a pressão deflacionária no mercado interno pode intensificar a redução nos preços da carne, conforme a análise de Oliveira. 

"A oferta interna de carne aumentará, o que poderá forçar uma queda maior nos preços", afirma o economista. 

No entanto, ele alerta que a probabilidade de uma queda de mais de 12% nos preços no varejo é baixa, dado o impacto de custos não-comoditizados, como mão de obra e energia.

Queda do preço depende de vários fatores

O economista Nélio Bordalo Filho aponta que a queda no preço da arroba da carne bovina nem sempre chega rapidamente ao consumidor final no Pará.

"A transmissão dessa queda depende de vários fatores, como o tempo de resposta da cadeia de distribuição, incluindo frigoríficos, atacadistas e varejistas, que muitas vezes operam com estoques comprados a preços mais altos", explica Bordalo Filho, que é também consultor de empresas e conselheiro do CORECON PA/AP (Conselho Regional de Economia dos Estados do Pará e Amapá).

Ele afirmou que a defasagem de tempo no repasse pode ser em média de 30 dias.

O impacto das tarifas externas e a competição no mercado local

Segundo o economista, fatores externos como a expectativa de tarifas norte-americanas podem gerar um excedente no mercado interno, pressionando os preços para baixo. 

No entanto, a realidade do mercado paraense, com baixa concorrência em algumas regiões e custos logísticos elevados, faz com que os repasses de queda de preços no varejo sejam lentos e, muitas vezes, parciais. 

"Historicamente, o setor varejista no Pará é mais lento para repassar reduções de preços do que elevações", conclui Bordalo Filho.

 

 

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