'Atitude de auto-humilhação para evitar o pior não é correta', diz Celso Amorim sobre tarifaço
Assessor de Lula critica exigências “inaceitáveis” de Trump e defende reação cautelosa do Brasil à crise do tarifaço

O assessor especial para Assuntos Internacionais da Presidência da República, Celso Amorim, afirmou nesta segunda-feira (11), em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, que o Brasil se “auto-humilhar” diante do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, não seria a atitude correta a adotar na crise do tarifaço.
“Uma atitude de auto-humilhação para evitar o pior não é correta. Nós não estamos sendo arrogantes. Pelo contrário, houve várias tentativas de contato”, disse Amorim.
O assessor especial também declarou que não acredita que os Estados Unidos irão aplicar uma sobretaxa de 50% sobre produtos brasileiros. Porém, diante da possibilidade, afirmou que o Planalto “tem pensado em tudo o que é necessário fazer”.
“É um absurdo tão grande que me recuso a acreditar. Mas estaremos preparados. O governo tem pensado em tudo o que é necessário fazer”, declarou.
Amorim avaliou que as exigências de Trump são “inaceitáveis de propósito” para justificar um agravamento das tensões por parte de Washington e ressaltou a postura cautelosa do Itamaraty. Ele também criticou brasileiros que, segundo ele, possuem uma “mentalidade de dependência” diante da crise tarifária.
“No Brasil, muita gente tem uma mentalidade de dependência. Tudo o que os americanos criticam e acham ruim passa a ser algo amedrontador aqui. Acho que a gente não pode se curvar. Falamos em defesa da integridade territorial, mas também precisamos defender a integridade da dignidade nacional”, afirmou.
Interesse da extrema direita
Segundo o assessor especial, por trás do tarifaço há uma ação articulada pela extrema direita dos Estados Unidos e pelo ideólogo Steve Bannon, que buscaria “desestabilizar o Brasil”.
“Eu não atribuiria todo o poder ao [ex-presidente Jair] Bolsonaro. Há um desejo da extrema direita dos Estados Unidos, dirigida por Steve Bannon, de realmente desestabilizar o Brasil. Temos que estar conscientes disso”, disse.
Amorim relatou que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, lhe disse que o governo não está tendo facilidade para se comunicar com o centro do poder em Washington. Segundo o assessor, os canais de comunicação não estão fechados por parte do Brasil.
“Da nossa parte, os canais não estão fechados. Mas o próprio ministro me falou que, aparentemente, não há facilidade para contatar quem decide as coisas nos Estados Unidos”, afirmou.
O diplomata também declarou que a Organização Mundial do Comércio (OMC) precisa ser “testada”, mas reconheceu que o órgão enfrenta limitações provocadas por vetos dos EUA à nomeação de juízes. Amorim disse ainda que a crise com os norte-americanos é a situação mais complexa com a qual lidou em seis décadas de carreira diplomática.
“É o mais complexo em muitos sentidos. O mundo está vivendo uma situação em que já há duas guerras com potencial de se tornarem conflitos globais”, avaliou.
Amorim defendeu que os países do Brics aumentem o comércio em moedas locais, reduzindo a dependência do dólar. Para ele, trata-se de um processo natural, independente da vontade de líderes como Trump.
“Vai acontecer, e é bom que aconteça. Isso ocorrerá até independentemente da vontade dos governantes, pela forma como as relações econômicas estão se estruturando. A aceitação do dólar como moeda de reserva para todos está ligada ao sistema multilateral, não surgiu por acaso”, explicou.
Ele afirmou ainda que o Brasil não busca uma ação em bloco contra o tarifaço nas conversas com líderes do Brics. Segundo Amorim, o objetivo é trocar experiências e discutir formas de defesa do multilateralismo.
“O Brasil não necessariamente está procurando uma ação conjunta. Mas trocar experiências, ideias e saber como reagir e defender o multilateralismo é natural. Um dos objetivos dos Brics é justamente defender o multilateralismo”, disse.
Desde que a tarifa de 50% sobre produtos brasileiros entrou em vigor, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem conversado com líderes do Brics sobre as investidas de Trump. Na quinta-feira (7), ele ligou para o primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi. No sábado (9), foi o presidente da Rússia, Vladimir Putin, quem entrou em contato com o petista.
Nesta segunda-feira (11), Lula telefonou para o premiê chinês, Xi Jinping. Em entrevistas, o presidente defendeu uma ação conjunta dos Brics como resposta ao tarifaço imposto pelos Estados Unidos.
Palavras-chave
COMPARTILHE ESSA NOTÍCIA