Memórias da Guerrilha do Araguaia revisitadas em peça teatral

Espetáculo conta a história de 12 mulheres que lutaram e morreram num dos conflitos mais violentos da história do País

Lucas Costa
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A Guerrilha do Araguaia, tentativa de ação revolucionária que deixou cicatrizes em cidades da região norte, é tema do espetáculo “Guerrilheiras ou Para a Terra Não Há Desaparecidos”, da atriz e pesquisadora carioca Gabriela Carneiro da Cunha. A peça, que está itinerando pela Amazônia, chega à Belém para apresentações nesta quinta e sexta-feira (22 e 23), sempre às 20h, no Teatro Waldemar Henrique.

O espetáculo faz parte de um projeto de pesquisa chamado “Margens – sobre rios, boiúnas e vagalumes”, que se constitui em trabalhos de artes integradas criados segundo o testemunho de rios brasileiros. “Guerrilhas ou Para a Terra Não Há Desaparecidos” foi o primeiro espetáculo resultante do projeto, e se constituiu a partir das memórias do Rio Araguaia, e da história de 12 mulheres que lutaram e morreram em um dos mais violentos conflitos armados da ditadura militar brasileira, a guerrilha do Araguaia.

Gabriela explica que o processo desde o início da pesquisa, até a concepção de cada espetáculo, leva pelo menos três anos. Isso tudo inclui ainda uma etapa de trabalho de campo, onde as pesquisadoras coletam depoimentos.

“A gente veio cinco anos atrás fazer a pesquisa, com a ajuda do Paulinho Fonteles, que faleceu. Toda essa circulação é dedicada a ele, pois foi quem abriu a região para nós, assim como as portas das pessoas que nos contaram suas memórias da guerrilha”, diz Gabriela.

No palco, a narrativa se estabelece entre a ficção e o documentário. “Guerrilheiras ou Para a Terra Não Há Desaparecidos” é um poema cênico criado a partir da história daquelas mulheres, sua luta e memórias do que elas viveram e deixaram na região amazônica, nos estados do Pará e Tocantins, locais de forte resistência contra a violência e a ditadura e onde se deu a guerrilha do Araguaia, na década de 1970.

O espetáculo estreou em 2015, em São Paulo, e também chegou a ser apresentado em outras cidades do sul e sudeste brasileiro. A turnê pela região amazônica, segundo Gabriela, é um compromisso do grupo com aqueles que compartilharam suas histórias para a construção da peça.

Antes de Belém “Guerrilheiras ou Para a Terra Não Há Desaparecidos” passou pelo Tocantins, e percorreu o que Gabriela chama de “corpo da guerrilha”. No Pará, a peça já foi apresentada em São Geraldo do Araguaia, São Domingos do Araguaia e Marabá. 

“Esse retorno está sendo muito forte, mais forte talvez do que a gente podia imaginar. Tem sido um retorno muito afetivo, e acredito que a gente tem recebido o mesmo afeto que as guerrilheiras receberam quando chegaram”, diz Gabriela sobre voltar com o espetáculo aos locais onde a pesquisa foi realizada.

A equipe de produção mergulhou no rio, nas histórias e memórias de camponeses testemunhas daqueles tempos, e que guardam ainda dores de perdas e de procura por familiares desaparecidos. Autora, diretora e atrizes conviveram ali por cerca de 15 dias em aprendizado, trocas e escutas.

“Quando a gente ouve os camponeses que viveram e conheceram as guerrilheiras, o que a gente ouve primeiro é sobre a relação de afeto. Elas foram parteiras, médias, e os primeiros cuidados médicos que essas pessoas tiveram foram com elas. Não é só porque elas trouxeram conhecimento, elas também precisavam do conhecimento e tecnologia que essa população dominava. Elas eram tão de longe quanto nós”, diz Gabriela.

O elenco reúne artistas do Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e da Colômbia, além da atriz paraense Vandileia Foro, convidada para a itinerância no estado, somando a sua a outras vozes que traduzem vidas interrompidas e ignoradas pela história. Gabriela conta que o desejo e a necessidade de ter uma atriz paraense no elenco fazia parte do projeto inicial. “A Vandileia veio com muita propriedade sobre o que diz, com muita entrega, e está fazendo lindamente com a gente agora. Já faz parte das guerrilheiras”, declara.

Na sessão de quinta-feira, um debate será realizado após o espetáculo com o objetivo de discutir o processo de trabalho e de construção da peça, estimular a troca de saberes entre artistas e público, além do próprio tema central, com outras mulheres que atuam prioritariamente no campo da arte e cultura.

Entre os dias 21 e 23 as atrizes Gabriela Carneiro da Cunha e Mafalda Pequenino realizam oficina para atores e atrizes locais no Casarão do Boneco, com o objetivo de compartilhar as experiências cênicas experimentadas na montagem do espetáculo, trabalhando performances da morte como estado de hiperpresença, utilizando técnicas de consciência corporal, dança afro, a energia agregada ao movimento, o enraizamento ativo dos pés no solo, na consciência do centro da coluna vertebral, sentimentos, corpo e ação e a relação com o espaço. Interessados devem se inscrever exclusivamente pelo link disponível na página do Casarão do Boneco no Facebook. 

Agende-se:
Peça "Guerrilheiras ou Para a Terra Não Há Desaparecidos"
Data: 22 e 23/08, às 20h;
Local: Teatro Waldemar Henrique (Praça da República - Av. Pres. Vargas, 645 - Campina);
Classificação indicativa: 14 anos;
Ingressos: R$ 20 (inteira), disponíveis na bilheteria do teatro ou plataforma Sympla.

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