Biblioteca do Grêmio Português recupera 400 obras de coleção rara

São livros do século XIX, do autor Camilo Castelo Branco, um dos maiores nomes da literatura lusitana, traduzido para vários idiomas.

Enize Vidigal

O Grêmio Literário e Recreativo Português está finalizando o trabalho de conservação de cerca de 400 livros raros de Camilo Castelo Branco (1825-1890), um dos maiores expoentes da literatura lusitana. Uma das principais obras dele é “Amor de Perdição” (1861), novela do romantismo literário conhecida mundialmente e publicada em vários idiomas. As obras fazem parte do acervo da Biblioteca Fran Paxeco, fundada em Belém pela comunidade portuguesa há quase 155 anos.

Os livros em recuperação receberam veneno em 1984, um costume da época para proteger do ataque de insetos e roedores, e, por conta disso, a coleção toda ficou indisponível ao público desde 2018. “Antigamente se usava o veneno BHC, que é extremamente cancerígeno”, explica a coordenadora do projeto, Ethel Valentina.

O trabalho de conservação, iniciado em março deste ano, consiste na higienização, conserto de encadernação, reparos nas folhas e substituição das folhas de guarda (folhas em branco no início e final dos livros). As obras estão sendo digitalizadas e ficarão disponíveis em meio on line. “Os livros estão muito frágeis e voltarão a ficar inacessíveis e receberão um acondicionamento especial”, avisa.

Segundo ela, a coleção camiliana da Fran Paxeco reúne cerca de 1.200 volumes do final do século XIX, mas, com o financiamento de R$ 240 mil conseguido junto ao Consulado de Portugal foi possível selecionar 400 volumes para as conservação. Entre os exemplares contemplados estão romances, cartas, teatro, poesia e biografias assinadas por Camilo Castelo Branco, assim como biografias sobre o autor.

“Os romances do Camilo Castelo Branco falam muito do cotidiano português da época. Ele descrevia a sociedade como ela era na visão dele. Foi o primeiro escritor português a sobreviver da própria literatura. Era também teatrólogo, poeta, escritor e pensador”, conta Ethel. “Ele escrevia biografias sobre vultos da época dele, poemas e cartas e têm muita biografia sobre ele, com obras em várias línguas. Essa é uma das coleções mais completas da América Latina”.

A vice-cônsul de Portugal, Maria Fernanda Pinheiro, disse que o valor das obras conservadas é imenso por serem as primeiras e segundas edições. “Estamos muito contentes de poder ajudar, através desse projeto. Temos que olhar por esse legado português que foi dado ao estado do Pará. Isso é tesouro do Pará, todos temos a obrigação de valorizar e ajudar a preservar”.

Já o presidente do Grêmio Português, Paulo Oliveira, disse que esse foi o primeiro passo para garantir a salvaguarda de todas as obras que fazer parte do acervo da biblioteca. Hoje, são 35 mil títulos guardados na biblioteca, incluindo 360 títulos raros datados de 1528 a 1799. “Nós temos livros aqui no Grêmio que só tem dois exemplares no mundo. Temos também esse prédio histórico, que conseguimos manter em ótimo estado”.

Lançamentos

O projeto será concluído no mês que vem e, em 6 de outubro, quando o Grêmio Português celebrará 155 anos, será lançado um site em que esses volumes recuperados e digitalizados ficarão disponíveis. Na ocasião, também haverá uma exposição fotográfica dos serviços de conservação realizados, além do lançamento de um catálogo de 210 páginas reunindo as dez obras mais importantes recuperadas pelo projeto e um artigo da professora Germana Sales, da Universidade Federal do Pará (UFPA), especialista na obra de Camilo Castelo Branco. O catálogo terá versão digital e impressa.

Passo a passo

“A coleção camiliana estava isolada em uma situação muito ruim. Foi feito um trabalho intenso de desinfeção do veneno para (a equipe técnica) poder trabalhar. Foi uma operação de guerra: foi feita uma bolha (de plástico) com o pessoal que trabalhou usando máscara, sapatilha, luva, e macacão de proteção. As pessoas ficavam somente três horas dentro da bolha. Depois entrava numa outra bolha para tirar a roupa e dali ia tomar banho para não ficar andando com o veneno”, detalha Ethel.

“O excesso de veneno danificou muito o papel. Tem papel que quando se pega vira pó. Selecionamos o que dava para digitalizar e guardar. O trabalho está na reta final. Estamos com quase 320 livros prontos e com cerca de 40% digitalizados. Estamos fazendo um trabalho minucioso para que as páginas não se desmanchem”.

“Usamos dois equipamentos de digitalização por varredura, que são próprios para livros raros. Eles têm uma lâmpada que se movimenta sobre o livro sem que precise ser manuseado. A gente tem que pegar o mínimo possível no papel e usamos uma película de polietileno, que é eletrostática, para virar as páginas sem tocar no livro”

O material utilizado no trabalho de conservação é todo importado de São Paulo. A equipe de conservação é toda de Belém: dois digitalizadores, dois encadernadores, duas conservadoras, dois assistentes, um designer gráfico, uma bibliotecária e uma historiadora.

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