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JAMILLE SARATY

É advogada, mestre em Direito Civil pela Universidade de Coimbra, pós-graduada em proteção de menores pelo Centro de Família da Universidade de Coimbra, membro da diretoria do IBDFAM-PA, professora de graduação e pós-graduação em Direito. | jsaratyadv@gmail.com

O casamento infantil no Brasil, pode?

Jamille Saraty

No início do mês de maio, a notícia do casamento do prefeito de Araucária, no Sul do Brasil, com uma adolescente de 16 anos com autorização da genitora, que no mesmo dia foi nomeada em cargo público, escandalizou a sociedade brasileira. Nos grandes veículos de comunicação a discussão era se o casamento era válido, e se o ato não configuraria pedofilia, já que a diferença de idade entre os cônjuges passava os 40 anos.

A verdade é que o Código Civil em seu artigo 1.517 determina que a idade Núbil (limite mínimo para se casar) é atingida aos 16 anos, e assim, adolescentes de ambos os sexos podem se casar com outras pessoas independente da diferença de idade. Além disso, não existe previsão que defina pedofilia como crime, criminalizando apenas atos sexuais contra criança menores de 14 anos (art. 241-D ECA e art. 217-A CP). Desta forma, o casamento entre o prefeito e a moça de 16 anos é totalmente válido uma vez que foi autorizado por sua genitora e não configura nenhum crime sexual. Ressalta-se aqui que, ainda que a mãe ou o genitor não autorizassem a filha a se casar, a jovem poderia se valer da autorização de um juiz e conseguir o suprimento judicial para casamento.

Entretanto, ainda que o casamento esteja “dentro da lei”, a submissão de uma menina tão jovem a um compromisso tão sério, com alguém que ultrapassa décadas de sua geração, preocupa, quando se percebe que a questão ocorre com mais frequência com gênero feminino e ultrapassa a perspectiva meramente legal. O casamento de meninas no Brasil tem a ver com desigualdade social, pobreza, violência e repressão sexual da mulher, sobretudo em estados menos desenvolvidos socioeconomicamente.

A associação Nacional dos Registradores de pessoas Naturais – Arpen-Brasil, contabilizou 2.764 uniões oficiais envolvendo menores de idade no Brasil só no ano de 2023, sendo o nosso País o quinto em números absolutos de casamento de menores de idade. Para a Organização das Nações Unidas toda união que envolva menores de 18 anos é definida como casamento infantil e considerada uma violação dos direitos humanos, tendo em vista que oprime pessoas em processo de desenvolvimento humano. O Instituto Promundo apontou números alarmantes de casamento infantis com meninas do Pará e seus motivos, na pesquisa intitulada “e ela vai no meu barco”.

Sem Perspectivas futuras, as meninas acabam enxergando no casamento uma chance de estabilidade econômica e uma vida sem dificuldade, já os homens preferem as meninas mais jovens pela facilidade de impor decisões, controle financeiro e sexual da esposa já que geralmente ele é o único parceiro sexual que ela teve, além do enquadramento dos padrões sociais de beleza que infantilizam o sexo.

É notório que o Brasil tem se mantido ausente das discussões e posicionamentos globais sobre o casamento infantil, sendo necessário e urgente uma agenda política que envolva a proteção e educação sexual, sobretudo de meninas, dando a chance de que elas, devidamente informadas, consigam tomar uma decisão genuína e consciente sobre casamento precoce.

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Jamille Saraty
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