CONTINUE EM OLIBERAL.COM
X

Em Belém, projeto cobre cicatrizes de automutilação e violência com tatuagens

Campanha pretende ressignificar marcas do corpo por meio da arte

Tainá Cavalcante

"Stay Strong" ou, em tradução livre para o português, "Fique Forte", "Mantenha-se Forte". Essa é a frase que estampa, entre tantas marcas, o pulso de Izabel Marques, de 21 anos. Com pensamentos suicidas e comportamentos de automutilação desde a infância, a "Bel", como gosta de ser chamada, não imaginava que seria uma nova marca que mudaria o sentido das outras, feitas em meio a tanta dor.

image Frase foi tatuada no pulso de Izabel (Arquivo pessoal)

"Desde pequena eu tive alguns problemas. Lembro vagamente de quanto eu tinha oito anos e me sentia muito sozinha, com uma enorme vontade de me matar. Quando eu estava na 7ª série, eu me cortava nas pernas, comia e forçava o vômito" lembra, resgatando que tudo ficou ainda mais intenso na universidade, quando passou a cursar biomedicina. "Comecei a me pressionar muito e tive um episódio com um professor, que praticamente me humilhou na frente de todo mundo. Eu parei de ir para a aula, porque todos ficavam me olhando" diz.

A primeira crise, como ela define, veio pouco tempo depois, aos 20. "Foi um dia que fiquei tão angustiada, que cheguei ao ponto de tomar remédios e cortar o pulso esquerdo. Fiquei umas três horas sangrando. Minha mãe me encontrou na cama sangrando" conta Bel que, depois do episódio, começou um tratamento que a ajudou a parar de se automutilar.

"Hoje eu faço psicoterapia com a psicóloga e tratamentos com a psiquiatra. Sou diagnosticada com depressão, transtorno bipolar e ansiedade, e decidi parar com a automutilação quando percebi que não ajudava em nada".

PROJETO 'CONT;NUE'

Outra estratégia fundamental para a resistência de Bel são as tatuagens, localizadas não por acaso muito próximas às marcas das automutilações. "Decidi que queria fazer, mas sempre tive medo. Foi quando uma amiga me apresentou a Tássia Britto e fiz minha primeira tatuagem em cima do pulso, a frase 'Stay Strong', com ela" detalha. "Eu sempre tive vontade de fazer tatuagem, mas nunca imaginei que isso poderia me ajudar e só percebi quando fui descobrindo os significados de cada uma", completa.

image Izabel e Tássia se conheceram por meio das tatuagens (Cláudio Pinheiro)

A história de Bel e o interesse de Tássia pelas vivências da cliente acabou por transformá-las em grandes amigas. "Depois da minha tatuagem, nós começamos a conversar muito sobre esse assunto e viramos amigas. Ela me falou que tinha a ideia de um projeto, de dar descontos para tatuagens com intenção de cobrir cicatrizes, e eu abracei com ela" relata.

O projeto em questão foi colocado em prática pela tatuadora no último dia 17, data em que ela postou sobre a iniciativa nas redes sociais. Na campanha, Tássia oferece descontos de até 50% em tatuagens para cobrir ou ressignificar cicatrizes. De acordo com ela, "qualquer cicatriz que mexa com a autoestima de alguém, entra na campanha".

 

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

Uma publicação compartilhada por Tássia Britto (@tassiabritto) em

 

"É uma forma de conscientizar as pessoas e abordar o tema da prevenção ao suicídio, para tentar ajudar pessoas com transtornos psicológicos e baixa autoestima consequentes de cicatrizes feitas por automutilação ou acidente" explica, ao demarcar que "a arte é uma linda forma para resistir". 

Entre os traços mais solicitados para situações como essa estão, segundo Tássia, o desenho de ponto e vírgula (;), a palavra 'continue' e a frase 'stay strong'. "É algo simbólico e significativo" define. O objetivo da tatuadora, porém, é que os próprios clientes escolham o que irão fazer, sem nada pré-definido. "A ideia inicial é fazer criações que possam fazer sentido para cada pessoa. Ou se tiverem a arte pronta, só faço essa transferência para pele".

 

image Tássia Brito e Isabel ( Cláudio Pinheiro)

 

Questionada sobre a idealização do projeto, Tássia conta que convive com pessoas que têm depressão, ansiedade, entre outros problemas psicológicos, o que a fez despertar para a iniciativa. "No dia 15 uma conhecida da minha companheira se suicidou e isso mexeu muito conosco. É ruim ter que suportar comentários tais como "isso é frescura", "preguiça", "falta de Deus". Às vezes, dentro da própria família algumas pessoas não têm apoio, um abraço ou um eu te amo. E para muitas pessoas a saída acaba sendo automutilação para arrancar a dor de dentro para fora. Mas chega! Devemos nos unir" diz, ao afirmar que "a dor é sufocante, mas nossa vontade de continuar tem que ser maior".

Depois da primeira tatuagem, Izabel voltou com a Tássia para um novo desenho. Dessa vez, uma cruz. "É geralmente nas crises que ela me procura para tatuá-la, justamente para não se automutilar e para conversarmos" afirma Tássia, sendo complementada pela amiga. "Como eu sempre tive muita fé, decidi fazer uma cruz vazia e cheia de flores, que tem um significado muito forte para mim: podemos passar por provações, mas no final sempre vencemos e florescemos" destaca Bel, ao garantir que, depois das tatuagens, cada vez que se sente mal, triste ou algo do gênero, olha para o braço e pensa em todos os significados que a arte traz.

image A cruz foi o segundo desenho escolhido por Izabel para ressignificar as marcas de automutilação (Cláudio Pinheiro)

Outras informações sobre o projeto e tatuagens podem ser solicitadas pelo Instagram da artista: @tassiabritto.

Entre no nosso grupo de notícias no WhatsApp e Telegram 📱
Belém
.
Ícone cancelar

Desculpe pela interrupção. Detectamos que você possui um bloqueador de anúncios ativo!

Oferecemos notícia e informação de graça, mas produzir conteúdo de qualidade não é.

Os anúncios são uma forma de garantir a receita do portal e o pagamento dos profissionais envolvidos.

Por favor, desative ou remova o bloqueador de anúncios do seu navegador para continuar sua navegação sem interrupções. Obrigado!

ÚLTIMAS EM BELÉM

MAIS LIDAS EM BELÉM