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Arte dos papagaios resiste na era das pipas

As pipas de plástico acabam sendo mais baratas e acessíveis, ao passo que se transformaram. Papagaios, cangulas (exclusiva do Pará) e rabiolas são tradição apreciada por poucos, hoje em dia

Victor Furtado
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Antes de as pipas de saco plástico ganharem os céus nas férias escolares, junho e julho já foram a temporadas dos papagaios. As rabiolas vieram depois. E especificamente no Pará, havia os papagaios cangulas, algo exclusivo do estado. Esses modelos mais tradicionais, que ainda podem ser encontrados nas mãos de artesãos do empino, são feitos em papel e são obras de arte moderna e popular. Custam mais caro e demandam mais habilidade para empinar, mas resistem às opções mais acessíveis do mercado.

Pipas, papagaios e rabiolas são brinquedos muito antigos. Possivelmente, nasceram na China, há mais de 3 mil anos. Mas nem sempre foram brinquedos. Já serviram como forma de comunicação e até como estratégia militar. Um dos episódios mais conhecidos da história mundial, do qual uma pipa faz parte, é o experimento de Benjamim Franklin. Em 1752, o cientista descobria a eletricidade e criou o primeiro para-raios.

Para quem não conhece a diferença, os papagaios e cangulas exigem mais habilidade do empinador, pois fazem movimentos mais bruscos. Os rabos são de pano. As armações de papagaios e rabiolas são diferentes. Cada uma tem um formato que garante a aerodinâmica própria. As pipas e rabiolas costumam ser mais fáceis de manejar. Chegam ao céu mais facilmente e são mais estáveis no voo.

Reginaldo Mourão é um nome muito comum e pertence a um homem de 73, que mora no Reduto. Mas quando se fala no "Cobra", aí esse senhor remonta a uma lenda dos céus de Belém. Ele ostenta o título de "Rei dos Papagaios". Até hoje é conhecido como o dono de uma fórmula secreta e poderosa de cerol. Mesmo não fazendo mais o "Cerol do Cobra", ainda recebe pedidos insistentes. Agora já vende os carreteis de 457 metros que já vêm encerados. Ela afirma que a qualidade do cerol não é a mesma.

Cobra tem 58 anos de experiência no mercado dos papagaios. Ele não faz pipas de plástico. A contragosto, precisou começar a fabricar rabiolas, assim que a moda chegou do sul do Brasil. Lamenta que a arte que envolve o empino complexo dos papagaios e papagaios cangulas — os rabos destes são de pano e cada desenho nos papeis é único e tem nome — esteja perdendo espaço.

Em 1986, a arte dos papagaios dele foi levada para uma exposição no Rio de Janeiro. O prefeito de Lyon, na França, estava na exposição e o procurou. Ofereceu cidadania francesa para levar aquela arte específica para a França. Acabou recusando o convite, que considerou ser uma mudança muito brusca de vida. Mas graças a conexões como essas — houve outros contatos internacionais —, mandou papagaios para Japão, França, Grécia e Portugal.

O preço pode ser um empecilho para uma brincadeira que é tão democrática nas periferias: as rabiolas custam entre R$ 3 e R$ 6; as cangulas saem a R$ 5; e o os papagaios a R$ 6. "A molecada de hoje só quer pipa. Os outros modelos ficaram para os mais antigos. Nem se fala mais nas curicas, que eram feitas de papel jornal ou folha de caderno. Foi com essas que comecei, ainda criança", comenta Cobra.

Entre as décadas de 1970 e 1990, Cobra chegava a vender 20 mil papagaios, cangulas e rabiolas. Hoje em dia, a cada temporada de empino, chega a 5 mil unidades. Mas faz questão de manter viva essa tradição. As talas de jupati, para estruturar os papagaios, vêm da Região das Ilhas de Belém. Há pessoas especializadas no cultivo e extração da palmeira que origina as talas. "É emprego e renda para aquele povo", diz.

image Reinaldo, o "Rei da Pipa do Guamá", investe em plásticos com estampas diferenciadas para atrair o público. Mas isso não faz com que as pipas aumentem de preço e custam só R$ 1 (Victor Furtado / Redação Integrada de O Liberal)

No contraponto à arte tradicional das rabiolas e papagaios, quem se dedica a fazer as pipas de plástico busca inovações. Há outro monarca nesses reinados do empino: Reinaldo Mendes, o "Rei das Pipas", no Guamá. A cada alta temporada (junho, julho e dezembro), vende cerca de 5 mil unidades. Hoje em dia, começou a fazer trabalhos muito mais característicos e personalizados. As pipas com estampas de heróis ou marcas são a nova tendência. E os preços são apenas R$ 1.

"Tem gente que vende muito mais. Pessoas que se organizaram e criaram redes de lojas dedicadas a pipas e talvez passem das 20 mil unidades por mês. Eu aqui comecei brincando. Minha primeira pipa diferente foi uma que marquei com um 'X' de pincel atômico. Ficou diferente e começaram a vir atrás. Depois eu fiz pipas pretas. Era bom. Aí começaram a dizer 'lá vem a pipa do rei' e ficou", lembra Reinaldo. O estoque fica até para o ano seguinte. Ele garante ser um ótimo mercado nesta época.

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