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Cartão de crédito pode ser vilão ou aliado dos paraenses

Juros altos exigem mais atenção do consumidor

Maycon Marte e George Miranda | Especial para O Liberal
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O uso do cartão de crédito como ferramenta de sobrevivência financeira tem se tornado uma armadilha para muitas famílias no estado. Segundo dados do Banco Central divulgados ontem, a taxa média de juros do crédito rotativo - acionado quando o consumidor paga menos que o valor integral da fatura - atingiu 445% ao ano em março de 2025. No Pará, o impacto disso já é perceptível em pesquisas: 77,1% das famílias estão endividadas, de acordo com levantamento da Fecomércio/PA, e 83,7% dessas dívidas são relacionadas ao cartão de crédito.

No início da vida adulta, o publicitário João Loureiro, de 31 anos, se empolgou com a possibilidade de parcelar quase tudo no cartão de crédito. Roupas, refeições, viagens, celulares. Em pouco tempo, viu-se enrolado em dívidas que se arrastaram por quatro anos, até que ele conseguisse limpar o nome já com um emprego fixo. Hoje, o paraense administra três cartões, com limites que somam R$ 23 mil, e tenta manter o controle sobre os gastos. Mas admite: “Já estou cogitando usar o rotativo, porque está cada vez mais difícil honrar as dívidas no final do mês”. A situação do publicitário não é isolada. Por isso, o uso dessa modalidade de pagamento exige atenção dos consumidores. 

A autônoma Ricelma Martins encontrou uma estratégia para continuar usando cartões de crédito sem cair no endividamento: o "limite controlado". Nesse modelo, o consumidor deposita um valor pré-determinado na conta bancária e converte o saldo em crédito, permitindo maior controle sobre os gastos. Ela mantém outros cartões, mas agora os utiliza apenas para compras de alto valor planejadas com antecedência. O banco que oferece a modalidade também incentiva a adesão com benefícios como descontos em assinaturas de streaming e compras.

“A gente consegue controlar mais os nossos gastos com esse método e não ficamos ansiosos para comprar com o cartão de crédito normal. Nós só compramos quando fazemos o calculosinho para colocar e aí, sim, usamos o crédito que também dá vantagens para a gente”, explica.

Combinação perigosa

A combinação entre juros altos e falta de planejamento é apontada como uma das principais causas da inadimplência no estado. “Com o aumento dos juros, o acesso ao crédito se torna mais caro, levando à redução do consumo e ao agravamento do endividamento”, explica o economista Nélio Bordalo Filho.

A Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (PEIC), da Fecomércio/PA, mostra que o número de famílias sem condições de pagar as dívidas cresceu: passou de 25,9% em 2024 para 28,6% neste ano. Para Nélio, esse cenário revela também uma deficiência crônica de educação financeira. “Muitos consumidores desconhecem os altos custos do crédito rotativo e não têm planejamento adequado. Acabam utilizando o cartão de forma imprudente e acumulando dívidas difíceis de quitar”, alerta.

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O próprio João relata que mudanças recentes feitas pelas operadoras — como alteração na data de fechamento da fatura — dificultaram ainda mais a organização financeira. “Parece pouco, mas esse tipo de mudança afeta diretamente o planejamento e as compras. E quase sempre vem com aviso curto, um mês antes”, reclama.


Confusão

Enquanto a inadimplência nacional se mantém estável, no Pará o endividamento cresce de forma mais agressiva, principalmente entre as famílias de baixa renda. “Essas famílias frequentemente utilizam o cartão para cobrir despesas básicas, como alimentação. Com juros tão altos, essas dívidas se tornam impagáveis rapidamente”, afirma o economista.

No Pará, os indicadores da Fecomércio refletem um panorama ainda mais preocupante: muitas vezes, o limite do cartão é confundido com a própria renda disponível. “Essa confusão é um erro grave. O limite é um crédito, não um dinheiro que você realmente tem. Quando isso não está claro, as chances de se endividar são muito maiores”, reforça Nélio.

João diz que tenta equilibrar os gastos usando cada cartão com uma função específica, mas admite que os juros assustam. “Teve uma compra de R$ 1.500 que atrasei um dia e tive que pagar quase R$ 100 só de juros e multa. É surreal”, protesta.


Benefícios

Apesar dos riscos, o cartão de crédito pode ser um aliado do orçamento — desde que usado com responsabilidade. “É uma ferramenta que oferece benefícios como parcelamento sem juros, programas de pontos e controle de gastos por meio de faturas detalhadas”, afirma o economista.

Nélio Bordalo sugere que consumidores estabeleçam um limite pessoal inferior ao oferecido pelas operadoras. “Se a renda líquida for R$ 3 mil, o ideal é ter um limite entre R$ 900 e R$ 1.500”, orienta. Outra dica é aproveitar o cartão para concentrar os pagamentos em uma data que permita melhor organização financeira. “Com planejamento, ele pode ajudar mais do que atrapalhar”, diz.

João concorda, embora reconheça que a prática nem sempre é simples. “A gente tenta usar com consciência, mas tem mês que é muito difícil. O que falta é mais clareza e transparência das operadoras, e mais educação financeira para todo mundo”, conclui o publicitário.


Como sair dessa bola de neve?

Com juros altos e renda apertada, a dúvida de muitos consumidores é: como sair dessa bola de neve? Para Nélio Bordalo, há estratégias práticas que podem ajudar a evitar o endividamento.

Confira as dicas do especialista:

- Pague sempre o valor total da fatura. Evite cair no rotativo, que tem os juros mais altos do mercado.

- Negocie. Caso já esteja no rotativo, procure o banco para parcelar a dívida com juros menores.

- Considere outras formas de crédito. Empréstimos consignados ou com garantia têm taxas menores.

- Tenha um limite pessoal. Idealmente, o limite do cartão deve ser entre 30% e 50% da sua renda mensal.

- Faça um orçamento. Liste receitas e despesas e acompanhe os gastos do mês.

- Invista em educação financeira. Existem cursos e conteúdos gratuitos que ajudam no planejamento.

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