País celebra combate à intolerância religiosa

Para a professora Taissa Tavernard, as religiões de matriz africana são as que mais sofrem preconceito na atualidade

Victor Furtado / O Liberal

Criado em 2007, o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa é celebrado no dia 20 janeiro. No ano 2000, a baiana Gildásia dos Santos e Santos, conhecida como Yalorixá Mãe Gilda, foi vitima da intolerância religiosa. Uma igreja neopentecostal utilizou uma imagem dela num jornal da comunidade, associando-a a cultos demoníacos, charlatanismo e diversos crimes.

A casa onde Mãe Gilda vivenciava sua religião se tornou alvo de ataques frequentes. Quando ela descobriu a razão de tanta raiva, no dia 20 de janeiro, sofreu um infarto e morreu no dia seguinte. Foram sete anos de mobilização de movimentos sociais até que uma lei desse início oficial ao enfrentamento da intolerância religiosa como política pública. 

Mesmo com a lei, séculos de história de intolerância religiosa são difíceis de se transformar tão rápido. Para a doutora em Antropologia Taissa Tavernard, coordenadora do curso de Ciência das Religião da Universidade do Estado do Pará (Uepa), a educação é a principal ferramenta para o fim do ódio entre as religiões. Um ódio que afeta até mesmo as religiões mais intolerantes, formando um ciclo infinito de intolerância.

Atualmente, analisa Taissa Tavernard, as religiões de matriz africana são as que mais sofrem preconceito e violência. Entre as razões, é que negros africanos foram escravizados e levados para muitos lugares do mundo, levando a diversidade religiosa com eles. Os cultos africanos se espalharam e se estabeleceram nas novas realidades geográficas. 

Contudo, são crenças difíceis de ser compreendidas por praticantes de religiões monoteístas, como as baseadas no cristianismo. Até hoje esse obstáculo leva ao preconceito e ao ódio. Somado a isso, o racismo contra os negros apenas reforçava a marginalização e criminalização dessas religiões. Tanto que nos dias atuais, explica a antropóloga, se analisa o chamado “racismo religioso”. É um duplo preconceito.

As imagens das divindades de matriz africana são negras. Era inaceitável para as nações colonizadoras encontrar aquele tipo de religião, enquanto se tentava propagar a imagem de um Jesus Cristo, nascido no Oriente Médio, branco, loiro, de olhos azuis, feições finas e cabelos e barba lisos. 

A ideia de Jesus num perfil étnico de elite europeia é um indicativo de preconceito com povos negros, que fundamenta a história da corrente religiosa mais famosa e influente do mundo. Quando historiadores tentaram reconstruir virtualmente o rosto de Jesus, com perfil de alguém do Oriente Médio daquela época, muitos cristãos rejeitaram a figura de um Jesus negro, com cabelos curtos e encaracolados e barba cerrada, não lisa. Mas era assim que as pessoas daquela região eram.

Às divindades negras ainda coube os rótulos de demonização. Associou-se a ideia do Diabo do cristianismo a algumas imagens do panteão africano. Um dos mais populares no rótulo de demônio é a divindade Exu, também chamada de “Tranca Rua”. 

“Exu não é, nunca foi e nunca será o Diabo. Até porque nas religiões africanas, a ideia do diabo do cristianismo não existe. Exú é o comunicador, responsável pelos caminhos e representa a vida, a sexualidade e o corpo humano. Numa comparação com outras divindades, ele seria como Hermes”, pontua Taissa. A demonização do panteão, explica, é a mais antiga estratégia de exclusão de religiões.

 

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