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Covid no Pará: 20 cidades têm até o final de maio para imunizar 70% da população

Municípios com cobertura vacinal abaixo de 40% afirmam que enfrentam dificuldades, como: logística, falha no sistema, fake news, recusa e interferência de lideranças religiosas

Fabyo Cruz

Quase 90% da população paraense está totalmente imunizada contra a covid-19, o que corresponde às aplicações das duas doses ou da dose única da vacina, segundo dados do Vacinômetro do Governo do Estado. Entretanto, 20 municípios aparecem nas últimas colocações do ranking, com cobertura vacinal da população abaixo de 40%. A Secretaria de Estado da Saúde do Pará (Sespa) estabeleceu uma meta para que essas cidades imunizem 70% dos seus habitantes até final de maio, porém algumas delas afirmam que enfrentam problemas, como: logística, falha no sistema, fake news e recusa.        

Grande parte dessas cidades têm em comum algumas características, entre elas, a maior parte do s seus habitantes estão concentrados em áreas rurais. Alguns desses municípios também possuem grandes extensões, como por exemplo São Felix do Xingu, localizado na região sudeste do Pará, que é um dos maiores do Brasil. Para Charles Tocantins, presidente do Conselho de Secretarias Municipais de Saúde do Pará (Cosems/PA), esses dois fatores podem ser determinantes para o reflexo do mal desempenho da cobertura vacinal contra a covid-19. 

“Esses municípios têm dificuldades logísticas e população rural bastante dispersa, o que prejudica as equipes de saúde acessarem alguns locais”, comenta Charles Tocantins. O titular da Cosems também acredita que além da questão territorial desses lugares, outras razões interferem diretamente na atuação dos agentes de saúde: as fake news e a desatualização de dados cadastrais. "Apesar de dizer que esses números baixos do sistema de informação são em razão da internet, sistema e digitadores, que não chegaram ao banco de dados nacional, as fake news se proliferaram nessas áreas. Muitos habitantes acreditam que o mal já passou e que haveria risco de adoecer com a aplicação da vacina”, afirmou.

Charles Tocantins diz que a Cosems em conjunto com a Sespa está trabalhando com as secretarias municipais, tentando fazer novas estratégias para vencer esses obstáculos. Ele afirma também que existe um estudo a ser feito, ainda neste primeiro semestre, com o Instituto Brasileiro de Pesquisa  e Estatística (IBGE) e prefeituras para verificar se as 20 cidades sofreram impactos migratórios ao longo dos últimos dez anos. “O IBGE estabeleceu a quantidade de pessoas há mais de dez anos. Portanto, podemos ter um percentual de impacto no qual esses municípios não tenham a totalidade de população apontada atualmente, não só para a vacina como para todos indicadores populacional”, concluiu. 

O Governo do Pará, por meio da Sespa, informou via nota que “o Estado realiza a distribuição das vacinas aos municípios em até 48h após a chegada ao Pará, tendo enviado, até agora, um total de 13.909.660 doses de vacina”. No comunicado, a Secretaria de Saúde também comunicou que “treina as equipes municipais, promove campanhas de mobilização, combate às fake news e orienta as secretarias municipais a melhorarem suas estratégias de vacinação”. A pasta ressalta, ainda, que “a aplicação da vacina é de responsabilidade dos municípios, bem como o preenchimento das informações no sistema do Ministério da Saúde”.

Para ter uma dimensão da situação dessas cidades, a Redação Integrada de O Liberal entrou em contato com as prefeituras e secretarias municipais de Saúde dos dez últimos municípios que figuram entre os piores desempenhos, de acordo com o Vacinômetro da Sespa, são eles, em ordem decrescente:  Rurópolis (o décimo), Baião, Viseu, Cachoeira do Piriá, Água Azul do Norte, Novo Repartimento, Ulianópolis, Santana do Araguaia, São Félix do Xingu e Jacareacanga (o último). As cidades que não deram retorno à reportagem foram Ulianópolis e Novo Repartimento.

Apesar de figurarem entre as cidades com menor cobertura vacinal do Estado, alguns desses municípios apresentam baixa de internações e casos de covid-19. De acordo com o boletim epidemiológico publicado pela Prefeitura de Novo Repartimento, no dia 28 de abril de 2022, há zero casos de internações na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) e em clínicas particulares da cidade. Na mesma data, a Prefeitura de Cachoeira do Piriá informou por meio do boletim epidemiológico que a cidade está há 50 dias sem casos positivos de covid-19.

Falha no sistema atrapalha algumas prefeituras

BAIÃO

A maior parte das regiões do município de Baião, no sudeste paraense, enfrentam dificuldades para se conectar à internet, o que dificulta o repasse de dados para a Sespa, diz a titular de Saúde, Valdomira Guimarães. Por conta disso, as informações apresentadas no Vacinômetro do Estado estão em desconformidade com a realidade, afirma a secretária. Guimarães conta que a Secretaria de Saúde do Pará está ciente da situação da cidade e que inclusive um representante do Estado esteve lá nos dias 12 e 13 de abril para checar a ocorrência solicitada pela prefeitura. Um profissional especializado chegou a ser contratado para tentar minimizar os danos no sistema.

“Nós vacinamos muitas pessoas em Baião. Fizemos mutirões inclusive nos finais de semana. Quando teve o show do Zé Vaqueiro na cidade, solicitamos os comprovantes de vacinação como exigência para os jovens entrarem. Nós tínhamos dificuldades com esse público de pessoas mais novas. A maioria da população já tomou a quarta doses da vacina, Emitimos até uma nota informando que a taxa de internação de pacientes e casos positivos estão zerados nos últimos 20 dias.  O nosso sistema está desatualizado, não temos uma boa internet”, afirmou. Durante a visita da representante da Sespa na cidade, foi estabelecido um prazo de dois meses para que o município atualize no sistema as doses já aplicadas.

VISEU    

O município de Viseu, nordeste do Pará, vive situação semelhante. A pasta municipal de Saúde informou que um cronograma da Sespa  estabelece uma meta de vacinação de 70% população, até o final de maio deste ano -  também para as outras 19 cidades -, com as aplicações das duas doses ou da dose única do imunizante contra a covid. Imediatamente, a prefeitura, por meio da Coordenadoria de Vacinação, enviou um ofício como resposta informando sobre a instabilidade do sistema. Segundo a pasta, há cruzamentos de dados nos sistemas. O exemplo citado foi de uma criança que teria sido vacinada em Viseu, mas no sistema da Sespa consta que a imunização ocorreu em Belém. 

A Secretaria de Saúde afirma que há diferenças no sistema da Sespa para o que é registrado no ConecteSUS, o setor garante que a diferença já foi maior mas havia sido ajustada anteriormente por um representante do Estado. Outro prejuízo foi quando o site da Prefeitura de Viseu foi hackeado, ficando cerca de um mês fora do ar, o que provocou a perda de dados. Apesar das contrariedades, o departamento assegura que a população está sendo vacinada, sobretudo a zona rural, Eles também afirmam que casos graves de covid-19 não foram vistos no hospital da cidade nos últimos meses, somente de sintomas leves.

População de algumas cidades recusa a vacina

CACHOEIRA DO PIRIÁ

Keyner da Silva,  secretário de Saúde da cidade de Cachoeira do Piriá, localizada no nordeste do Estado, conta que o principal motivo para a baixa cobertura vacinal do município é a recusa dos habitantes. Ele conta que a rejeição não é exclusiva à campanha anticovid, todas as outras já realizadas pela pasta enfrentam a mesma dificuldade de adesão. O titular justifica: “Todas as campanhas de vacinação têm baixa procura, isso deve-se porque a maior parte da população possui pouca instrução. A maior parte dos nossos habitantes estão em áreas rurais. Temos 81 comunidades, muitas delas quilombolas, a maioria sem energia elétrica”.

“Além desses fatores que já são determinantes, o município nunca entrou em período de caos. Como não houve essa situação por aqui, a maior parte das pessoas não tiveram interesse em serem vacinadas. Já estamos 50 dias sem casos de covid-19 aqui na cidade e desde o ano passado não tivemos mais óbitos em decorrência da doença”, completou Keyner da Silva.

JACAREACANGA

Alan Simon, secretário de Saúde do município de Jacareacanga, sudoeste do Pará, afirma que o Governo do Pará encaminhou doses suficientes de imunizantes para a cidade e a prefeitura seguiu o cronograma estabelecido pelo Ministério da Saúde, no entanto, a própria população teria rejeitado a campanha de vacinação. “60% dos habitantes são indígenas, a maioria munduruku, 40% não é indigena, mas ambos são antivacina, negacionistas. Fizemos ações, inclusive nos finais de semana, mas não conseguimos atingir a meta de mais de 80% de imunizados. Outro fator agravante é que temos uma população rotativa, muita gente que recebeu a vacina não é daqui”, afirmou o titular da pasta. 

Em contrapartida, o secretário conta que a cidade está há 30 dias sem casos positivos e mortes provocadas pelo coronavírus. Ele diz ainda que o sistema local apresenta instabilidade, com isso não conseguem enviar dados para o Estado. “Nós tivemos os menores índices de mortes aqui em Jacareacanga. Aqui estamos sem nenhum caso registrado há 30 dias. Mas ainda temos dificuldades de enviar dados para a Sespa por causa da sistematização precária”, garantiu Alan Simon.

SANTANA DO ARAGUAIA

Por meio de nota, a Prefeitura Municipal de Santana do Araguaia, cidade localizada no sudeste do Pará, informou que “tem feito um esforço imenso para imunizar todos os santanenses com mutirões de vacinação e até visitas itinerantes às residências, às escolas e locais de difícil acesso”, além de campanhas diárias nas rádios e mídias sociais. Ainda de acordo com o comunicado, o Governo do Pará colocou à disposição “vacinas suficientes para proteger todos os municípios contra o coronavírus”. a nota segue: “infelizmente, por conta de fatores alheios à nossa vontade, parte da população se recusou a receber doses da vacina, contrariando o chamado do Poder Público constituído”.

A prefeitura afirma, ainda via comunicado, que Santana do Araguaia sofre influência de Tocantins e Mato Grosso em diversos aspectos por fazer fronteiras com esses estados, até “dos meios midiáticos que se colocam resistentes à vacinação em massa”. O executivo municipal acredita que o posicionamento dos veículos de comunicação desses estados “estejam refletindo na pouca adesão à imunização, impossibilitando diretamente que seja alcançado o objetivo estabelecido pelos órgão competentes”, finaliza a nota.

Fake News

RURÓPOLIS

Francisca Schommer, secretária de Saúde da cidade de Rurópolis, no oeste do Pará, afirma que os principais fatores que interferiram na cobertura vacinal no município foram as fake news contra a vacina da covid-19 propagadas na região. “Isso nunca tinha acontecido antes. As fake news aqui em Rurópolis foram muito fortes. Constatamos que os nossos habitantes realmente acreditam que as vacinas contra a doença possam trazer algum tipo de prejuízo para eles. Ultimamente a maior dificuldade que a gestão da Saúde tem passado é a adesão da vacinação de crianças. Os pais delas têm se negado a levá-las aos pontos de vacinação. As coisas aqui ficaram bastante difíceis", desabafou.   

SÃO FÉLIX DO XINGU

Rafael Antônio, titular da Secretaria Municipal de Saúde de São Félix do Xingu, localizado no sudeste paraense, diz que alguns fatores interferiram no desempenho da cobertura vacinal da cidade, porém ele certifica que “crenças religiosas” foram relevante à baixa colocação do município hoje no ranking do VacinÔmetro da Sespa. “Nós fizemos várias ações de campanha contra a covid-19, chegamos até a oferecer prêmios para quem tomasse a vacina, mas as pessoas estão resistentes, acreditam muito nas fake news, mas o que atrapalha muito são as crenças religiosas que são contrária às vacinas. Nossa sorte é que os casos de doença zeraram aqui. Nos dois últimos anos tivemos 53 óbitos", contou. 

ÁGUA AZUL DO NORTE

Wanderley Milhomin, secretário de Saúde de Água Azul do Norte, localizado no sudeste paraense, comenta que a cidade é pequena e possui mais de 27 mil habitantes, a maior parte reside em zonas rurais. No entanto, ele afirma que a logística não é o único desafio para a vacinação. A interferência de lideranças evangélicas é outro problema. “A nossa zona rural é uma das maiores do Estado, conseguimos ir nas comunidades mais distantes, porém a maioria da população é evangélica e segue à risca o que recomendam os pastores nas igrejas, que algumas vezes são contrários à vacinação contra a covid-19”, declarou o secretário.

Ainda de acordo com Wanderley Milhomin, o público infantojuvenil é o mais resistente para receber a aplicação da vacina anticovid. “Por incrível que pareça, os jovens são os mais resistentes para serem vacinados contra a doença. Já as pessoas com até 50 anos tiveram mais aceitação, isso inclusive foi motivo de surpresa para gente. 99% desse público tomou a primeira e segunda dose, assim como a dose de reforço. A cobertura das crianças também está baixa, elas não estão comparecendo aos pontos de vacinação", finalizou.

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Os 20 municípios com os menores índices de vacinação no Pará

Município % Cobertura
 
SÃO FELIX DO XINGU 17,51%
SANTANA DO ARAGUAIA 18,58%
ULIANÓPOLIS 23,25%
NOVO REPARTIMENTO 26,34%
RURÓPOLIS 28,41%
IPIXUNA DO PARÁ 30,13%
ÁGUA AZUL DO NORTE 30,34%
CACHOEIRA DO PIRIÁ 30,43%
PACAJÁ 31,04%
PLACAS 31,73%
CUMARU DO NORTE 31,77%
ELDORADO DOS CARAJÁS 33,30%
VISEU 34,14%
TRAIRÃO 35,22%
URUARÁ 35,51%
CHAVES 35,82%
FLORESTA DO ARAGUAIA 36,85%
BREU BRANCO 37,78%
MEDICILÂNDIA 38,19%
DOM ELISEU 38,95%
 
Fonte: Vacinômetro/Sespa (atualização em 29/4/2022)
Pará