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'É como voltar pra casa': histórias de fé e expectativa na torcida azulina no jogo do século

Casais que nasceram remistas, famílias que cruzam o país e crianças que aprenderam cedo a amar o azul-marinho vivem neste domingo a chance de ver o Remo retornar à Série A após 32 anos

Fábio Will e Igor Wilson

A torcida do Remo viveu a semana que antecedeu o jogo de hoje contra o Goiás num estado que misturou expectativa, prudência e a dimensão de um momento raro. Depois de 32 anos longe da Série A, o clube chega à última rodada da Série B com a chance de voltar à elite, cenário suficiente para mobilizar famílias, relembrar velhas histórias e criar novas. Nas arquibancadas do Mangueirão, que hoje reunirão diferentes gerações, torcedores trazem relatos que ajudam a medir o significado desse possível acesso — desde quem conheceu o Remo nos seus anos mais difíceis até quem viaja de outro estado para presenciar um dia histórico.

Entre os milhares de azulinos que devem ocupar as cadeiras do estádio, a história de Anna Paula Dias e Mário Pantoja revela como o Remo atravessa a vida dos torcedores para além do campo. Eles se conheceram em 2009, na Sede Náutica do clube, justamente no primeiro ano em que o time ficou sem divisão. Foi ali, em meio a um dos piores momentos do clube, que a relação começou. Desde então, o casal acompanha o time em todas as fases. Hoje têm dois filhos, Mário Dias, de 5 anos, e José Bento, de 1, que já nasceram vestindo azul-marinho, e com maior sorte que os pais, pois vivem uma das melhores fases do clube.

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Para Anna Paula, a semana tem sido de ansiedade e rituais mantidos com rigor. “Todas as superstições do mundo. Eu uso a mesma roupa, tento fazer o mesmo ritual de quando o Remo ganhou. O que não deu certo no último jogo eu não faço. Só compro bandeiras depois que ganha, não uso camisa nova. Está complicado [dormir], uma ansiedade absurda, mas com esperança e fé que vamos subir".

Ela descreve como é viver a possibilidade de um acesso ao lado da família que se formou dentro do clube. “É gratificante, pois passamos por momentos difíceis. Nos conhecemos na Sede Náutica, naquele movimento ‘VoltaREMOS’, e hoje estamos aqui, consolidados, felizes com esse ano surpreendente depois de subir da Série C. Foi uma temporada gratificante e que tem que ser coroada com acesso". 

Os filhos reforçam essa ligação com o clube desde os primeiros dias. “Meus filhos já saíram da maternidade vestidos de Remo. Não entra outra cor aqui em casa que não seja o azul-marinho. Aqui é Remo, Remo e Remo. O meu filho mais velho já sabe as músicas, o hino, já não fala mais aquele nome, é ‘aquela coisa’ e não tem outra possibilidade". 

Mário acompanha o mesmo sentimento. “Remista e brasileiro são duas espécies que não desistem nunca. Estamos sempre naquela expectativa de acompanhar, Série D, Série C, Série B, e agora vivemos essa nova era de o Remo acender à Série A. O Remo obviamente é um time grande, mas agora fazendo parte da elite do futebol brasileiro.”

Ele lembra que com o Remo, tranquilidade nunca foi regra. “Tranquilidade e Remo não são sinônimos. Vimos o Remo subir para a Série B em 2005, ninguém esperava que fosse campeão, só queríamos que subisse. Mas acabou sendo campeão. Vamos pela esperança do acesso à Série A e vivenciar um novo momento do futebol paraense que a gente merece.”

E projeta viver esse momento ao lado da família que começou no próprio clube. “A gente que acompanhou o Remo na Série A quando era criança, e graças a Deus temos essa oportunidade de vivenciar isso com os nossos filhos. Estamos há 16 anos juntos. Vimos o Remo sem divisão e esperamos ter o Remo na Série A e compartilharmos esse momento". 

De Manaus

Outra história que deve cruzar as arquibancadas no domingo começa a mais de 800 quilômetros de Belém. De Manaus vieram Ernando Amorim e o filho, Ernando Júnior, ambos remistas e familiares de Paula. A viagem não estava programada, mas a proximidade do acesso falou mais alto.

“Sou de Manaus e estamos aqui para assistir ao jogo. É muita ansiedade e mesmo morando longe, sempre acompanhamos o Remo. Desde criança sou Remo, tenho camisas, meus pais são Remo, então é um sentimento de ansiedade, nervosismo". 

O estudante conta que veio sem pensar duas vezes: “Vimos as passagens, compramos e viemos pra esse dia histórico. Nunca vi o Remo na Série A, nunca vi ele jogando com esses times grandes e é uma realização de um sonho". 

Como muitos torcedores, ele também acompanha a disputa paralela com o rival. “Estamos ansiosos, mesmo vivendo em Manaus assistimos todos os jogos do Remo, secamos o Paysandu e a ansiedade é enorme, sem contar que tem um gosto especial pelo Paysandu ter caído". 

O pai lembra das recordações da época em que via o Remo enfrentar Flamengo, Cruzeiro e outros times da elite. “Já vi vários jogos do Remo na Série A contra o Flamengo, Cruzeiro. Nunca perdemos para o Cruzeiro aqui e lá, é uma das maiores vítimas do Remo. Voltar à Série A é emocionante. Espero voltar à elite tanto para rever a família como para ir ao estádio". 

Ele guarda lembranças marcantes desses anos. “Passa um filme na cabeça contra o Flamengo e volta tudo. Estava jogando Remo x Flamengo e eu estava em Nazaré. Por incrível que pareça tinha uma camisa do Sport Belém (vermelha e preta), joguei a camisa fora e entrei no Baenão sem camisa, pois não podia entrar com as cores do Flamengo. Isso não foge da memória nunca". 

E reconhece que essa herança passa adiante. “O sentimento de ser remista ele aprendeu comigo. Assistindo aos jogos juntos. Torcer para o time não é incentivar, as crianças vão aprendendo com os pais e aprendem a ser torcedores. Quando reúne pai, mãe e filhos com os familiares, melhor ainda".