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Novo mínimo congela poder de compra

Reajustado apenas pelo índice da inflação do governo, remuneração mínima é insuficiente para despesas básicas dos trabalhadores

Elisa Vaz

O orçamento do trabalhador paraense não deve sofrer grande impacto com o valor do novo salário mínimo de 2022. A remuneração básica poderá ser 4,27% superior à que está em vigor hoje – R$ 1.147, pela proposta do governo federal dentro do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) do ano que vem, divulgado pelo Ministério da Economia na última quinta-feira (15).

Embora haja crescimento no valor, a taxa de reajuste é a mesma prevista pelo órgão para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) deste ano, feita no mês de março, que mede a inflação no país. Portanto, especialistas do setor da economia avaliam que o trabalhador não terá ganho real.

Como explica o economista Valfredo de Farias, antes, o salário mínimo era calculado em cima da inflação e do crescimento da economia no país, medido pelo Produto Interno Bruto (PIB). “Se tivéssemos uma inflação de 2% e o Brasil crescesse mais 2%, o reajuste seria de 4% na remuneração básica. Então o que ocorria era que, além do reajuste da inflação, havia o aumento real. Essa fórmula foi mudada há cerca de dois anos, e agora é reajustado somente pelo INPC, ou seja, inflação. Está sendo projetado um reajuste de, aproximadamente, 4,3% para este ano, e o salário mínimo segue esta taxa. Pode ser que o percentual fique maior, dependendo de quanto vai ficar a inflação no fim do ano. O Congresso que define”, destaca.

Com o aumento seguindo apenas a inflação, de acordo com Valfredo, o poder de compra do trabalhador não cresce. O valor, extremamente baixo, na opinião do economista, fica ainda pior se comparado ao dólar, o que deixa claro que o brasileiro recebe mal. E, sem o ganho real nos reajustes do salário mínimo, não há impacto positivo no orçamento dos trabalhadores.

Se for considerado que a maioria dos produtos tem altas superiores à inflação, o cenário fica mais difícil. Por exemplo, o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) aponta que, apenas no primeiro trimestre deste ano, a alimentação básica no Pará ficou 2,97% mais cara. Se o reajuste se mantiver no segundo trimestre, a alta já será superior aos 5%. Ou seja, mesmo que o trabalhador receba 4,27% a mais, perderá dinheiro, já que a alimentação ficou acima da inflação. Na comparação entre março de 2020 e março de 2021, segundo o Dieese, a alta foi de 23,15% na cesta básica. O economista Valfredo de Farias lembra que ainda precisam ser contabilizados outros produtos, como o gás de cozinha, o combustível, o aluguel e outras despesas.

Na avaliação do especialista, a remuneração básica no Brasil não “dá para nada”. “Claro que é muito dinheiro para quem não tem nada, muitas famílias vivem com o salário mínimo e esse dinheiro faz muita diferença para elas. Mas é aquela história: você está vivendo com um salário mínimo, então você, basicamente, vai viver na pobreza a vida toda, porque esse salário só dá para você se alimentar e algumas necessidades muito básicas do dia a dia, não dá para ter uma boa qualidade de vida”.

Por outro lado, ele avalia que não é possível que o reajuste seja muito maior que isso, por conta do impacto no orçamento da União. Hoje, segundo ele, a cada R$ 1 incrementado no salário mínimo, o governo tem um impacto de R$ 315 milhões em suas contas. “Isso ocorre muito em função dos benefícios do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), como seguro-desemprego e aposentadoria, que são vinculados ao aumento do salário mínimo e são impeditivos para que haja um reajuste maior. Além disso, vivemos um período de déficit crônico, isso piora mais a situação”, opina Valfredo.

Assalariada complementa renda por fora

Seguindo a estimativa de economistas, uma família comum, com dois adultos e duas crianças, gasta pouco mais de 50% de um salário mínimo apenas com alimentação. Com o valor previsto para o ano que vem, a despesa ficaria próxima dos R$ 600. Com este valor, seria possível, no Pará, comprar uma cesta básica, que custava, em março, R$ 515,77, segundo o Dieese, e utilizar o restante com outros alimentos.

A vendedora Elisângela Santos, de 37 anos, trabalha em uma doceria ganhando um salário mínimo. Para ela, o valor não dá para pagar todas as necessidades básicas - só com a alimentação, ela e a família gastam cerca de R$ 700, já incluindo o gás de cozinha. "Moro com meu marido e dois filhos. Além do meu salário, tento complementar minha renda por fora, e tenho minhas encomendas de bolos e doces em casa também", conta. Quanto ao reajuste da remuneração, ela diz que foi muito pequeno e que não será possível gastar um valor extra. "Quando sobe o salário, todo o resto aumenta também", argumenta a trabalhadora.

Presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil Seção Pará (CTB-PA), Cléber Rezende afirma que o impacto do novo salário mínimo é "insignificante" diante das demandas do trabalhador. "Compreendendo a atual condição dos trabalhadores, um aumento de 4,27% é muito aquém das necessidades. A remuneração básica deveria cobrir despesas do dia a dia, como moradia, lazer, estudo e transporte. Hoje, o salário mínimo de R$ 1.100 não cobre, e a elevação para R$ 1.147 também não", avalia.

Segundo ele, o aumento da inflação e dos itens básicos, como alimentação, gás de cozinha e outros, faz com que o trabalhador não tenha poder de compra. Somado a isso, ainda há o fato de que outros gastos ficaram maiores durante a pandemia, a exemplo das despesas com remédios. Além disso, no trabalho remoto, o empregado ainda precisa gastar mais dinheiro com energia elétrica, internet e tecnologia. Na opinião de Cléber, é preciso haver uma reposição real do salário mínimo e uma política de valorização da remuneração do trabalhador.

Empresário diz que haverá novo impacto nos negócios

Por outro lado, a mudança do salário mínimo também afeta os empregadores. O empresário e engenheiro eletricista Murilo Cavalcante, de 30 anos, que atua como gerente de projetos e é dono de uma empresa de engenharia, afirma que precisará administrar mais esse aumento entre diversos outros enfrentados nos negócios em meio à pandemia. Por outro lado, ele acredita que, para a classe mais baixa, o aumento foi pequeno e diminuirá o poder de compra dos trabalhadores.

O empresário ressalta que seu negócio enfrentou problemas de caixa e faturamento por conta da crise sanitária. "Como trabalhamos com um produto diferente do mercado, algumas pessoas não entendem o seu valor agregado e a possibilidade de redução de custos em obras, então preferem contratar profissionais sem essa expertise, por serem mais baratos, porém arcam com problemas durante a execução das obras. Quem nos contrata consegue estruturar suas obras de forma completa e tem ganhos durante a execução. Com cinco colaboradores, Murilo adianta que não vai mudar o quadro interno, mas terá que redistribuir atividades para não precisar contratar outros funcionários.

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Economia
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