Pimenta, cumaru, muruci: Pará se destaca na produção de chocolates com sabores amazônicos
Com sabores amazônicos e produção sustentável, empreendedores paraenses fortalecem identidade regional e se preparam para conquistar mercados durante a COP 30.
Neste Dia Internacional do Chocolate, celebrado nesta segunda (7/07), o Pará ganha destaque não apenas como um dos maiores produtores de cacau do Brasil, mas como um celeiro de inovação na produção de chocolates de origem com sabores da floresta. Empreendedores como Soliana e Rafaela Cruz, em Belém, mostram como a valorização dos insumos regionais e das comunidades tradicionais está transformando o chocolate paraense em símbolo de identidade, sustentabilidade e sofisticação — e como o setor se prepara para a visibilidade internacional trazida pela 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente (COP 30).
Chocolate com pitada amazônica
Do cupuaçu ao bacuri, passando pelo açaí, muruci, manga e cumaru, a confeitaria de Soliana Cruz, em Belém, tem reinventado o chocolate paraense com recheios e combinações que celebram a biodiversidade amazônica.
“É muito comum aqui em Belém a gente comer bombom, mas quando trouxemos as barras recheadas com sabores regionais, como a de açaí ou a de manga, foi uma novidade que pegou. As pessoas começaram a buscar e querer provar os sabores daqui”, conta Soliana.
A empresa, gerida em parceria com a irmã Rafaela Cruz, também se diferencia pela criação de kits que misturam chocolate, artesanato local e design funcional, com embalagens bilíngues e selos de sustentabilidade.
“Parte dos nossos recheios vem de comunidades tradicionais do interior do estado. Quem compra nosso chocolate ajuda a fomentar a economia local e uma cadeia mais justa e sustentável”, afirma Rafaela.
Do SAF à prateleira: o cacau de origem em alta
O crescimento do setor não se dá por acaso. De acordo com Rubens Magno, diretor-superintendente do Sebrae no Pará, o estado tem investido fortemente na cadeia do cacau, com foco na agricultura familiar e em sistemas agroflorestais (SAFs), que conciliam preservação ambiental e geração de renda.
“O Pará se destaca como um dos maiores produtores de cacau do Brasil. A maior parte da produção vem de pequenas propriedades, muitas em áreas antes degradadas, hoje recuperadas por meio da cultura cacaueira. Além disso, nossas amêndoas estão entre as melhores do mundo”, afirma Rubens, destacando o reconhecimento internacional de regiões como Altamira e Tomé-Açu.
A atuação do Sebrae envolve desde consultorias e microcrédito até o apoio à exportação e capacitação em inovação, gestão e marketing.
“O chocolate pode, sim, seguir os passos de sucesso do açaí. Estamos ajudando os empreendedores a verticalizarem a produção, agregarem valor e acessarem novos mercados”, completa.
Turismo, identidade e expectativa para a COP 30
A confeitaria das irmãs Cruz é exemplo de como o chocolate também virou um atrativo turístico. “60% dos nossos clientes são turistas. Eles buscam as barras de bacuri, os kits com cuias e cerâmicas, porque é algo que representa o Pará. Vendemos muito na Páscoa e no Círio, mas esperamos triplicar o faturamento durante a COP 30”, conta Rafaela, que já está ampliando a produção e modernizando as embalagens para o evento.
A realização da Conferência do Clima da ONU em Belém, em novembro, deve ser um divisor de águas para o setor. Para o Sebrae, a COP é uma vitrine global para consolidar o chocolate paraense como produto de origem, identidade e impacto positivo.
“O nosso chocolate é uma iguaria que precisa ser valorizada por quem vive aqui, mas também desejada por quem vem de fora. É sabor, cultura e identidade em cada mordida”, conclui Soliana.
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Preços acessíveis e presentes personalizados
Um dos trunfos da marca da confeitaria de Rafaela e Soliana é oferecer opções para diferentes bolsos e finalidades. Os bombons, que funcionam como produto de entrada, custam entre R$ 5 e R$ 7. Já os kits personalizados, que incluem chocolates artesanais, cuias, miriti e peças de cerâmica regional, chegam a R$ 75 e são muito procurados por turistas em busca de presentes autênticos.
“As barras recheadas com sabores amazônicos, como cupuaçu, bacuri, castanha-do-pará e manga com cumaru, também são bastante populares — tanto entre os moradores locais quanto entre os visitantes que querem levar um pedaço do Pará para casa”, destaca Rafaela.
Amêndoa de várzea garante renda para produtores
O cacau é decisivo na vida de Nayanny Maia, sócia fundadora de uma empresa de fabricação de chocolate e que hoje ocupa o cargo de Co-CEO dessa empresa. Ela conta que foi muito dolorido e desafiador o luto pela perda do pai em meio à pandemia da Covid-19.
Contudo, a partir do ensinamento de seu genitor - “se vocês souberem trabalhar vocês nunca mais terão chefe na vida novamente” - Nayanny e outros gestores da empresa optaram por transformar toda aquela história e legado em um negócio de impacto. "Para preservar os saberes tradicionais, a floresta e a memória dele que tanto amou Mocajuba", diz a empresária, cuja produção de chocolate utiliza cacau nativo de várzea de Mocajuba, município do nordeste do Pará.
"Historicamente, ainda no Brasil colônia, o território onde se localiza mocajuba já era muito conhecido pelo cacau. Caravelas aportavam naquela região em busca desta amêndoa para levá-las ao Velho mundo. E o cacau lá plantado possui aromas e notas de sabor únicos devido ao ecossistema da várzea, produzindo uma amêndoa com mais teor de manteiga", conta Nayanny.
O negócio de Nayanny tem parcerias estratégicas com as comunidades locais para funcionamento de um modelo agroextrativista e sustentável. A empreendedora ressalta que no geral trata-se de produtores de cacau (empresa e comunidades).
"Dessa forma, tudo que aprendemos ou recebemos de técnicas e práticas dentro da área é partilhado com nossa comunidade, para que o cultivo e a produção sigam um modelo sustentável ambientalmente. Nós também abrimos mercado para que além da empresa, outros compradores possam acessar o cacau e os derivados produzidos em Mocajuba. E sempre prezamos pelo preço justo, para que o produtor ribeirinho receba o valor honesto pelo que produz, gerando renda e oportunidade de negócios para todos", salienta.
A empresa tem base produtiva em Santa Bárbara, origem em Mocajuba e uma loja física na Cidade Velha, em Belém. Essa logística, como explica Nayanny, é um ponto importante dentro do negócio, "e isso só e possível por que somos quatro mulheres que lideram diretamente em cada um desses setores, do plantio até o produto final, com o apoio da nossa equipe de colaboradores".
Neste Dia Mundial do Chocolate, Nayanny Maia deixa um recado:
"Empreender na Amazônia só é possível se estivermos em harmonia com a floresta e principalmente com as pessoas que nela vivem. Os desafios sempre existirão, mas com a experiência que temos com a empresa eu digo: conheça seu território, conheça a sua comunidade, conheça a origem do seu produto/serviço. Eles têm muito a dizer e muito a ensinar, acredito que essa seja a grande chave, aprender com quem sempre esteve no território, para que seu negócio tenha sucesso, sustentabilidade e impacto positivo".
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