JULIANA DINIZ

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Análises e opinião sobre política, filosofia e atualidades pelo olhar da doutora em Direito e professora da Universidade Federal do Ceará, Juliana Diniz.

Os generais e a desonra

Juliana Diniz

Honra é uma palavra bonita, que nos remete a uma qualidade superior. Segundo o dicionário, é “princípio que leva alguém a ter uma conduta proba, virtuosa, corajosa, e que lhe permite gozar de bom conceito junto à sociedade”. Não é por outro motivo que os militares gostem de ver a si mesmos como seres inspirados por esse ideal de correção moral, física e espiritual: afinal de contas, é próprio da missão das armas a aptidão ao sacrifício em nome de um bem maior ou uma causa comum. Uma missão intimamente ligada ao que entendemos por honra.

Se pensarmos nas Forças Armadas como um corpo pronto à luta, entendemos a importância da hierarquia e da disciplina para seu bom funcionamento. Como os homens são naturalmente dados a debilidades, paixões e desvios, é importante que todo descumprimento da norma seja corrigido com rigidez, lembrando ao indivíduo que é papel de quem está no comando da instituição evitar que o mal passo de uma peça prejudique a força do todo. Toda a legitimidade da punição que um superior impõe ao inferior na hierarquia reside no reconhecimento de que a autoridade comanda porque é capaz de manter-se fiel ao ideal máximo de honra, servindo de exemplo e régua.

Só assim conseguimos distinguir a virtude militar da obediência (o agir por dever) da debilidade da subserviência (o não agir por ser fraco). Só devo obedecer ao que é superior e reconhecido como ideal por mim. Quando consideramos esse raciocínio, entendemos que mesmo a desobediência a uma ordem pode representar um gesto heroico e corajoso, porque para manter-se honrado um militar não deve ser servil ao que é indigno.

Vamos ilustrar pelo mínimo de exigência moral, ainda no patamar inicial dos aspirantes a oficiais. Segundo o Código de Honra da Escola Preparatória dos Cadetes do Exército, o aluno deve ser “irrepreensivelmente honesto em todos os atos da sua vida, não faltando jamais a verdade nem obtendo por meios condenáveis aquilo a que não tem direito ou que não pode conseguir à custa do seu próprio esforço”. O cadete “procura guiar-se em todas as circunstâncias pelas normas da virtude, sabendo que não poderá ser um bom soldado se não for perfeito como cidadão”.

Tem sido difícil para o brasileiro observar o comportamento e as motivações do ex-ministro da Saúde e general Eduardo Pazuello e encontrar nele qualquer resquício do ideal de dignidade honrosa que deveria nortear o mais imberbe dos cadetes. O ápice do desvio foi a sua participação em ato político e não oficial promovido pelo presidente da república. Trepado em cima de um carro de som, o general foi carinhosamente chamado de meu gordinho enquanto discursava sem máscara.

A um general da ativa tão servil só esperávamos uma resposta: a punição exemplar do Alto Comando, como demonstração inequívoca de que a debilidade de uma peça não é capaz de prejudicar a integridade do corpo. Pazuello não somos nós, seria a mensagem. O que vimos? Uma instituição que gosta de falar em honra e em virtude capitular ante a anarquia, dobrando-se à miséria moral e à indignidade, para a melancólica constatação de que somos mesmo um país de armas fracas e homens ímpios.

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Juliana Diniz
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