Um sonho de infância na festa de Nazaré

Filha de Bruno de Menezes relata excursão com a mãe, a Professora Francisquinha

MARÍLIA MENEZES, ESPECIAL PARA O LIBERAL

Uma das minhas lembranças imorredouras ligadas à Festa de Nazaré é a ida ao famoso Arraial para andarmos nos cavalinhos - grandes, coloridos, feitos de madeira especial, modestos, mas cheios de encanto - e que, levando as pessoas, com elas subiam e desciam – desciam e subiam - os nossos sonhos, que a festa de Nazaré ajuda a alimentar.

Era o período da Festa, após o Círio, e os cavalinhos atraíam o povo. Decorria o ano de 1941, em que eu tinha 9 anos e estava concluindo o 5º. ano primário, no superlotado Grupo Escolar “Ruy Barbosa”, no Largo do Palácio – onde é hoje o prédio da Assembléia Legislativa. Nós, os 4 irmãos menores, estudávamos nessa Escola do Governo: Stéleo Bruno, José Haroldo, Marília e Lenora, com idades dos 11 aos 8 anos, sendo mamãe, nessa escola, e fora dela, a afamada “Professora Francisquinha”.

Um dia mamãe chega do Grupo alvoroçada e Bruno, meu pai, a ouve dizer: a diretora Carlotinha convocara as professoras para informá-las que o Sr. Prefeito viera em pessoa ao Ruy Barbosa trazer 200 entradas a fim de, em determinado dia, os alunos das 3 séries mais adiantadas serem levados ao arraial de Nazaré para andar nos famosos cavalinhos – sensação da cidade. Explicou que todas as professoras das séries indicadas deviam estar ao meio dia no Grupo. Todas deviam ir para ajudar a manter a ordem na tarefa: levar a tropa ao arraial, e trazê-los de volta ao Ruy Barbosa, até às 18hs, quando os pais viriam buscá-los ou iriam sozinhos para casa. Informou que o prefeito enfatizou: que era uma adesão aos festejos da Padroeira e cooperação com a Educação. Disse ainda que, no Largo, seriam dados bombons aos estudantes. Papai disse:

- Que bom, Francisquinha, para as crianças ! Que milagre foi esse? - Você tem razão: milagre, do qual desconfiamos! Confesso que não gostei nada, nem a maioria das professoras, pois sabemos o trabalhão que nos espera, cansadas como vivemos da luta escolar.

Mamãe contou ainda que umas disseram que era só politicagem, e o mais necessário era pôr o salário dos professores em dia...

Mas não havia escapatória. Entre verdades e brincadeiras que nosso pai dizia, e o entusiasmo dos filhos, mamãe se animou, enquanto nós 4 não cabíamos em nós de contentes. Tendo almoçado qualquer coisa, e com os uniformes bem limpinhos, nós, 200 estudantes, fomos para a fila e pegamos o transporte. Lembro que mamãe recomendara ao máximo os 4 filhos para nossas professoras.

Antes de pegarmos os ônibus, a diretora, que era célebre pelo seu rigor, nos traçou extenso be-a-bá sobre a disciplina nessa aventura.

Junto ao stand dos Cavalinhos, em filas para subir no devido animal, não tirávamos os olhos de nossas professoras. Sentíamos, - crianças pobres como nós, que subir e descer em um cavalinho da Festa de Nazaré era o maior prêmio da vida. Ao subir nos animais, a excitação era máxima, e nossos gritos de alegria deviam alçar-se até o céu, motivados pela visão dos edifícios, da cidade, e da igreja com Nossa Senhora dentro.... .

Ao voltar para casa, cada estudante acabara com o saquinho de bombons que o Prefeito nos mandara, sem, porém, esquecer a fome.

No dia seguinte, um jornalista da cidade veio entrevistar as professoras do Grupo Ruy Barbosa sobre a grande cortesia da Prefeitura, e a Diretora Carlotinha “empurrou” mamãe, famosa como esposa do Bruno, de “fazer discursos”, e que, por natureza e preparo, tinha oratória fácil. Disse mamãe:

- A minha emoção foi grande...Olhei a cidade com os olhos das crianças, no alto dos cavalinhos, e sonhei alto... Desejei que Belém fique livre dos buracos, das calçadas quebradas, das alagações. Quando os cavalinhos desciam, vi tanta miséria, tanta fome, e o salário tão baixo das professoras. Mas vi Nossa Senhora de Nazaré, na fachada da igreja, e pedi pelas autoridades, e por todos nós. E nada mais posso dizer.

 

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