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Agricultores europeus dificultam negociações com o MERCOSUL

Gabriel Borne

Na última semana, Paris acordou sitiada por centenas de tratores, concluindo uma marcha de agricultores vindos de todo o interior da França. Seguindo a mesma tendência, protestos similares aconteceram em outros países do bloco europeu nesta semana, acentuando ainda mais ainda uma crise regional, não restrita apenas à França.

Enquanto a pauta da União Europeia tem se movido cada vez mais em direção ao combate às mudanças climáticas, percebe-se um descompassado às vontades de grupos que se veem prejudicados pelas medidas tomadas pelo bloco para frear a crise climática. Agricultores de todo o continente, descontentes com a queda nos seus rendimentos ao longo dos últimos anos, queixam-se de que o bloco tem dado as costas às suas necessidades, adotando uma agenda ambiental rígida, que os torna pouco competitivos em relação ao resto do mundo, incluindo o Brasil, e inviabiliza a produção de alimentos no continente.

Dentre as razões dos agricultores europeus, estão o aumento dos custos de transporte, exacerbados pelo aumento dos tributos sobre o óleo diesel e o aumento do custo da energia em geral, que vem aumentando por conta dos investimentos maciços na transição para fontes de energia limpa, que ainda são mais caras do que as tradicionais fontes fósseis, como gás e carvão. Nesse contexto, até mesmo a opção da União Europeia em limitar a compra de gás natural e petróleo da Rússia, em razão do conflito com a Ucrânia, vem sendo apontada como uma das razões para o aumento do custo de produção para os agricultores europeus.

Além disso, crescem também as restrições ao uso de fertilizantes e agrotóxicos, que já são grandes na União Europeia em comparação a outros lugares do mundo, tornando os produtos europeus ainda menos competitivos em comparação ao resto do mundo.

Enquanto isso, as trocas de acusações entre o Presidente Lula e o Presidente francês, Emmanuel Macron, estão longe de criar uma solução para um impasse que já dura mais de vinte anos. Por um lado, o presidente francês argumenta que os produtos brasileiros não cumprem as exigências sanitárias da União Europeia, especialmente no que diz respeito ao uso de agrotóxicos, enquanto Lula afirma que o Brasil e o Mercosul não podem se subordinar às demandas dos europeus.

Quanto ao argumento de Macron, não passa de bravata. O Brasil já é um dos maiores exportadores de produtos agrícolas à União Europeia, situação que se aprofundou desde que os produtores da Ucrânia passaram a ter dificuldades de escoar sua produção com a guerra. As exigências sanitárias europeias já são cumpridas por grande parte dos produtores do Mercosul. O que assusta mesmo os franceses é a possibilidade de o acordo tornar ainda mais competitivos os produtos sul-americanos, e assim inundarem o mercado europeu, o que aprofundaria ainda mais as dores dos agricultores locais e a pressão sobre os políticos.

No fim das contas, a maior dificuldade do Mercosul em fechar o acordo comercial com a União Europeia é lidar com as pressões políticas dos agricultores do bloco, que só tendem a se intensificar conforme o bloco caminha em direção a restrições cada vez maiores para os seus produtores rurais e enfrenta o aumento dos custos de energia no seu mercado interno. E assim caminhamos para mais um ano sem que o acordo, negociado desde 1999, vá a lugar algum.

Gabriel Borne
Mestrando em Direito Econômico no Instituto de Estudos Políticos de Paris