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Instabilidade política e social afeta saúde, diz estudo

Na prática, os resultados sugerem que exposições estruturais combinadas, além do estilo de vida individual, interferem no processo de envelhecimento

Estadão Conteúdo

Cansado do noticiário de problemas na política, crimes, poluição e corrupção? Sim, os aspectos negativos da instabilidade política, da desigualdade social e da corrupção que vivemos na sociedade contemporânea realmente afetam sua saúde para pior. É o que comprova uma nova pesquisa publicada em julho na revista científica Nature Medicine.

Desenvolvida por 41 estudiosos da América Latina, Europa, África e Ásia, incluindo pesquisadores brasileiros, ela revela que os fatores políticos, ambientais e sociais de um país influenciam, de forma significativa, o estado de saúde mental e físico, ocasionando maiores índices de declínio cognitivo e quadros de demência.

Na prática, os resultados sugerem que exposições estruturais combinadas, além do estilo de vida individual, interferem no processo de envelhecimento, variando bastante entre os países. É o primeiro estudo com grande volume de dados a correlacionar a polarização política, as falhas de governança e a instabilidade institucional ao declínio cognitivo e de capacidades físicas do corpo.

Segundo um dos autores do estudo, Eduardo Zimmer, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e pesquisador apoiado pelo Instituto Serrapilheira, isso acontece pela exposição a fatores estressores, como explicou em entrevista ao Viva.

"A hipótese que usamos para explicar esse declínio é a 'hipótese do exposoma', que é a soma de exposições que a gente tem na nossa vida. O exposoma de alguém que vive no sul global é mais estressor do que alguém que vive no norte global".

Nesse sentido, destaca Zimmer, o brasileiro acaba perdendo aproximadamente cinco anos de vida do cérebro em relação à média global. "Com tudo o que vem acontecendo nos últimos anos, a política ganhou muita força nas redes sociais, um debate que muitas vezes é pouco produtivo e mais beligerante, as pessoas mais brigam do que discutem solução e isso cria um estresse crônico. É um fator que afeta a vida e o cérebro das pessoas", explica.

A poluição do ar também foi um dos fatores do estudo apontado como negativo para o envelhecimento saudável. Não é a primeira vez que o tema aparece nesse tipo de estudo, contudo, tradicionalmente as pesquisas focam em condições de caráter particular, como passado genético e estilo de vida. Segundo essa nova pesquisa, o envelhecimento tem um espectro mais amplo, envolvendo uma combinação entre o ambiente em que vivemos e tudo a que somos expostos no dia a dia.

Ao todo, foram analisados dados de 161.981 participantes em 40 países, incluindo o Brasil. A pesquisa usou modelos avançados de inteligência artificial e modelagem epidemiológica para análise das "diferenças de idade biocomportamentais (BBAGs)" - termo usado para avaliar a diferença entre a idade real de uma pessoa e a idade prevista com base em sua saúde, cognição, educação, funcionalidade e fatores de risco, como saúde cardiometabólica ou deficiências sensoriais.

A partir disso, foi possível verificar uma relação direta entre o envelhecimento da população e os contextos políticos, sociais, econômicos e ambientais específicos de cada país. "Os resultados mostram de maneira marcante que o local onde vivemos pode nos envelhecer de forma acelerada, aumentando o risco de declínio cognitivo e funcional. Em um país desigual como o Brasil, esses achados são extremamente relevantes para políticas públicas", completa Zimmer.