Futuro da mobilidade: Pará deve assumir as transformações tecnológicas respeitando a sua realidade
Impacto no mercado e na economia pode ser positivo, desde que profissionais se capacitem para demandas em ascensão
Impacto no mercado e na economia pode ser positivo, desde que profissionais se capacitem para demandas em ascensão
O modo como as pessoas se deslocam e utilizam serviços nas cidades tem se transformado a partir do surgimento de tecnologias de mobilidade. Embora opções como transportes públicos elétricos, drones de entrega e carros autônomos ainda não façam parte da rotina de quem vive na Amazônia, já é possível ver a realidade local se adaptando a tendências como carros e motos elétricas e motores híbridos, que, além de tecnológicos, são modelos mais sustentáveis e de acordo com parâmetros de cuidado com o meio ambiente.
VEJA MAIS:
“O setor de mobilidade está mudando muito na área de engenharia elétrica, estamos em um caminho sem volta. Os veículos de combustão vão reduzir muito, e várias montadoras do mundo inteiro já disseram que não vão produzir designs para novos veículos que não sejam elétricos. Então é algo que está vindo para ficar. O Pará teve o início da vinda da mobilidade elétrica mais recentemente. Está um pouco mais devagar em relação a outras localidades, como São Paulo, que já está trocando boa parte da frota de ônibus do dia a dia da população para ônibus elétricos”.
VEJA MAIS:
Na avaliação da especialista da área de engenharia elétrica, Maria Emília Tostes, investir em mobilidade tecnológica é uma ação que os representantes públicos precisam pensar “para ontem”, visto que a vinda dessas inovações para o Estado depende do poder público. A professora diz que cabe ao governo - seja federal, estadual ou municipal - criar políticas públicas eficazes e direcionadas para a implantação da mobilidade elétrica na região.
“Alguns países investiram na total isenção de impostos, o que ajudou a entrarem veículos que são mais caros do que a combustão. Nos países desenvolvidos, os transportes a combustão têm horário de saída e de chegada. Então é muito importante uma figura de Prefeitura e governo. Na nossa região, aqui em Belém, que isso aconteça para ontem, porque está vindo a COP, talvez. Eu acredito que não vai demorar 10 ou 20 anos para acontecer”, pontua.
Para que a transição para um modelo mais tecnológico de mobilidade seja justa e equilibrada, é necessário também debater os impactos dessas inovações na economia e no mercado de trabalho. Economista, Sérgio Melo explica que tecnologias, quando incorporadas às atividades econômicas, auxiliam no aumento da produtividade, pois podem reduzir o tempo e recursos para cada processo. Porém, a depender de onde as tecnologias são geradas, podem resultar em mais ou menos empregos e efeitos positivos.
“No caso do Brasil, a maior parte das tecnologias de ponta que utilizamos são geradas em outros países, que fazem investimentos gigantescos em educação e inovação. Nesses casos, os ganhos tendem a ser maiores para as empresas desses outros países, pois há uma série de profissionais altamente especializados que atuam no desenvolvimento das tecnologias, na produção industrial ou no desenvolvimento e fornecimento de serviços”, avalia.
VEJA MAIS:
Uma grande discussão em torno de novas tecnologias, em qualquer área, é quanto ao desemprego, visto que a maioria dos profissionais teme ser substituído por robôs no futuro ou ver sua ocupação extinta. Mas, Sérgio acredita que, para isso não acontecer, é preciso que haja investimentos em áreas estratégicas, como em tecnologias voltadas às atividades econômicas e que estejam altamente conectadas às formações do ensino fundamental e médio, além do nível superior.
“A evolução tecnológica é algo extremamente difícil de reverter, pois ela surge com o objetivo de resolver problemas das pessoas. Então, os efeitos colaterais gerados precisam ser minimizados pelas políticas que tratam da geração de emprego e renda e, principalmente, pelas políticas industrial e de inovação, conectadas à política educacional”, destaca o economista, que desenvolve pesquisa no doutorado na área de desenvolvimento econômico e inovações tecnológicas com aplicações à economia do Brasil e da Amazônia.
A coordenadora do Ceamazon concorda. Com o surgimento de novas tecnologias, cria-se a busca por novos profissionais qualificados para lidar com essas mudanças. “Uma coisa muito importante com a vinda dessa tecnologia é ter a mão de obra necessária. Como é que vamos usar veículo elétrico se não temos mão de obra para trabalhar no veículo elétrico?”, questiona. Segundo ela, essa capacitação já é pensada na Universidade Federal do Pará (UFPA), onde Maria trabalha, nos cursos de graduação e pós-graduação.
“Temos que parar de ser aquela mão de obra bruta, que extrai, manda para o exterior e depois compra o produto muito mais caro. Temos que verticalizar e formar pessoas para terem um trabalho mais intelectual e menos físico. Quando colocamos as máquinas para fazer trabalhos mais pesados, trazemos qualidade de vida para as pessoas. Mas, se o nosso caminho não avançar em termos de educação e na formação dessas pessoas, vamos continuar perdendo emprego”, comenta.
A mobilidade elétrica é objeto de estudo e experiências do Sistema Inteligente de Mobilidade Elétrica Multimodal (Sima), parceria entre Ceamazon e Norte Energia que iniciou o uso de ônibus elétricos dentro da UFPA - trata-se de um laboratório vivo que pode ser replicado em cidades e organizações que possuam transporte público.
O projeto funciona com um sistema de geração fotovoltaica interligada à rede e de forma isolada, e é possível fazer diversas possibilidades acontecerem, de atendimento aos modais, armazenamento de energia para guardar energia gerada pelo sol e utilizar à noite em baterias, comunicação em ambientes de floresta e mais.
“Estamos envolvendo toda a questão associada à inteligência. Foram desenvolvidos softwares para monitorar o sistema de abastecimento dos carregadores elétricos; monitorar o nosso eletrocentro com armazenamento; monitorar os sistemas fotovoltaicos; integrar todos esses sistemas; e os softwares dos usuários, como alunos, professores e técnicos que queiram usar e podem acompanhar no celular para verificar qual o melhor percurso e a melhor forma de se deslocar de um ponto ao outro”, explica Maria.
Também está em desenvolvimento, junto com o setor de engenharia naval, um barco totalmente elétrico com tecnologia projetada na universidade. “Nós estamos colocando em funcionamento o barco elétrico, que tem painéis complexos em cima para ajudar na autonomia, para que ele funcione o dia inteiro, atendendo à nossa população universitária, inclusive visando os ribeirinhos do outro lado do rio”, enfatiza.
A professora ainda adianta que, depois que a tecnologia for testada, a ideia é dialogar com o governo do Estado e levar essa mobilidade às cidades do Pará. A mobilidade elétrica, de acordo com Tostes, vem junto com outras tendências de comunicação, internet e inteligência, vista que criam necessidades de conexões mais potentes, por exemplo, e, consequentemente, de cidades e edificações inteligentes.