Cursinhos populares democratizam educação e levam conhecimentos a grupos vulneráveis

Iniciativas atendem pessoas que cursaram ensino médio em escola pública ou com bolsa de estudo e que não têm condições para pagar aulas particulares

Elisa Vaz
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Entrar em uma universidade é a meta de muitos estudantes em 2024, e desde o início do ano é preciso começar as preparações para as provas de vestibular. Como nem todos têm oportunidade de estudar em grandes escolas e fazer cursos particulares, diversos grupos e instituições estão organizando aulas gratuitas na Região Metropolitana de Belém, com apoio voluntário de professores, estudantes e da sociedade civil. Em muitos casos, são essas iniciativas as responsáveis pela aprovação de inúmeros calouros.

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Na Universidade Federal do Pará (UFPA), os educadores e os alunos se reúnem para ensinar conteúdos de áreas humanas, exatas e de redação para os vestibulandos. Uma das coordenadoras do Projeto Universidade Aberta (PUA), Ádria Braga conta que o cursinho popular foi criado há mais de duas décadas, em 2002, pelo professor doutor Paulo de Tarso, inicialmente como um curso de física e matemática, que não funcionava todos os dias e nem durante o ano inteiro, mas que se tornou um espaço para os estudantes tirarem suas dúvidas sobre as disciplinas.

“Surgia um aluno ou outro da própria graduação querendo tirar uma dúvida em relação a física, matemática, e ele teve a ideia de criar uma espécie de plantão de dúvidas, não só para atender a comunidade acadêmica, mas também os alunos que estavam estudando para vestibular. E isso foi se expandindo. No ano seguinte ele já fez um processo seletivo, porque a sala do laboratório de ensino ficou pequena para a demanda”, conta.

Critérios

O objetivo, segundo ela, sempre foi atender pessoas em situação de vulnerabilidade social e que não têm condição financeira para pagar um professor particular ou um cursinho, que vêm de escola pública e tiveram uma educação mais precária. Há alguns critérios para participar, além da vulnerabilidade social: o aluno precisa ter cursado os três anos de ensino médio em escola pública ou na escola particular com bolsa de estudos, podendo ser graduado ou estar no último ano.

Sendo um cursinho regular, o PUA funciona de segunda a sexta-feira, de 13h30 às 18h20. A metodologia se baseia, principalmente, nos critérios do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que funciona como uma porta de entrada para a maioria das universidades. A maior dificuldade, na opinião de Ádria, é conciliar os próprios estudos com as atividades do curso. “Tentamos seguir à risca os critérios baseados em competências e habilidades, mas o cursinho é ministrado pelos bolsistas, então somos, além de professores, estudantes, e temos que dividir o tempo entre estudo e docência. Fazemos nosso máximo”, pontua.

Outro requisito é que o número de alunos sempre fique dentro do limite de vagas. Mesmo com mais de duas décadas de atuação, a equipe só tem coleta de dados a partir de 2016. De lá para cá, a média de inscritos fica na casa dos quatro mil por ano, mas só cerca de 100 vagas são ofertadas anualmente. “Começamos com 500 inscritos e esse número foi aumentando muito, por isso fazemos processo seletivo, como está tendo agora. No primeiro ano tivemos 15 aprovações, no segundo 20, subiu para 40 e no ano passado foram 50. A maior conquista é ver que o trabalho valeu a pena e quase 70% dos alunos que começaram e conseguiram ficar até o final alcançaram seu objetivo de entrar na universidade pública”, comemora a coordenadora.

Para este ano, a novidade é monitoria de redação, que não era ofertada. As inscrições ainda estão abertas até o dia 1º de março e devem ser feitas neste site. Após isso, os candidatos devem ir até a UFPA confirmar a inscrição levando dois quilos de alimentos não perecíveis e um documento oficial com foto, e aguardar a data da prova, que pode ser conferida no mesmo endereço das inscrições. Há 120 chances disponíveis.

Democratização

Outra entidade que oferece aulas gratuitas de cursinho é a Rede Emancipa, movimento social de educação popular com 17 anos de atuação e que está presente em mais de 10 estados do Brasil e em três países do continente africano. Em Belém e Ananindeua, o projeto existe há 12 anos e é um programa de extensão do Instituto de Ciências da Educação (Iced), também da UFPA. No total, são 10 cursinhos em parceria com associações de moradores, centros comunitários, igrejas, escolas de samba e grupos culturais nos bairros do Guamá, Vila da Barca, Matinha, Cremação, Pedreira, Bengui, Tapanã e Cidade Nova 6.

De acordo com a coordenação, o público é de jovens e adultos. “Nossa luta é para que a classe trabalhadora acesse o ensino superior gratuito e de qualidade, que a periferia ocupe esse espaço que é deles por direito e que por muitas vezes lhes é negado. A luta pelo direito à educação é história. Muitos jovens sonham com a universidade e não querem apenas terminar o ensino médio. Os cursinhos populares são uma ferramenta política na luta pelo acesso ao ensino superior. Nos cursinhos, praticamos uma pedagogia engajada, pois não buscamos apenas que os estudantes passem no vestibular, mas que estes se tornem sujeitos políticos e lutem com a gente por um mundo mais justo e igualitário”, enfatiza Paula Maíra Cordeiro.

O grupo trabalha com conteúdos que contribuam na formação educacional, social e política dos estudantes, incluindo, além de disciplinas como redação, português, matemática, química e sociologia, rodas de conversas sobre temas como combate ao racismo, direito dos povos tradicionais, democracia, defesa do Sistema Único de Saúde (SUS), a luta das mulheres, dos LGBTQIA+, contra a desigualdade social e mais. A equipe de coordenadores e professores conta com mais de 200 pessoas, de forma voluntária, e são atendidos mais de 500 alunos ao longo do ano. Somente em 2023, foram mais de 70 aprovados, e mais 50 em 2024.

“Quando os estudantes das periferias acessam a universidade, há uma mudança na sua condição financeira e da sua família, na percepção de mundo. Eles passam a acessar espaços que lhes foram negados, transformando a vida de todos ao redor. A oportunidade de ingressar na universidade não só impacta a vida da pessoa que estuda, mas também em toda a sua comunidade, melhorando a condição financeira, a qualificação profissional e abrindo portas para um futuro melhor. É uma transformação que vai além do indivíduo, influenciando a sociedade como um todo”, opina o outro coordenador, Jorge Martins.

A seleção é feita por meio de inscrição online, a partir de um formulário e de uma entrevista presencial. O foco são as pessoas que estudaram em escolas públicas, de baixa renda e moradores das periferias. Anualmente, as inscrições são feitas no início do ano - as de 2024 já foram encerradas, com mais de 2.300 inscritos. Agora, a equipe está na etapa de análises das candidaturas e entrevistas para as aulas, que começam em março, nos três turnos, de segunda a sexta-feira, além de aulas aos sábados.

Confira cursinhos gratuitos:

Rede Emancipa Belém e Ananindeua (emancipabelem.wordpress.com)

Cursinho Esperançar da Universidade do Estado do Pará (UEPA) (@cursinhoesperancar)

Rede de Cursinhos Populares Para Romper Silêncios - Terra Firme, Cabanagem, Barreiro e distrito de Icoaraci (linktr.ee/Redecursinhospopulares)

Cursinho Pré-vestibular Popular Ágora - Icoaraci (@cursinho_agora)

Universidade Aberta, curso pré-vestibular gratuito da Universidade Federal do Pará (petfisicaufpa.wixsite.com/petfisica)

Cursinho Pré-Vestibular do Campus Ananindeua da Universidade Federal do Pará (@preufpaananindeua)

Enem Pará Digital (enempara.net.br)

Projeto Movimento de Educação Popular Inclusiva do Jurunas (@mepijurunas)

Cursinho Popular Marielle Franco - Castanhal (@c.pmarielle)

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