Pesquisadores paraenses reagem a bloqueios de recursos da Capes: ‘cenário preocupante’

Governo Federal determinou o bloqueio de R$ 116 milhões do orçamento do órgão, responsável por  promover a pesquisa no país

Emilly Melo
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O Governo Federal determinou o bloqueio de R$ 116 milhões do orçamento da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), afirma Mercedes Bustamante, presidente da instituição, que é considerada uma das responsáveis por promover a pesquisa no país. Diante do anúncio, pesquisadores paraenses reagiram às restrições e classificaram como “preocupante” o atual cenário da educação brasileira.

Do total contingenciado, R$ 50 milhões foram congelados da Diretoria de Programas e Bolsas (DPB), R$ 36 milhões de programas de formação de professores da educação básica e R$ 30 milhões da Diretoria de Relações Internacionais (DRI).

De acordo com Bustamante, ela foi informada no dia 9 de outubro sobre o corte de R$50 milhões. Ela afirma também que, em agosto, o governo já havia feito um bloqueio de R$ 86 milhões. “O que me preocupa é que o contingenciamento pode ser o primeiro passo para algo mais crítico”, declarou a diretora, durante audiência organizada pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), realizada no último dia 9 deste mês.

Além disso, o Projeto de Lei Orçamentária (PLOA) para o ano de 2024 prevê uma redução de R$ 128 milhões nos investimentos em comparação com os repassados neste ano.

O cenário é preocupante, sobretudo para pesquisadores da Amazônia, avalia Maria Iracilda Sampaio, doutora em Genética, graduada em Medicina Veterinária pela Universidade Federal Rural da Amazônia (Ufra), e atual Pró-Reitora de Pesquisa e Pós-Graduação da Universidade Federal do Pará (UFPA).

“Para as pós-graduações da região amazônica, esse corte de recursos tem um impacto muito maior, porque já há uma desigualdade regional muito grande na distribuição dos recursos para educação”, ressalta Sampaio.

Para a UFPA, considerada a maior da região, a doutora avalia que o bloqueio de verbas deve atrapalhar o prosseguimento de alguns projetos previstos para a Universidade, que são fundamentais para o desenvolvimento do Estado e da Região Norte.

“Haverá um impacto muito grande. A UFPA tem, hoje, 106 programas de pós-graduação credenciados pela Capes, e a maioria deles depende, essencialmente, de recursos de custeio e bolsas da Capes. São cerca de 10 mil estudantes de mestrado e doutorado que precisam muito desses recursos para a continuidade das pesquisas, de novas bolsas”, destaca a pró-reitora.

Atividades comprometidas

Sampaio explica que a UFPA tem trabalhado para expandir as áreas de pesquisas desenvolvidas nos campi e na criação de novos programas de mestrado e doutorado. Entretanto, a escassez de recursos é o maior impedimento nesse processo.

“Nós criamos quatro cursos de mestrado e quatro de doutorado, neste ano, em programas que já existiam, e tínhamos a expectativa de que esses cursos receberiam recursos novos para o ano que vem, e já sabemos que não vão receber. Nenhum curso criado e aprovado pela CAPES em 2023 receberá dinheiro em 2024. Então isso é mais assustador do que a crise que estamos vivendo atualmente, porque este ano recebemos pouco recurso, mas recebemos para os cursos existentes. E para o ano que vem, como é que nós vamos começar cursos novos sem nenhum recurso? É um cenário muito preocupante”, desabafa a pesquisadora.

José Augusto de Araújo, sociólogo, doutor em Sociologia e pesquisador do Programa de pós-graduação em Ciências Ambientais (PPGCA) da Universidade do Estado do Pará (UEPA) classifica os congelamentos de recursos como um atraso para o desenvolvimento científico na região amazônica. Ele ressalta que o percentual de pesquisadores da região representa cerca de 6% do total nacional e, por conta disso, menos investimentos são direcionados para as pesquisas do Norte.

“O corte representa o atraso, a fragmentação do investimento na educação, principalmente da Região Norte, que já se apresenta como uma das regiões de grandes bolsões de pobreza entre as famílias de baixa renda. O Norte ainda permanece como a região de piores indicadores socioeconômico”, afirma Araújo.

A redução das verbas pode implicar no encerramento de pesquisas que buscam melhorar os indicadores socioeconômicos e ambientais da Amazônia. “Todo corte de recursos tem consequências para todas as regiões. Faço parte de um programa de pós-graduação multidisciplinar que atua em diferentes linhas de pesquisa e aborda temas de extrema importância para melhorar a saúde da população amazônica, das comunidades tradicionais e povos originários, a exemplo dos quilombolas e indígenas, um corte dessa envergadura representa muita coisa”, aponta o pesquisador.

José Augusto de Araújo destaca que as bolsas concedidas pela Capes são fundamentais para subsidiar mestrandos e doutorandos, principalmente os que se encontram em situação de desemprego. “São as únicas fontes para subsidiar a moradia, as viagens para a pesquisa de campo, o transporte, a alimentação dos pesquisadores. Estamos em uma época atípica, pós-pandemia, com grandes problemas sociais no país, e neste entendimento, o corte de verbas afeta principalmente o estudante mais vulnerável, sem renda. A pesquisa aponta para a melhoria da qualidade de vida da população Amazônica, que tem sofrido com maior intensidade os impactos”, conclui o doutor.

Manifestação

No último dia 11 de outubro, o Fórum Nacional de Pró-Reitores de Pesquisa e Pós-Graduação (Foprop) divulgou uma carta aberta ao Ministério da Educação (MEC) e aos membros do Sistema Nacional de Pós-Graduação sobre o orçamento da Capes.

O documento expressa o descontentamento e preocupação da entidade frente aos recentes contingenciamentos realizados pelo Governo Federal. O Foprop afirma que as tentativas para estabelecer um diálogo com o Mec para encontrar soluções adequadas ao bom desenvolvimento da educação foram sem sucesso.

“O objetivo do Fórum é juntar esforços com o Ministério para encontrar soluções adequadas ao bom desenvolvimento da educação, da pesquisa e da inovação no país. O orçamento da

Capes é um componente essencial nessa discussão”, aponta a declaração.

Ainda conforme a carta, os bloqueios deste ano comprometem a retomada de atividades importantes, como o Programa Nacional de Pós-Doutorado (PNPD) e o Pró-Equipamentos, e o seguimento das ações planejadas para 2024. “A Agência precisaria de um orçamento de pelo menos R$ 7 bilhões para garantir a execução das ações planejadas e discutidas com a comunidade científica brasileira”, diz a carta.

Em resposta, o Mec, responsável pela execução dos orçamentos da Capes, informou ao G1 que a verba deste ano é de quase R$ 2 bilhões, ou seja, 54,6% mais alta que a de 2022. A pasta declarou também que os bloqueios não são definitivos e que há possibilidade de “recomposição até o final do ano fiscal". Ainda segundo o Ministério, o corte de R$ 50 milhões representa 0,92% da verba discricionária da instituição, sendo não obrigatória e que exclui os salários dos funcionários.

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