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Resgate dos direitos trabalhistas será um dos grandes desafios de Lula, acredita Paulo Rocha

Ao deixar o mandato de senador, ele ainda não sabe se assumirá algum cargo no novo governo, mas garante que continuará a fazer a 'boa política'

Elck Oliveira

Deixando o Senado no final de janeiro, após mandato de oito anos, iniciado em 2014, o petista Paulo Rocha (PT), de 71 anos, diz que sai da Casa com sentimento de “tranquilidade” e de “dever cumprido”. Ainda sem saber que cargo assumirá ou mesmo se assumirá alguma função no novo governo de Luiz Inácio Lula da Silva, um dos seus amigos e companheiros de política mais longevos (ambos ajudaram a fundar o Partido dos Trabalhadores, nos idos de 1980), Paulo Rocha conversou com a reportagem de O Liberal e fez um balanço sobre a sua atuação como parlamentar, os desafios que o novo governo deverá enfrentar e que perspectivas ele enxerga para o Brasil nos próximos quatro anos. 

“Cumpri todos os papéis que um trabalhador simples como eu, pobre e sem grande formação intelectual e científica, não poderia imaginar. Me tornei um dos melhores parlamentares do País, ao mesmo tempo em que fiz repercutir no Parlamento brasileiro os interesses daqueles que eu me propus a representar, como é o caso dos trabalhadores, do povo do Pará, e do meu partido, sem nunca ter me afastado da ética, da boa política e usando a política como instrumento de conquista, de transformação e de mudanças. Então, estou tranquilo”, disse, logo no início da conversa. 

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Paulo Rocha, que foi deputado federal por 20 anos, entre 1991 e 2011 e se elegeu para o Senado em 2014, tendo sido líder do PT por duas vezes, acredita que a vitória do PT nesta última disputa presidencial, com Lula derrotando Jair Bolsonaro (PL), representa não apenas a redenção do partido, que, nos últimos anos, passou por uma série de revezes - como o impeachment da presidente Dilma Rousseff, em 2015, e a própria prisão de Lula, em 2018 - mas também um respiro para o País. 

“Apesar de toda a injustiça e perseguição que tentou acabar com a história do PT, a sensação é de vitória, porque nós vencemos a má política, a manipulação das elites, e estamos voltando a protagonizar a boa política no País, o que é uma vitória muito importante para a democracia e para a geração que acredita na boa política”, defendeu. 

Flexibilização na Lei das Estatais precisa ser exaustivamente debatida

E por falar em boa política, Paulo Rocha voltou a criticar as possíveis mudanças na chamada Lei das Estatais, aprovadas pela Câmara Federal, no início deste mês, e que abririam caminho para a redução drástica da quarentena imposta a políticos que desejam ocupar cargos em empresas públicas federais, o que repercutiu muito negativamente em setores da sociedade. Embora as flexibilizações tenham sido aprovadas pelos deputados, senadores, incluindo Paulo Rocha, conseguiram adiar a votação no Senado.  

“Essa aprovação, sem dúvida, foi fruto de oportunismo da Câmara, que felizmente nós conseguimos segurar no Senado. Precisamos ter um debate mais profundo sobre esse tema, mas creio que não seja o caso agora, pois estamos em um processo de montagem de um novo governo e a minha experiência me diz que as mudanças nas leis precisam ter um tempo de debate político que alie os interesses da sociedade, não pode ser assim, a toque de caixa”, avaliou. Para ele, o projeto precisa incluir também os dirigentes sindicais na redução da quarentena. 

União da classe trabalhadora em torno dos seus próprios interesses

Para Paulo Rocha - que se forjou politicamente no movimento sindical, especialmente o dos gráficos, onde iniciou sua trajetória profissional - uma das maiores contribuições dos seus mandatos, até aqui, para a sociedade, foi justamente a organização e união da classe trabalhadora em torno dos seus próprios interesses. Foi daí que surgiram lutas, por exemplo, em prol da expansão da energia elétrica no interior do Pará, especialmente no âmbito do programa federal Luz para Todos, e de melhores condições para o desenvolvimento da agricultura familiar, que culminou com o surgimento do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar, o Pronaf. 

“Sem dúvida, um dos nossos maiores desafios foi ajudar a unir a classe trabalhadora em torno dos seus próprios interesses, independente de cor, raça, religião. A classe trabalhadora entendeu que precisava se unir, porque vivemos numa sociedade de interesses e assim como os banqueiros se unem para eleger deputados, senador e até presidente, nós também precisamos fazer isso, e eu acho que fui um dos grandes contribuidores para essa causa e foi assim que começamos organizar os sindicatos, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e, depois, fundamos o PT, justamente para serem instrumentos políticos dos nossos interesses e das bandeiras que precisávamos abraçar”, pontuou. 

Para Rocha, uma outra grande vitória do seu trabalho parlamentar foi a aprovação da Lei 9.777/1998, que modifica o Código Penal e tipifica o trabalho escravo como crime. “Foi justamente a minha presença como dirigente sindical no campo, na CUT, que me levou a identificar o uso do trabalho escravo no interior do nosso Estado, do nosso País, então, quando cheguei ao parlamento, apresentei a lei para combater o trabalho escravo e conseguimos aprovar, uma grande vitória realmente para a nossa gente”, destacou. 

Voltar a garantir direitos trabalhistas

Paulo Rocha acredita que um dos maiores desafios do novo governo do Brasil será justamente resgatar direitos e avanços trabalhistas perdidos nos últimos anos, especialmente nos governos Temer e Bolsonaro, como a chamada reforma trabalhista. “O sentimento geral hoje é de que nos últimos anos houve uma precarização do emprego, uma tirada de direitos na marra, por isso, no Senado, nós ainda conseguimos barrar algumas propostas tanto do Temer quanto do Bolsonaro, que queriam aprofundar as mudanças por meio de medidas provisórias, sem discutir, sem ouvir a sociedade. Por isso, algumas coisas, acredito que o Lula precise mesmo revogar. A minha é que se faça uma espécie de Constituinte na questão da modernização das leis do trabalho, um novo código, que substitua a antiga CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) por um novo processo, discutido pelo conjunto dos interessados na relação capital e trabalho”, asseverou. 

Para ele, hoje, é preciso, por exemplo, rever a questão da jornada de trabalho de oito horas para alguns profissionais, quer sejam os entregadores (de comida, de documentos, de delivery em geral), quer sejam os que atuam no chamado home office, pois essas novas categorias não estão abarcadas pelo que hoje se tem na CLT. Precisamos deixar bem claros quais são de fato os direitos desses trabalhadores, que normalmente não têm nenhum vínculo e como eles poderão, por exemplo, se aposentar. Tudo isso deve ser incluído em um código de trabalho moderno, que atenda os interesses da sociedade atual, mas que ao mesmo tempo respeite a vida e a saúde dos trabalhadores”, concluiu. 

 
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