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Edmilson confirma máfia do reboque e diz que Igor virou as costas à população mais carente

Nas suas declarações, o ex-prefeito ainda afirmou que a cidade recebeu investimentos significativos durante sua gestão e que a atual prefeitura tem preferido atender interesses de minorias, em detrimento das regiões mais carentes de Belém.

Gabi Gutierrez

Em entrevista exclusiva ao Grupo Liberal, o ex-prefeito de Belém, Edmilson Rodrigues fez uma avaliação da atual administração municipal, conduzida por Igor Normando. Na conversa, o político criticou o fim do programa Bora Belém, a paralisação do Mercado de São Brás e da Romulo Maiorana, e denunciou o que se chama de “máfia do reboque”. Nas suas declarações, o ex-prefeito ainda afirmou que a cidade recebeu investimentos significativos durante sua gestão e que a atual prefeitura tem preferido atender interesses de minorias, em detrimento das regiões mais carentes de Belém.

“Eu creio que o prefeito achou que ia ser fácil, né? Desdenhou da cidade, dos ganhos que a cidade teve. Valorizou muito os erros, porque a gente acerta e a gente erra. Então, eu com muita humildade, quero dizer ao prefeito, tô disposto a colaborar, porque Belém tem que dar certo”, diz Edmilson.


Leia a entrevista na íntegra:

Como o senhor avalia a transição de gestão e os seis primeiros meses da administração Igor Normando?

Edmilson Rodrigues: Eu respeitei a decisão popular, fiz a transição, coloquei os meus secretários todos para conversar com os secretários do atual prefeito, porque eu torço por Belém. E se o governo for mau, é difícil dizer que a cidade vai bem, né? Então, seis meses de governo e algumas pessoas diriam: ‘É pouco tempo para avaliar’. Eu também acho que é pouco. No entanto, as expectativas criadas pelo atual prefeito nos levam a crer que realmente mudanças importantes em favor da cidade, do povo, viriam, né? Até porque hoje temos muitos recursos que foram garantidos durante o meu mandato.

Eu tive dois anos com Bolsonaro, que no máximo mandava um cotoco para Belém, não mandou um centavo, em plena pandemia. E os dois anos do Lula, nós negociamos, apresentamos projetos e conseguimos coisas maravilhosas. E o que eu estou vendo, infelizmente, é que o prefeito está deixando muito a desejar.

Então, realmente, eu creio que o prefeito achou que ia ser fácil, né? Desdenhou da cidade, dos ganhos que a cidade teve, né? Valorizou muitos erros, porque a gente acerta e a gente erra, né? Então, eu com muita humildade, quero dizer ao prefeito, tô disposto a colaborar, porque Belém tem que dar certo, né?

Como o senhor avaliou e recebeu a notícia do fim de programas sociais como Bora Belém e Restaurante Popular?

Eu poderia te dizer que o fim do Bora Belém, o fim do Restaurante Popular, o fim do programa Belém Saúde Digital. O fim da Fundação Escola Bosque são destruições de políticas muito importantes. Na educação, sou professor há muitos anos e é uma tristeza saber que o Centro de Formação Paulo Freire foi fechado. O centro formava professores da rede municipal. E o que se fez? Contratou-se uma empresa de São Paulo para aplicar um método indiano de formação, sem licitação, num contrato de 1,4 milhão de reais. Isso demonstra a opção por governar para uma minoria rica e abandonar os pobres

Eu acho que esta é uma decisão consciente de governar para uma minoria de ricos e abandonar os pobres. É a forma como eu infelizmente entendo, mesmo torcendo a favor, porque eu não sou mais prefeito. Olha, para ter uma ideia, um RexPa leva 40.000 pessoas para o Mangueirão. Nós não teremos um lugar no Pará que possa reunir todas as pessoas beneficiadas pelo Bora Belém.

Então você tem 80.000 como se fosse dois mangueirões lotados. Essa quantidade de pessoas que agora estão vivendo o desespero da fome novamente. Então, essas crianças vão voltar às ruas? Essas mães desesperadas vão fazer o quê?

Tenho o privilégio de ter sido prefeito por três vezes, eu sou o único da história que teve três mandatos. Então vou torcer para que o prefeito eleito democraticamente faça um bom mandato, porque isso vai ser bom se ele fizer um bom mandato. Não está fazendo.

Então, realmente, eu creio que o prefeito achou que ia ser fácil, né? Desdenhou da cidade, dos ganhos que a cidade teve, né? Valorizou muitos erros, porque a gente acerta e a gente erra, né? Então, eu com muita humildade, quero dizer ao prefeito, tô disposto a colaborar, porque Belém tem que dar certo, né? E nós estamos numa fase boa.

Para muita gente, o direcionamento das verbas da COP30 na capital paraense foi elitizado. Muitos se questionam se não deveriam ser direcionados à regiões mais precárias e necessitadas de saneamento, diferente da Doca, por exemplo. O que o senhor acha disso?

Tenho convicção disso. O dinheiro foi para a Doca, uma região privilegiada que já tinha saneamento. Enquanto isso, a macrodrenagem da bacia do Mata Fome, que atenderia bairros como Tapanã, Pratinha, Parque Verde, está parada, mesmo com recursos garantidos pelo PAC, por exemplo. São mais de R$ 300 milhões que conseguimos, mas a obra não avança. Isso mostra o quanto se escolheu dar prioridade a quem já tinha estrutura.

Os três programas foram destruídos. Para onde foi esse dinheiro? Foi para melhorar a vida de quem? Do pobre da periferia não foi, porque você vê projetos como a macrodrenagem da bacia do Mata Fome, em que eu consegui 60 milhões de dólares. Se você fizer a conversão, U$$ 60 milhões, são mais de 300 milhões de reais. Regiões como Tapanã, Pratinha, Parque Verde, São Clemente seriam diretamente beneficiadas e a obra simplesmente está parada.

Nós tínhamos iniciado 41 obras de drenagem e pavimentação. No São Joaquim, por exemplo, lutei muito junto ao presidente Lula para garantir o financiamento. E conseguimos, por meio da Itaipu Binacional, R$ 150 milhões para a primeira etapa. Mas, quando passo ali perto do aeroporto, pela avenida, infelizmente vejo a obra praticamente parada. E o dinheiro está garantido.

Outras obras como o Mercado de São Brás e a Av. Romulo Maiorana, que iniciaram na sua gestão, também intrigam a população. Na sua visão, por que ainda não foram entregues completamente?

O mercado de São Brás foi reinaugurado, mas está parado. Os feirantes, empreendedores e comerciantes não conseguem trabalhar. O que justifica, às vésperas da COP, os feirantes, os empreendedores, os donos de restaurante — que venceram a licitação — não poderem trabalhar? Eles poderiam estar gerando emprego, recebendo turistas, promovendo atividades culturais. Afinal, aquele é um centro gastronômico, turístico e cultural. E está ali, abandonado. Dinheiro público parado. Outra obra é a Romulo Maiorana, que tivemos entrave por falta de repasses do governo do estado. A prefeitura cumpriu a sua parte, mas sem os recursos, a obra não andava. O convênio era com o estado, ele deixou de repassar e eu tenho que ser honesto. A obra ficou parada por 7 meses, depois, conseguimos um empréstimo do Banco do Brasil e inauguramos a primeira etapa com recursos municipais. O convênio segue assinado, o governador pode liberar os recursos. Seria uma ajuda para o primo. Mas parece-me que o Igor não está tendo muito apoio, né? E não está conseguindo ser articulado ou talvez não tenha muita noção do que é prioridade na cidade, ou não sei se é uma questão de equipe, que ele formou, sem considerar o conhecimento dos problemas da cidade de fato. Enfim, eu não sei bem qual a razão.

Os ônibus elétricos com ar-condicionado foram uma polêmica e inclusive no início do mandato do atual prefeito. Como o senhor recebeu as acusações e os rumores de que os ônibus poderiam estar trancados, proibidos para uso?

Fechamos um acordo entre prefeitura, estado e empresas. Com isso, compramos 300 ônibus com ar-condicionado, acessibilidade, Wi-Fi, novos modelos. Começaram a chegar antes da eleição. A população poderia ver o que é um transporte digno. Mas a verdade é que houve uma articulação para eles não entrarem em circulação. Havia um constrangimento para o atual prefeito, porque ele foi vereador e votou contra o ar-condicionado nos ônibus. Então, se o ônibus com ar-condicionado começasse a circular, seria uma marca muito forte para o antigo prefeito. Agora estão sendo colocados na rua. O prefeito diz que os 300 estariam nas ruas, não sei dizer se estão mesmo circulando, mas foi isso que ele usou como argumento para aumentar em mais de 15% a tarifa de ônibus.

Existe uma "máfia do reboque" em Belém?

houve um período em que foi muito intensa a apreensão de veículos — motos, carros — durante o governo do Zenaldo. Quando assumi, já não havia mais contrato com empresa de guincho. Essa informação é importante: o próprio Zenaldo, antes de encerrar o mandato, suspendeu o contrato com a empresa responsável pelos reboques.

Então, fizemos uma nova licitação. Mas eu orientei a SEMOB a não perseguir quem vive do trabalho. Veja bem: se uma fiscalização flagrasse uma moto roubada, a ordem era clara — levar para o pátio e acionar a polícia. Claro, é um dever legal. Mas o que vemos hoje é outra coisa. A perseguição é contra trabalhadores.

O camarada não conseguiu pagar o IPVA, não fez o licenciamento — não porque não quer, mas porque não tem condição financeira. A moto é dele, não é roubada. Muitas vezes ele está pagando o consórcio, ou financiou a moto, está lutando para manter a família. E a prefeitura vai lá e toma o único bem que ele tem para trabalhar. Isso é crueldade. Isso é perversidade.

Esse tipo de postura só mostra como a atual gestão virou as costas para os pobres. E olha que os próprios taxistas e mototaxistas denunciaram publicamente. Denunciaram inclusive em vídeos. Alguns disseram claramente: "Prefeito, o senhor pagou pra gente acompanhar suas manifestações e gritar seu nome nos atos. Recebemos R$ 100 por passeata. E agora o senhor está perseguindo a gente, prendendo nossas motos?". Isso está na internet, está lá. Eles foram corajosos.

Esse tipo de coisa precisava ser investigada, inclusive como crime eleitoral. Porque qual é a justificativa para tomar uma moto que não está roubada? Se a pessoa está irregular, dê um prazo para ela se regularizar. Agora, tomar o bem dela? Qual o objetivo?

Depois a gente entendeu. Existe um contrato sem licitação com uma empresa de guincho ligada à família de um dos secretários municipais, amigo do prefeito. Isso não tem justificativa. Dispensa de licitação só pode acontecer em caso de emergência, de calamidade. Não é o caso aqui. Isso precisa ser apurado com seriedade.

Como o senhor avalia a questão do lixo em Belém e os contratos relacionados aos aterros e à coleta?

A minha avaliação, com muita honestidade, é que Belém tem todas as condições para virar uma referência nacional. A gente poderia chegar na COP30 e ouvir das pessoas: "Poxa, essa cidade é bem cuidada, é organizada, dá vontade de viver aqui". Mas uma das coisas que mais me desgastou enquanto prefeito foi a crise do lixo. Peguei uma cidade em que as empresas recebiam dinheiro público e não cumpriam sua obrigação. O resultado era lixo acumulado nas esquinas, falhas na coleta e um destino final precário em Marituba.

Isso já vinha desde o primeiro mandato do Zenaldo. No segundo, houve até interferência de instituições. O aterro de Marituba foi implantado sem planejamento e virou um lixão, causando problemas ambientais e de saúde pública graves. Quando assumi, mesmo não sendo prefeito de Marituba, participei de nove audiências com o Judiciário para buscar solução. Dizia nas reuniões: "Doutor, o contrato com a Guamá, que gerencia o aterro, não existe. Não houve licitação. Como vou pagar milhões de reais para uma empresa que não tem contrato?"

Por outro lado, os contratos com as empresas de coleta também já não tinham validade. Tínhamos que mantê-los provisoriamente para a cidade não virar um caos completo. Mesmo assim, o caos se instalava. Então decidi agir: fizemos um estudo técnico detalhado com mais de 1.600 páginas sobre todo o sistema de limpeza urbana de Belém. Esse estudo embasou o edital da nova licitação para contratar uma empresa de limpeza.

A empresa vencedora foi a Ciclus, a maior da América Latina, que também atende a região metropolitana do Rio de Janeiro. Veja, Belém tem 1,3 milhão de habitantes; o Rio tem mais de 8 milhões. Se ela consegue atender cidades dessa magnitude, com Carnaval, com turistas do mundo inteiro, por que não faria um bom trabalho aqui?

Mas a licitação não foi fácil. Algumas empresas queriam manter o sistema precário. Houve resistência, uma verdadeira máfia do lixo. Criaram uma situação de crise para me desgastar. Muita gente que me apoiava passou a me questionar. Era difícil explicar que aquilo era um movimento orquestrado para me atingir. Fui atacado, mas não abri mão da licitação.

Foram 19 ações judiciais e nos tribunais de contas. Vencemos todas. A licitação cumpriu todos os requisitos legais. Quando assinamos o contrato, a população começou a perceber a diferença. Saímos de 600 garis para 3.200. Era "verdinho" em toda esquina. A cidade ficou limpa. A Ciclos trouxe 246 caçambas e máquinas novas e implantou ecopontos, como aquele no caminho do aeroporto, próximo ao São Joaquim. A limpeza virou realidade.

Mas passou a eleição e a cidade voltou a ficar suja. A informação que tenho é que há atrasos de pagamento. Não vou aqui defender A ou B, mas quando os vereadores propuseram a CPI, falei com a Vivi, com a Marinor, do PSOL: "Assinem. A CPI deve investigar a qualidade do serviço. A empresa não está cumprindo? Que explique. Está sem receber? Que se cobre da prefeitura”. O Ministério Público tem que agir.

Belém precisa de uma limpeza urbana com excelência. Uma cidade suja não vai receber o mundo com dignidade. A COP30 está chegando. Eu sofri o desgaste, mas fiz o que era certo: organizei e licitei o sistema de limpeza de Belém.

E quais são os planos para as eleições de 2026?

Estou nessa fase de reorganizar a carreira, com uma relação muito respeitosa com os colegas e com centenas de alunos. Estou cumprindo meu papel.

Muita gente dentro do PSOL, da esquerda, me pergunta se tenho algum projeto político, se vou concorrer nas próximas eleições. Com toda honestidade, ainda não tomei nenhuma decisão. Vou amadurecendo. Não quero comprometer minha profissão — até porque política não é profissão, né?

Outro dia, uma senhora me abraçou e disse: ‘Edmilson, eu critiquei teu mandato, mas não reduzo tua história a uma fase. Não nos abandona’. E eu disse: ‘Jamais vou abandonar’. Hoje sou professor, oriento alunos, dou palestras, apoio movimentos sociais. A gente não precisa ter mandato pra continuar lutando.