Facções criminosas, PCC e CV, disputam espaço no Pará
Na busca por controle da “rota do tráfico”, áreas mais visadas são Altamira, Barcarena, Itaituba, Belém, Cametá, Abaetetuba, Santarém e Marabá. Estudo foi feito pela Uepa, em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública
No Pará, facções criminosas se enfrentam pelo domínio de territórios. A Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social (Segup) atualiza constantemente as estratégias de combate a esses grupos, que são tema de pesquisa da Universidade do Estado do Pará (Uepa). O estudo indica a expansão e a tentativa de estabelecer laços e fidelidade com a população, sobretudo em áreas mais pobres. Essas facções — Primeiro Comando da Capital (PCC) e Comando Vermelho Rogério Lemgruber (CVRL, ou apenas CV) — são originárias do Sudeste e encontraram na Amazônia uma área estratégica de negócios ilícitos.
O CV, de origem no Rio de Janeiro, ganhou maior notoriedade sob a liderança do principal líder da facção no país, Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar. O criminoso foi preso na Colômbia, em 2001. É condenado a penas somadas de 317 anos de prisão e está desde 2006 no Presídio Federal de Porto Velho (RO).
Já o PCC, que tem como base o Estado de São Pualo, tem sua maior liderança Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola. Ele está preso desde 1999, cumpre pena na Penitenciária Federal de Brasília, desde 2019. Mesmo custodiado, ainda é apontado como principal liderança da organização criminosa.
Essas facções, em contato com grupos criminosos menores locais, criaram células que expandiram as áreas de atuação. O CV tem mais células presentes na Região Metropolitana de Belém. Já o PCC se encontra em municípios do interior. Altamira, Barcarena, Itaituba, Belém, Cametá, Abaetetuba, Santarém e Marabá, devido às posições geográficas estratégicas para rotas nacionais e internacionais de negócios ilegais, são as áreas mais disputadas.
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Grupos proíbem brigas de torcidas e roubos
O professor Aiala Colares explica que a aliança do CV com facções locais, que se tornaram células no Pará, se deu dentro das penitenciárias em que este grupo tem forte influência e poder de persuasão por meio da coerção. Há bairros na periferia de Belém em que prevalece o lema “Paz, Justiça e Liberdade”, defendido pelo CV, e há anúncios proibindo assaltos aos moradores. Essas mensagens tentam passar a ideia de proteção por parte dos criminosos. Em 2019 a Polícia Militar começou um trabalho junto às comunidades para apagar esses escritos.
Na Terra Firme, por exemplo, o CV mandou um “salve” proibindo brigas de torcidas organizadas no bairro e ameaçando quem ignorar a ordem. Um dos objetivos desse tipo de ação é se aproximar das comunidades ao impedir crimes que "incomodam mais". Roubos e furtos, por mexerem no patrimônio das pessoas, atraem policiais. O tráfico de drogas é um crime que precisa de "silêncio" e "discrição".
"Desde que colocaram a pichação aqui no muro, isso já vão aí uns quatro anos, eu acho, a gente viu que parece que os assaltos diminuíram muito. A gente já quase não ouve alguém reclamar disso. Antes, a gente vivia com medo de ser assaltado. Os comércios viviam com problemas e rapidinho parou. Parece que assustou. Só que aí a gente sabe que isso aconteceu porque foram bandidos mais poderosos que mandaram. Me diz como a gente não fica com medo disso? Isso não é o que deveria ser normal. Só de falar, mesmo sem me identificar, não sei se estou correndo algum risco", disse o comerciante de uma rua no limite entre os bairros da Pedreira e da Sacramenta, em Belém.
“O maior problema, hoje, eu diria que é compreender melhor a presença do crime organizado no Estado e na região e suas múltiplas relações que não estão relacionadas apenas ao tráfico de drogas”, afirma Aiala. O contrabando de madeira e minérios, o plantio de maconha e o garimpo ilegal também são atividades ilícitas que estão sob o controle de organizações criminosas.
Criminosos mantêm atuação e estrutura de empresas
O pesquisador Aiala Colares diz que principalmente o PCC tem ações chamadas de "crime organizado multidimensional", ou seja, que não estão restritas ao comércio de drogas, inclusive com ligações em países como Colômbia, Peru, Paraguai, Venezuela e Itália. Às vezes, essas facções têm atuação e estrutura de empresas.
Como principais rotas há a região do Amazonas, a partir dos rios Solimões e Amazonas, que se integram a outros rios, inserindo várias cidades como “nós” dessas redes, com destaque para Manaus, que hoje é disputada pelo CV e pela Família do Norte (FDN), atual Cartel do Norte (CDN). A cocaína peruana e o skunk (supermaconha) chegam até o território brasileiro por essa região.
Barcarena, onde está Vila dos Cabanos, a partir do porto de Vila do Conde, aponta Aiala, é o principal ponto de saída de drogas, madeiras extraídas ilegalmente e minérios contrabandeados. Recentemente a operação integrada Hórus apreendeu quase uma tonelada de drogas no porto.
A Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social (Segup) informou que medidas de combate ao tráfico de drogas vêm sendo adotadas, e citou uma apreensão de meia tonelada de cocaína feita em Capanema, no dia 30 de outubro, pela Polícia Militar, além de operações integradas com outros órgãos estaduais e federais.
"As apreensões de 2020 e 2021 bateram recordes históricos de apreensões de drogas no estado, sendo os anos com maiores apreensões que se tem registro", destaca a Segup, em nota. A secretaria também informou que o Pará está localizado em um ponto estratégico onde há fluxo de entorpecentes para outros estados, por isso grandes investimentos estão sendo feitos para massificar a fiscalização em áreas de difícil acesso que facilitam o transporte de drogas.
Fazem parte desses investimentos as bases fluviais integradas. A primeira base integrada flutuante, denominada Antônio Lemos, será instalada em Breves e já está em fase de conclusão. Outra base é a Candiru, que ficará em Óbidos.
"As bases ampliarão a fiscalização dos órgãos públicos na malha fluvial do Pará, especialmente em áreas consideradas estratégicas para a segurança pública, por estarem localizadas nos principais corredores históricos de transporte de drogas, contrabando, pirataria e crimes ambientais", afirma a Segup. A secretaria destaca ainda que “o forte controle” penitenciário e investigações qualificadas feitas pela Polícia Civil têm desarticulado as principais organizações que agem no Estado.