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Uso de máscaras não deve ser relaxado, diz especialista

Paraense especialista em saúde coletiva diz que população evitar negacionismo e manter cuidados nessa terceira fase da pandemia

Dilson Pimentel

A sociedade brasileira ainda vive a terceira fase da pandemia mais devastadora da humanidade. “E, nesse terceiro momento da doença que estamos agora, os números já não são incertos. Os números são bastante claros e ainda realmente preocupantes”, diz a especialista em Saúde Coletiva Senda Charone. “Já sabemos que a quarentena, mesmo mal feita, funciona, e que o isolamento e o distanciamento social também funcionam. E que o uso de máscaras, nesse momento na população, deve ser continuamente incentivado, pois não temos previsão de vacina para frear a transmissão”, afirmou a pesquisadora, que também é Mestre em Crianças Soropositivas, Doutora em Biologia Oral e revisora de artigos científicos internacionais sobre a covid-19.

Segundo ela, esse terceiro momento é chamado de negação da realidade. “Uma vez que a realidade se confirma como séria, observamos movimentos organizados de especialistas com interesses conflitantes e vozes contrárias em diversas regiões do País, que negam os números e dizem que os números não são confiáveis. Observamos o aparecimento de inúmeros sites e comunidades de ceticismo. Também começam a aparecer pessoas que questionam que os números de óbitos pela covid-19 são arbitrários. São movimentos organizados com interesses conflitantes e com o propósito de manter o comércio funcionando e não deixarem as medidas serem tomadas para a prevenção do contágio do vírus e a retomada o quanto antes das nossas atividades”, afirmou.

Primeira fase da pandemia foi de incertezas

No entanto, acrescentou, diversos estudos já estavam orientando medidas públicas desde março, logo no início da pandemia e do aparecimento dos primeiros casos confirmados no Brasil que, se medidas não fossem tomadas, o sistema de saúde entraria em colapso no final de abril, projeção essa que, de fato, se confirmou.  A pesquisadora explicou que a primeira fase da pandemia foi de muitas incertezas. “Não se conhecia o vírus, não se conhecia a doença e mal tinha nome na época da sua descoberta. O que tínhamos eram estimativas de casos que estavam acontecendo na província de Wuhan na China e algumas pessoas viajando pelo exterior. Os primeiros números de estimativas dos casos vieram dessa província e dos números chineses deixando as pessoas um pouco desconfiadas pelo histórico de acobertamento de algumas doenças respiratórias nesse País. Como pesquisadora, afirmo o quanto essa população é testada e muitos vírus novos são descobertos, como, por exemplo, o vírus da SARS e o vírus da MERS, que provoca a Síndrome Respiratória do Oriente Médio, e agora o vírus que provoca a covid-19. Também vale lembrar que a China já passou por três surtos de gripe aviária, um vírus que mata 40% das pessoas, mas que a China conseguiu conter em 2015 e 2016”. 

O segundo momento é quando o vírus é transmitido para outros países e, então, estimativas que contam com números maiores e mais lugares abertos para sabermos o que estava ocorrendo de fato. “À medida que o vírus foi para a Coréia do Sul, à medida que o vírus foi descoberto na Itália e quando o vírus cai no navio Diamond Princess ancorado na costa do Japão e todos os tripulantes foram testados, temos uma melhor visão da pandemia. Quando o vírus começa a circular nesse momento, temos muito mais testes sendo realizados e uma condição muito mais controlada mesmo que involuntariamente no caso do Diamond Princess. Foi então que obtivemos dados mais reais sobre a doença, sua letalidade e transmissão fácil por aerossóis (sistema respiratório). A incerteza que estamos vivendo nesse momento vem do nosso livre arbítrio com relação às medidas que adotamos”, apontou.

A pesquisadora também diz que a pandemia, que colocou à prova sistemas de saúde em todo o planeta, principalmente no Brasil, está nos deixando com diversos questionamentos sobre o negacionismo da doença covid-19. “Porque a negação da doença viabiliza interesses e porque a ciência é tão questionada e massacrada quando interfere na economia de um país. Muitos comparam diferentes respostas de governos diante da pandemia do novo coronavírus e suas ações de enfrentamento. A população busca explicações para compreender porque existem ações, medidas e respostas tão distintas em cada País, Estado, cidade e/ou município”, observa. “O grande foco seria olhar para os países que estavam enfrentando a Pandemia para evitarmos desastres semelhantes no futuro e a resposta foi que o negacionismo da doença comprometeu demasiadamente a resposta do Brasil no enfrentamento da covid-19, bem logo no início dos primeiros e poucos casos confirmados no Brasil, ainda em março”, afirmou a pesquisadora.

No Brasil, várias gerações vivem na mesma casa, afirma pesquisadora

Ainda segundo Senda Charone, a realidade social no País impõe medidas e ações de enfrentamento da covid-19 que pouco condiz com a prevenção da doença na população brasileira. “Para entendermos melhor, em comparação com outros países, no Brasil ainda temos várias gerações de pessoas vivendo na mesma casa, mães, filhos e netos - ou seja, o que estamos observamos são pessoas da mesma família doentes e com sintomas da covid-19”, disse. “Temos transportes públicos sendo necessários para o emprego dos brasileiros que demandam muito mais a sua presença física nos seus empregos, precária distribuição de água potável nas casas para toda a população que seria uma medida bastante eficaz para a covid-19 dentre outras doenças que acometem o Brasil anualmente e, principalmente, as questões financeiras para o seu recolhimento em suas casas. Vale lembrar que as medidas de quarentena, isolamento, distanciamento social, uso de máscaras dentre outras medidas e ações restritivas impostas pelas lideranças políticas, não são arbitrárias e foram bastante eficazes para frear o contágio da covid-19 naquele momento e que devem ser refletidas por longa data até que tenhamos testes em massa para mapeamento dos casos reais na população, medicações e/ou vacinas que barrem ainda mais essa propagação do vírus principalmente nas populações mais vulneráveis”, acrescentou.

Outro problema abordado pela pesquisadora é a interiorização da doença que foi deveras afetada pelo negacionismo da doença. “Nas grandes metrópoles, o problema é visto imediatamente, não quer dizer que no interior aconteça de outra forma. Estamos observando, tanto nos interiores dos Estados Unidos quanto aqui no do Brasil, fábricas, frigoríficos, dentre outras aglomerações, que não forma fechadas por serem consideradas serviços essenciais para a manutenção da vida. Mas que, na falta de uma readequação de medidas para manter o distanciamento entre as pessoas, de adaptar barreiras de proteção, de realizar as medições de temperaturas nas pessoas que entram e saem para trabalhar, essas pessoas estariam contaminando e transmitindo a covid-19 entre os familiares e a população em geral”, afirmou.

Problema é bem mais preocupante no interior

No interior, acrescentou a pesquisadora, o problema é bem mais preocupante devido à infraestrutura precária dos serviços de saúde já fragilizado desde de sua criação, sendo que quando esses locais estiverem necessitando de atendimento hospitalar, as capitais já estarão saturadas com a população que residem nas capitais, colapsando o sistema público de saúde com a população do interior vindo e precisando de atendimento. “Por isso, para o interior do País se faz necessário um investimento na saúde desses locais para que não haja um colapso da capital-interior e vice-versa”.

Outro fator observado sobre a interiorização da doença sugere que pessoas que moravam nas capitais no auge do contágio, foram em direção aos interiores levando ou não a transmissão do vírus para esses locais. “Isso está sendo observado com o aumento do número de casos nos interiores e o colapso nos sistemas de saúde desses locais. Em contrapartida, nas capitais os números de casos estão apontando uma diminuindo ou se estabilizando. O processo de Interiorização da covid-19 no Brasil está super acelerado”, comentou.

 

Pará