Obesidade infantil: Pará tem 50 mil crianças com esse perfil, aponta Sespa

Risco de vida para meninos e meninas provém da falta de alimentação saudável, de exercícios físicos e, em particular, da falta de exemplo de pais ou responsáveis

Eduardo Rocha / Gabriel Pires

Um levantamento da Secretaria de Estado de Saúde Pública do Pará (Sespa) indica que em 2022 foram registradas 22.290 crianças entre 0 e menos de 5 anos e 36.698 entre 5 e 10 anos com obesidade. Já em 2023, até o último levantamento divulgado em 16 de novembro, foram registradas 20.400 crianças entre 0 e menores de 5 anos e 30.251 entre 5 e 10 anos com diagnóstico de obesidade.

Ao serem somados os números das duas faixas etárias em 2022 chega-se ao total e 58.988 casos de obesidade infantil e, em 2023, são 50.651 meninos e meninas com esse perfil. Esses dados revelam a gravidade da situação que atinge várias crianças nos municípios paraenses e, ainda, a urgência de mudança de comportamento com relação a certos hábitos alimentares e à falta de exercícios físicos, por exemplo, com a família tendo um papel decisivo nesse processo de busca pelo bem-estar dos pequeninos.

VEJA MAIS

image Especialista defende incentivo à atividade esportiva nas escolas, foco do Ministério dos Esportes
Aumento de obesidade e sedentarismo infantil são argumentos para criação de uma "identidade esportiva" em crianças.

image Região Norte tem menor índice de obesidade infantil, na faixa de 5 a 10 anos
Em Belém, CREI Orlando Bitar prioriza alimentação saudável para pequeninos

A Sespa informa que para crianças menores de 10 anos o Estado do Pará possui o “Programa Crescer Saudável”, que foi recentemente incorporado ao “Programa Saúde na Escola” (PSE) e a “Estratégia Proteja” em alguns municípios. Os objetivos das ações são promover ambientes escolares saudáveis, promotores de atividade física tanto em âmbito escolar como urbano, ações de educação permanente e campanhas de comunicação na saúde, no intuito de capacitar profissionais, promover vigilância alimentar e nutricional, promover o aleitamento materno e alimentação adequada e saudável, promoção de atividade física e organização do cuidado a criança com sobrepeso e obesidade.

"Como são programas que utilizam como um dos objetivos a articulação intersetorial entre profissionais da área da educação e saúde, nas ações de antropometria quando é confirmado o diagnóstico de obesidade nas crianças, os profissionais da educação podem encaminhar essas crianças para iniciar o acompanhamento ambulatorial multiprofissional nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) de seu município, onde irão iniciar o tratamento e acompanhamento individual dessa criança com diagnóstico de obesidade", como repassa a Secretaria de Saúde.

Atenção em casa

image Uma a cada dez crianças brasileiras de até cinco anos está acima do peso, aponta estudo
Os dados da pesquisa destacam ainda que o excesso de peso pode prejudicar o crescimento e o desenvolvimento infantil

Por isso, a jornalista e profissional de Relações Públicas Cíntia Luna, 36 anos, não abre mão da atenção com as duas filhas no que se refere à alimentação saudável e o que possa contribuir com a saúde das meninas - Laura Luna, de 2 anos de idade, e Louise Luna, de 13 anos. "Procuro seguir o cronograma alimentar das principais refeições, sem exagerar na quantidade e com o número das refeições também. Evito que elas comam alimentos calóricos como pizza, doces e refrigerantes, entre outros", declara Cíntia.

image Cíntia e Laura: educação alimentar em casa, para evitar complicações geradas pela obesidade infantil (Foto: Carmem Helena / O Liberal)

Essa mãe conta que as filhas são conscientes quanto à alimentação saudável. "Elas comem vegetais, sucos, tomam bastante água; desde bebês, eu sempre procurei introduzir alimentos saudáveis na alimentação delas". Laura e Louise costumam tomar vitamina pela manhã e no lanche da tarde, substituindo o café. "Sobre o refringente, procuramos evitar o consumo em nosso dia a dia, só raramente acontece; normalmente, elas preferem tomar suco, por já estarem acostumadas", diz Cíntia.

Na escola

A Laurinha, de 2 anos, faz as principais alimentações na creche onde estuda. A mãe recebe o cardápio semanal da alimentação dela, que é acompanhado por um nutricionista. Já a Louise, de 13 anos, normalmente leva frutas para lanchar e, às vezes, come um misto quente com suco no colégio.

image Iogurtes podem reduzir a obesidade em crianças, diz estudo
Além disso, alimento com probiótico reduz risco de doenças graves no futuro

image Ameaça de sobrepeso em crianças coloca nutricionistas e pais em alerta
Pesquisa feita na capital em 2015 já apontava sobrepeso em mais de 50% das crianças e obesidade em 11%

A mãe delas não deixa por menos a prática de atividades físicas e atenção ao aspecto emocional em prol da saúde das duas meninas. "Minhas duas filhas fazem Funcional Kids. Minha filha mais velha faz terapia com psicólogo", revela.

Exemplo em casa

Cíntia Luna sabe que tem de se cuidar e, assim, dar o exemplo para as filhas. Ela conta que prefere comer verduras e frutas, para equilibrar o peso e ter mais energia. "Sou porta-bandeira da escola de samba "Rancho Não Posso Me Amofiná". Os ensaios começam sempre no segundo semestre do ano, para preparar para o Carnaval e para as apresentações que acontecem durante o ano. Além disso, prático funcional para ter força e equilíbrio e faço drenagem linfática para ajudar com a retenção líquida. Eu me cuidando dou esse exemplo para minhas filhas", completa Cíntia.

Em sintonia

A nutricionista e mestre em Epidemiologia, Danielle Farias, diretora da Associação de Nutricionistas do Pará (Anepa), chama a atenção para o fato de que o primeiro passo para convencer uma criança ou adolescente a consumir alimentos considerados saudáveis é inseri-los na rotina familiar. "Não adianta os pais consumirem uma refeição e a criança consumir algo totalmente diferente. Os pais ficam com embutidos, enlatados, e a criança fica comendo salada. Então, isso vai impedir o consumo de um alimento saudável pelos filhos, por exemplo. Como fazer para estimular esse consumo de alimentos saudáveis pela criança? Faça com que a rotina familiar seja mais saudável, mais balanceada, e faça com que essa criança interaja com os alimentos", assinala.

image Danielle Farias: desafio de incentivar crianças a consumirem alimentos saudáveis pode ser vencido (Foto: Divulgação)

Assim, a criatividade deve entrar em campo. "Que a criança ajude a cortar, a descascar, ela comece a preparar os pratos. Uma boa dica é colocar pratos que ela gosta, que são atrativos para ela, de uma forma que vá também ser mais saudável, como, por exemplo, sanduíches. Em vez de comprar sanduíches, é muito importante fazer em casa; então, fazer uma carne artesanal, pegar opções de pães para que ela possa também provar, sempre colocando alguma opção de salada nesses sanduíches ou mesmo pizza ou panqueca, fazer com que a própria criança ou adolescente tenha contato com o alimento e ele mesmo monte a sua panqueca, a sua pizza", orienta a nutricionista.

image Estudo mostra que adolescentes de faixas carentes estão mais obesos
Trabalho investiga doenças crônicas não transmissíveis entre jovens escolares brasileiros

Interação

A panqueca, por exemplo, pode ser enriquecida com nutrientes, coloridas, colocando talos ou folhas de couve, o que vai fazer com que a clorofila deixe a panqueca verde. Outra iniciativa é colocar pedaços de beterraba, para enriquecer também o alimento e vai fazer com que fique rosada. "São várias as formas de interagir a criança com os alimentos, aí, sim, vai ser muito mais fácil que essa criança queira se alimentar melhor", acrescenta Danielle.

A aprendizagem da criança com a alimentação saudável não deve se restringir à família. "É importante também que as escolas entrem nesse papel, que também sejam exemplo (com as cantinas dispondo de alimentos saudáveis e com nutricionistas na orientação ao público escolar). Então, que as escolas tenham opções de alimento saudável, de lanches, para que possam ser comprados, e é por isso que a gente precisa desenvolver esses hábitos na escola, em casa, e, assim, o ciclo todo dessa criança vai ter essas opções", destaca. Danielle Farias desenvolve nas escolas o Programa de Educação Nutricional e Saúde Alimentar (Pensa - @pensa_saudealimentar), destinados a estudantes, professores, pais de alunos e a coordenação dos estabelecimentos de ensino.

Causa e efeitos

A Organização Mundial da Saúde (OMS), como salienta a nutricionista, já caracteriza a obesidade como uma doença metabólica, como pontua a nutricionista. E essa enfermidade pode ocasionar ou ser fator de risco a outras doenças, como problemas de hipertensão arterial, diabetes, problemas de articulação, problema cárdio-respiratório, além de outros, como, por exemplo, a covid-19 tem na obesidade um fator de risco.

"A obesidade é, sim, um problema de saúde pública, porque hoje, cada vez mais, essas crianças estão ganhando peso muito rápido por causa da superalimentação, da falta de atividades físicas, por causa da alimentação muito mais industrializada. Então, temos de ter muito cuidado nessa prevenção da obesidade infantil", reforça Danielle Farias.

Mais cedo, melhor

Quanto mais cedo se adotar uma alimentação saudável para a criança, melhor para o seu desenvolvimento. É importante que as mães, desde a gestação, já comecem a trabalhar a sua alimentação de forma balanceada, fazendo um bom pré-Natal. Assim que o bebê nasce, é fundamental que seja amamentada exclusivamente até os seis meses de idade, para poder, depois, dar água e outros alimentos complementares, e essa mãe ter orientação, fazer acompanhamento com nutricionista a partir dos seis meses, a fim de fazer a introdução alimentar da criança e a evolução desse processo alimentar. Alimentação saudável não é só tomar suco e comer fruta, mas a pessoa acessar aos nutrientes necessários ao funcionamento do corpo (carboidratos, proteínas e lipídeos, vitaminas e sais minerais) além de fibras.

As fibras auxiliam o combate à obesidade, porque contribuem com a digestão e absorção mais lenta de alimentos carboidratos. Essa absorção mais lenta mantém a saciedade da pessoa por mais tempo e faz com que os nutrientes cheguem mais lentamente ao organismo, evitando picos de glicose que podem levar ao diabetes e o excesso de carboidratos no organismo. As fibras são encontradas em verduras e nas cascas das frutas, em frutas e cereais integrais, como aveia, e alimentos integrais, como arroz e pães integrais, além de leguminosas, como feijões e ervilhas.

Na Alepa

O deputado estadual Carlos Bordalo (PT-PA) apresentou, em junho, na Assembleia Legislativa do Estado do Pará (Alepa) projeto de lei (atualmente, em tramitação na Casa) orientando que estabelecimentos que vendem alimentos ultraprocessados devem afixar cartazes informativos sobre as consequências do consumo desses produtos em locais visíveis, sendo obrigatório ao menos um cartaz próximo a cada caixa de pagamento.

Essa proposição do parlamentar registra alguns alimentos como considerados ultraprocessados, como biscoitos, doces, salgados e salgadinhos de pacote; sorvetes industrializados; balas e guloseimas em geral; cereais açucarados para o desjejum matinal e barras de cereais industrializadas, entre outros que estão sujeitos às normas propostas pelo PL em relação à sua exposição no comércio varejista.

O projeto ainda estabelece que empresas privadas sediadas no Estado devam implementar Salas de Apoio à Amamentação (SAA) em suas instalações. Esse projeto aguarda votação na Comissão de Constituição e Justiça da Alepa.

Caso as orientações não sejam cumpridas, serão aplicadas as seguintes medidas: notificação para regularização no prazo de dez dias, advertência e em se tratando de escola particular, estabelecimentos comerciais e empresariais privados será aplicado multa de mil e quinhentos reais, podendo ser dobrada em caso reincidência.

Sob risco

O deputado Bordalo argumenta que, de acordo com o relatório público do Sistema Nacional de Vigilância Alimentar e Nutricional, baseado em dados de pessoas acompanhadas na Atenção Primária à Saúde, foi constatado que até meados de setembro de 2022, mais de 340 mil crianças entre 5 e 10 anos de idade receberam o diagnóstico de obesidade.

Como pontua Bordalo, a obesidade infantil afeta cerca de 3,1 milhões de crianças com menos de 10 anos no Brasil. De acordo com o Sistema Único de Saúde (SUS), do Ministério da Saúde, a doença atinge 13,2% das crianças entre 5 e 9 anos acompanhadas. Esse problema de saúde pode acarretar consequências graves ao longo da vida. Entre as crianças nessa faixa etária, 28% apresentam excesso de peso, o que é um alerta para o risco de obesidade tanto na infância quanto no futuro.

No caso das crianças menores de 5 anos, o índice de sobrepeso é de 14,8%, sendo que 7% já são consideradas obesas. Esses dados, referentes ao ano de 2019, foram obtidos a partir do Índice de Massa Corporal (IMC) de crianças atendidas na Atenção Primária à Saúde (APS).

Entre no nosso grupo de notícias no WhatsApp e Telegram 📱
Pará
.
Ícone cancelar

Desculpe pela interrupção. Detectamos que você possui um bloqueador de anúncios ativo!

Oferecemos notícia e informação de graça, mas produzir conteúdo de qualidade não é.

Os anúncios são uma forma de garantir a receita do portal e o pagamento dos profissionais envolvidos.

Por favor, desative ou remova o bloqueador de anúncios do seu navegador para continuar sua navegação sem interrupções. Obrigado!

RELACIONADAS EM PARÁ

MAIS LIDAS EM PARÁ