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Há três anos, morria primeira vítima de covid-19 no Brasil; paraenses recordam momentos da pandemia

O Dia Nacional em Homenagem às Vítimas da Covid-19, celebrado em 12 de março, faz alusão data da primeira morte pela doença no Brasil

Fabyo Cruz e Gabriel Pires

O dia 12 de março, como aprovou o Congresso Nacional, é dedicado à lembrança das vítimas da covid-19 no Brasil. A data é cinco dias antes do início oficial da pandemia no Pará. Até as 17h59, do dia 9 de março de 2023, o Estado registrou 873.283 casos confirmados, 830.363 recuperados e 19.029 mortes, segundo dados extraídos do monitoramento da Secretaria de Estado da Saúde do Pará (Sespa). De acordo com o vacinômetro, com última atualização em 20 de janeiro deste ano, 17.003.700 doses de vacinas foram aplicadas em todo território paraense.

A data foi escolhida em alusão à primeira morte pela doença no país, a vítima foi uma paciente de 57 anos, que estava internada no Hospital Municipal Doutor Carmino Cariccio, na Zona Leste de São Paulo. De lá para cá, foram várias reviravoltas, algumas delas foram o isolamento e distanciamento social, lockdown, uso de máscaras, crise na saúde pública brasileira, rotação de ministros, ataques a profissionais de saúde, perdas de pessoas queridas entre anônimos e celebridades, ‘kit covid’ e os pseudos tratamentos contra enfermidade, e a vacinação da população.

O Brasil registrou, até o dia 10 de março de 2023, às 10h54, de acordo com dados extraídos pelo monitoramento do Ministério da Saúde, 37.085.520 casos confirmados da doença e 699.310 mortes. Segundo apontou o vacinômetro, com última atualização em 09 de março de 2023, às 00h11, o País aplicou 508.480.879 doses de vacinas. O registro contou com dados contidos na Rede Nacional de Dados em Saúde (RNDS), até as 18h06, do dia 8 de março deste ano. 

Sequelas 


   
Eliezer Barboza, de 25 anos, belenense, acadêmico de medicina, faz parte dos mais de 800 mil paraenses recuperados de covid-19. Apesar dos cuidados, o estudante contraiu o vírus em 2021. Ao descobrir a doença, ele começou o tratamento em casa. No entanto, o caso se agravou. “A doença se espalhou rapidamente ao ponto de ter ficado com 90% dos pulmões comprometidos, quando dei entrada para ser internado. Acredito que foram 25 dias [no hospital], sendo que a maior parte foi no CTI. O medo sempre estava presente, tinha muito medo de morrer. Eu só queria sair de lá”, relembrou Eliezer.

“Consigo lembrar de vários momentos significativos, com vários sentimentos. Desde a minha mãe lutando para ficar ao meu lado todos os dias, até o momento da minha alta. Se eu tivesse que escolher um momento marcante daquele período seria quando eu saí da intubação. Minhas primeiras palavras foram para o meu pai, dizendo que eu queria casar com minha esposa, na época namorada”, afirmou o jovem, que teve a doença pela segunda vez em 2022, porém de forma leve.

A vida de quem se recupera do coronavírus fica marcada para sempre, como revela Eliezer. Os sentimentos transitam entre felicidade, esperança e, até mesmo, a dificuldade em lidar com as emoções depois de todo o susto. O jovem conta que lidar com a doença foi assustador e relata que ficou traumatizado por um longo período. O trauma vivido se manifestou por meio de crises de ansiedade, segundo ele conta.

“Por muito tempo apresentei transtorno de estresse pós-traumático e terror noturno. Além das sequelas psicológicas, havia sequelas pulmonares. Tive que fazer fisioterapia para meus pulmões se expandirem novamente. Tive sequelas neurológicas, esquecia o nome de objetos constantemente e perdi a sensibilidade no polegar do pé esquerdo, que permanece até os dias de hoje. E tive que reaprender a andar e recuperar a força no corpo devido ao longo tempo que fiquei intubado no CTI”, contou o jovem.

Passada a fase mais difícil, hoje, Eliezer celebra a vida e fala com entusiasmo o que tem vivido após o processo de recuperação. “Felizmente, a maior parte dos meus planos já se realizaram ou estão bem próximos disso. Me casei, tive minha filha, Ellie, e agora o objetivo é terminar a faculdade”. “A vida é muito curta, viva o hoje porque o amanhã é muito incerto”, declarou Eliezer emocionado.

 

Primeira vacinação no Pará

A técnica de enfermagem Shirley Maia, 41 anos, foi a primeira pessoa a receber a vacina contra a covid-19 no Pará, no dia 19 de janeiro de 2021, em Belém. A profissional de saúde atuou no antigo Hospital de Campanha do Hangar. “Hoje, eu posso dizer que é só gratidão mesmo a Deus, como eu disse lá no início, no primeiro dia que eu tomei a vacina, porque quando entrei ali no Hangar, a gente não tinha noção do que estava acontecendo. Quando surgiu a vacina, o sentimento foi de alívio, de que um dia tudo isso ia acabar, e eu creio que não acabou ainda, o vírus continua, né? Mas amenizou aquela sensação de tristeza, porque perdemos muitos pacientes, mas também conseguimos resgatar muitos que foram para as suas casas”, afirmou.

No dia da vacinação, Shirley conta que não sabia que seria a primeira profissional de saúde a ser vacinada, porém estava muito ansiosa pela aplicação do imunizante. "Saí cedo de casa porque eu queria entrar na fila, já havia dito para o meu marido, sabia que todos ali também queriam ter essa oportunidade de tomar a vacina, e foi escolhida lá mesmo para receber a primeira dose do Pará”, comentou. Atualmente, a técnica de enfermagem já tomou a quarta dose do imunizante, agora ela aguarda pela bivalente, e incentiva para que outras pessoas não deixem de tomar a vacina: “Sabemos que a doença não acabou, aliás, ela ainda existe por causa das pessoas que se recusam a serem vacinadas, que são poucas. Não deixem de tomar a vacina de vocês porque só a vacina salva vidas”.  

 

Profissionais de saúde

A batalha contra o coronavírus teve um protagonismo importante dos profissionais de saúde, que atuaram na linha de frente para combater o vírus. O médico infectologista, Alessandre Guimarães, de Belém, conta a história de como foi incansável contra a doença, mesmo após ter contraído o vírus em fevereiro de 2021. No enfrentamento à pandemia, o médico lembra da rotina de trabalho no Hospital Ophir Loyola, na capital, que atendia casos de pacientes oncológicos.

“Não estávamos preparados e nenhum país do mundo estava. Lidar com a doença era desafiador, triste, mas isso me enriquecia. Não é possível transpor, rapidamente, o quão desafiador era para mim, especialmente nestes enfermos mais vulneráveis. Cada vida perdida era como se fosse um parente meu. Alguém que eu amava. E peço a Deus cuidar bem de todos eles”, contou Alessandre.

O médico conta que, mesmo tendo atuado na linha de frente desde os primeiros dias da pandemia, alguns momentos tiveram maior peso emocional. “Em um dia tinha pessoas invadindo o consultório em busca de atendimento. Uma paciente caiu, desmaiou com falta de ar. Eu a carreguei, coloquei na cadeira, saí correndo atrás do maqueiro para obter uma maca de transporte. Mas o maqueiro me disse ‘doutor, todas as macas estão ocupadas com corpos’. Tive que carregar a enferma para a unidade de atendimento de casos graves. Nessa hora, a gente não pensa em si, no risco, só quer salvar vidas”, relatou. 

A luta dos profissionais de saúde também contou com o protagonismo feminino, como o da médica infectologista Helena Brígido, de Belém. Ela conta que, inicialmente prestou assistência em unidades públicas e privadas, preparando as profissionais da saúde com para a chegada dos primeiros casos, em 2020. A profissional também atendeu pacientes internados e com aqueles que não estavam nos hospitais. Com as experiências vividas, Helena enfatiza que se sente uma profissional ainda mais fortalecida.

“Presenciei situações em que casais idosos internavam e ficavam em sala separadas, pessoas recebendo notícias de óbitos de familiares e sem conseguir chegar perto para abraçar ou pegar na mão, pela possibilidade de se infectar. A cada dia novos sentimentos de tristeza, alegria pelo retorno de algum paciente para casa, ter que acalmar famílias ao noticiar o óbito de alguém. De tantas situações, saio mais fortalecida, porque contribuímos com o bem-estar das pessoas”, detalhou Helena, que teve covid-19 por duas vezes.

Diante de todas as experiências vividas, a médica frisa que as lembranças desse momento da história ficarão marcadas por toda a vida. “Foram dois anos, principalmente em 2020, de muita tensão, expectativas de, a qualquer momento, ter notícias de óbitos de colegas da equipe, parentes, amigos, desconhecidos. Foi um período em que extrapolamos os nossos limites e que, se pudéssemos voltar no tempo, todos nós, profissionais de saúde, queríamos ter feito mais por cada um que atendemos para não haver piora do quadro ou óbito”, finalizou a médica.

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