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Brasil lidera ranking de cirurgias plásticas no mundo

A cada ano, são realizados no país 1,5 milhão de procedimentos desse tipo, segundo dados do relatório da Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica

Camila Guimarães

O Brasil já ocupa o primeiro lugar no ranking dos países que mais realizam cirurgias plásticas no mundo, com 1,5 milhão de procedimentos do tipo a cada ano, segundo relatório da Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica (ISAPS). No Pará, a presidência regional da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) afirma que a demanda por procedimentos estéticos no corpo e na face tem seguido essa tendência.

Apesar de não haver um controle quantitativo desses tipos de cirurgias realizadas no estado, o presidente regional da SBCP, o cirurgião plástico Cleyton Higashi Sawada, garante que essa a procura tem aumentado: “Há uma série de fatores, como as redes sociais, o aumento de exposição da imagem das pessoas, que podem estar por trás disso. Acho também que, passados os piores momentos da pandemia, quando caiu muito o movimento da cirurgia, agora temos uma demanda reprimida, de pessoas que esperaram um tempo para fazer nesse momento”.

Cleyton afirma que, entre os procedimentos mais procurados, em Belém, estão a rinoplastia, ou plástica de nariz, a cirurgia de pálpebras e de face, “especialmente falando desses pacientes que vêm influenciados dessas mídias sociais", pondera o cirurgião. “No Pará, a gente opera mama e abdômen, em muitos casos, ligados a problemas de saúde, como sobrepeso e obesidade, por exemplo”.

Dados da SBCP mostram que a lipoaspiração é o procedimento mais popular no país, representando 15,5% do total das cirurgias realizadas. A segunda e terceira cirurgia mais realizada é o implante de silicone e a abdominoplastia, respectivamente.

Um dado nacional que reflete a realidade percebida pelo presidente regional da SBCP é o fato de que as mulheres ainda são maioria entre o público que procura pelos procedimentos estéticos cirúrgicos. Para elas, o implante de silicone é a cirurgia mais desejada, já para os homens, a intervenção de maior interesse é a ginecomastia – cirurgia estética que reduz o excedente da mama masculina.

“Apesar de, hoje em dia, ter muitos pacientes do sexo masculino que são tão vaidosos quanto as mulheres, o público ainda é majoritariamente feminino”, garante Cleyton Sawada. “A gente sabe que as mulheres tendem a ser mais vaidosas que os homens, então acho que o motivo é esse”.

Também no quesito idade, os dados femininos se destacam: toxina botulínica, rinoplastia e implante de silicone são os três procedimentos mais desejados por mulheres de 18 anos ou menos no Brasil. Já o procedimento mais realizado entre mulheres de 19 a 34 é mesmo o implante de silicone. “As pacientes do sexo feminino são cada vez mais jovens”, pondera o cirurgião. “Tem muita adolescente que já tem o sonho de fazer algum procedimento”.

 

Advogada diz que a cirurgia sempre foi um sonho

Para a advogada Heloise Barros, de 27 anos, a cirurgia plástica de aumento de mama, conhecida por mamoplastia de aumento, sempre foi um sonho, desde a adolescência. Ela diz que a vontade de ter seios maiores começou por volta dos 15 anos: “É a idade que geralmente as meninas começam a se desenvolver, a namorar e eu não tinha um corpo bacana, era muito magrinha. Aí fui crescendo e só foi aumentando a vontade de fazer a cirurgia”.

Ela diz que, assim que começou a trabalhar, a cirurgia entrou nos seus planos de forma mais concreta e seu orçamento passou a reservar uma quantia específica para realizar o sonho estético: “Eu juntei dinheiro por um ano e meio a dois anos. Eu tive que rever meus gastos para conseguir fazer isso. Parei de gastar o tanto que eu gastava com outras coisas para poder conseguir juntar”, conta.

Quando estava perto de realizar o procedimento, o sonho foi momentaneamente interrompido pela pandemia de covid-19. Mas, agora, Heloise descreve como se sente tendo conseguido passar pela cirurgia, com saúde: “Eu ainda estou no pós operatório, vou tirar os pontos, então, está um pouco inchado, mas até agora eu estou adorando. Me sinto muito mais bonita e confiante. A autoestima lá em cima”.

 

O outro lado da beleza segundo pesquisadoras

A doutora e mestre em Antropologia, Camille Castelo Branco, que pesquisa sobre feminismos, corporalidades políticas e violência, explica que o aumento de cirurgias plásticas e intervenções estéticas não é um fenômeno ingênuo e desconectado de uma série de problemáticas sociais, como o racismo, por exemplo - discussão que precisaria ultrapassar os limites do ambiente acadêmico para atingir dimensão de um debate estrutural. Ela comenta questionamentos que estão por trás de procedimentos comuns:

“Quando se fala de harmonização facial, por exemplo, essa harmonia seria a construção de um rosto que evoca a branquitude como padrão: um nariz mais afilado, um queixo muito projetado para frente, uma mandíbula muito demarcada e lábios muito cheios. E o rosto que não está encaixado nesse padrão seria ‘desarmônico’”.

Camille também diz que a pandemia acentuou o descontentamento das pessoas com relação à própria aparência, pelo fato de as relações, durante dois anos, terem passado a ser mediadas, principalmente, por telas: “O que não se considera é que a nossa imagem nesses dispositivos não é uma imagem realista. E aí a gente percebe um agravamento desse descontentamento e, não por acaso, a gente vê o filtro do Instagram e do Tiktok se tornar uma realidade quase definitiva”.

A pesquisadora também acende um alerta importante para as mulheres: o fato de o mundo da beleza parecer tão pertinente ao público feminino não é mera coincidência. “As mulheres são o público preferencial das cirurgias plásticas e das intervenções estéticas, no geral, e as teorias feministas dão algumas respostas do porquê disso. Um livro canônico para pensar a beleza, nesse caso, é ‘O Mito da Beleza’, da autora americana Naomi Wolf, que vai dizer que é interessante, do ponto de vista da organização social, que as mulheres estejam tão descontentes com a própria aparência, porque, uma vez que elas estarão continuamente gastando o capital que possam adquirir em intervenções, seja com maquiagem, tratamentos ou cirurgias, isso as impede de juntar dinheiro e ascender em termos aquisitivos”.

Além disso, Camille também explica que, segundo a pesquisa, cercar as mulheres com inseguranças em torno da própria imagem também tira delas a confiança e a energia necessárias que poderiam ser empregadas na mobilização e mudança social da condição feminina dentro de uma sociedade desigual: “É um sedativo político. Não é por acaso que, o que se cobra das mulheres, em termos de padrões estéticos, toca na esteira do impossível, para que as mulheres permaneçam em contínuo descontentamento”.

Camille também garante que o incentivo da busca feminina por um padrão de beleza sempre vai ser um estímulo desleal: “O padrão de beleza cobra um corpo sem pelo, sem flacidez, sem estrias, sem celulite, sem cabelos brancos, sem nenhum sinal de que o tempo está passando para as mulheres - o que é uma absoluta impossibilidade. Então é evidente que elas vão estar em contínuo descontentamento e isso não vai ser resolvido, porque o tempo não vai parar de passar”. Por isso, a pesquisadora diz que é importante abrir o debate e incentivar o questionamento dessa estrutura que cria padrões estéticos e gera insatisfação em torno do próprio corpo e rosto.

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