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Sem médicos e no meio de uma briga política, Magalhães Barata sofre com a pandemia

Falta de profissionais e embate entre prefeito e vice fazem moradores padecerem sem assistência no município do nordeste paraense

Cleide Magalhães

Como encarar e atravessar a pandemia do novo coronavírus sem médico permanente na cidade para atender a população? É o que vivem os 8.298 habitantes de Magalhães Barata, no nordeste do Pará. Moradores e servidores da área da saúde denunciam que apenas um médico é encarregado do atendimento na cidade - e em dois dias da semana. Nos demais um único enfermeiro atende e prescreve aos pacientes.
 
Outra reclamação dos moradores é que, na sede da cidade, existem somente três ambulâncias e dois espaços de atendimento à saúde na cidade - um posto do Programa Saúde da Família (PSF) e uma Unidade Básica de Saúde (UBS). Em todos não há separação de pessoas que estão com outras doenças das que apresentam casos suspeitos e confirmados à covid-19.  
 
"Na sede do município existem um posto do PSF e uma UBS. Tem outro prédio da Estratégia Saúde da Família (ESF) deixado pronto pelo prefeito anterior, mas o atual prefeito resolveu fazer reforma e só promete que vai entregar. Mas os pacientes com diversas doenças são todos misturados nesses espaços e nas três ambulâncias. A farmácia do PSF e da UBS funcionam para dispensação da medicação somente duas horas por dia. Lá ninguém sabe, ninguém viu a pessoa responsável pela farmácia, e isso prejudica muito a população", afirma uma moradora, que preferiu manter o anonimato. 
 
Mais um empecilho é a falta dos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs). "Nós, profissionais de saúde, não temos EPIs", reclama uma servidora na área da saúde pública, que, temendo represálias, preferiu não se identificar. Ela afirma que há servidores temporários com salários atrasados há pelo menos três meses.
 
Recursos da Câmara Federal 
 
Outro questionamento que servidores e moradores fazem é quanto à aplicação dos R$ 859 mil que o município teria recebido por meio do Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, projeto da Câmara Federal aprovado também pelo Senado Federal, publicado recentemente. "A questão é que a gente não consegue entender sobre os recursos encaminhados para o município. Quando os recursos chegaram, haveria uma sessão, via videoconferência, na Câmara Municipal, mas a Câmara se fechou. Esperamos providências para todos esses problemas e que os recursos públicos sejam bem aplicados, para ajudar a salvar a vida da população e não vá parar nos bolsos de alguns gestores", finaliza a servidora pública na área da saúde.
 
Contraditório
 
A reportagem contactou com o prefeito, Gerson Miranda Lopes (MDB) para prestar esclarecimentos. Ele pediu para procurar pela assessoria dele. Em nota, esta disse que "são inverdades os relatos de moradores e servidores. Eles têm cunho totalmente político e de desespero da oposição, principalmente da vice-prefeita, que busca juntamente com outros dois vereadores de todas as formas ocupar o lugar do prefeito, que estava doente, mas já está recuperado".
 
A vice-prefeita , Yara Bomfim (PL), afirma que "não procede a  informação de que eu (ela) esteja tentando ocupar o lugar do prefeito". Ainda segundo ela, o fato é que "ele foi internado enquanto o município precisava de direção e não tinha". A vice-prefeita afirma também que a população levantou a necessidade de haver transferência de cargo, além de um vereador requerer que se cumprisse a Lei Orgânica.
 
"A verdade é que se o povo estivesse assistido, ninguém levantaria a necessidade do prefeito ser substituído. A verdade é que só o povo sabe o que sente de verdade e a denúncia partiu deles", diz Bomfim.
 
 
 
Subnotificação 
 
Outra problemática que os servidores de saúde realçam que ocorre em Magalhães Barata é a subnotificação dos casos, uma vez que não há testes para a doença no município e ainda há pessoas que têm a doença, mas não buscam os espaços de saúde ou até desistem do atendimento.
 
Além disso, há discrepâncias nos dados da Secretaria de Estado de Saúde (Sespa) e da Prefeitura, publicados no site oficial da Prefeitura. Até 18h36 desta quinta (28), os dados da Sespa trazem que há 51 casos confirmados e 4 mortes. No último boletim, no site da Prefeitura, até 18h de segunda (25), constam 50 casos confirmados, 4 mortes, 10 descartados, 79 suspeitos, 57 recuperados e 136 notificados. 
 
MPF e MPPA acompanham o caso  
 
Muitas dessas denúncias foram parar no Ministério Público Federal (MPF) e Ministério Público do Estado do Pará (MPPA). O MPF emitiu documento à Prefeitura de Magalhães Barata, no último dia 11. O prazo para resposta ao MPF ficou para esta terça (26). 
 
No documento, o MPF informa que consultou a página do Fundo Nacional da Saúde e verificou que o Governo Federal já repassou ao município quase R$ 1 milhão (valor exato - R$ 957.295,82), do qual R$ 134.951,15 seriam destinas para o combate ao novo coronavírus. O MPF quer saber qual a atual situação da estrutura da saúde local para o enfrentamento da pandemia e qual a aplicação dos recursos repassados especificamente com esse objetivo. Para o MPPA, Magalhães Barata é um dos municípios que não apresentam transparência com os gastos.
 
A Lei Federal nº 13.979/2020 dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do novo coronavírus. E, ainda segundo o MPPA, o caso de Magalhães Barata vem sendo acompanhado pelo órgão.  O MPPA realiza um mapeamento da transparência das prefeituras sobre contratações emergenciais. "Somente na primeira rodada de fiscalização foram identificados ao menos R$12.518.987,82 de contratos emergenciais não publicados em portal específico", destaca o MPPA.
 
Segundo a Promotoria de Justiça de Magalhães Barata, quando tomou conhecimento de que Magalhães Barata receberia tais repasses e expediu Recomendação ao prefeito, secretários e Câmara de Vereadores, "para que adotem as providências no sentido de garantir a transparência do emprego dessas verbas. A prefeitura enviou resposta, informando que atenderia a recomendação e que está envidando esforços no sentido de cumprir.