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Pessoas idosas convivem com violências. Parentes são os maiores agressores

Em cinco meses de 2019, 3.863 ocorrências de violências contra a pessoa idosa no Pará

Eduardo Rocha

Semelhante ao que ocorre com muitas crianças e adolescentes, pessoas idosas costumam sofrer violências dentro mesmo de suas casas, além das verificadas em outros locais. Neste tempo de pandemia, quando é preferível cidadãos, em particular os do grupo de risco, como os idosos, permaneçam em casa, a situação fica ainda mais complicada.

A Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Pará (Segup) informa que foram registradas no ano de 2019, de janeiro a maio, 3.863 ocorrências de violências contra a pessoa idosa no Estado. Em 2020, no mesmo período, foram registrados 516 casos. Entre os principais casos registrados esse ano estão: furto, roubo, lesão no trânsito e lesão corporal.

Familiares

A  promotora de Justiça Elaine Castelo Branco, titular da 3ª Promotoria de Justiça de Defesa da Pessoa com Deficiência e do Idoso e Acidentes do Trabalho (PJDIAT) do Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), conhece de perto essa realidade da violência contra pessoas idosas, sobretudo, nas casas em que residem.

“Nos casos de violência intrafamiliar, mais de 70 % dos casos os agressores são os filhos dos idosos. Em seguida vêm netos, cônjuges, sobrinhos, irmãos e  outros parentes. O fato é que 96 % dos agressores é algum familiar direto do idoso, apenas 4 por cento é vizinho, amigo, cuidador, ou alguém de fora da família”, revela a promotora.

Este mês funciona como o “Junho Violeta”: órgãos públicos, organismos e instituições intensificam serviços de conscientização da opinião pública sobre os direitos dos idosos. Em Belém, o Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa Idosa definiu uma programação online nesse sentido. E, assim, entre outras ações, nesta segunda-feira (15), Dia Mundial de Conscientização da Violência Contra a Pessoa Idosa, será apresentado um vídeo institucional mostrando como identificar e denunciar crimes contra os idosos.

Denúncias

Ela conta que o MPPA recebe denúncias de diversas  formas de violência, tais como violência institucional que envolve principalmente questões de saúde, como falta de leitos hospitalares, de exames médicos, de medicamentos, de consultas com especialista marcada para vários meses, não atendimento por falta de acompanhantes ou documentos. “Tem caso de  violência estrutural que envolve  os aspectos resultantes da desigualdade social,  e a discriminação que se expressa de múltiplas formas.  E tem também muitas denúncias de violência intrafamiliar, em que o idoso é vítima de mau tratos, negligência,  falta de cuidados,  desrespeito, perturbação,  abandono, desvio de proventos e outras”.

Quando detalha aspectos da fiscalização do MPPA sobre denúncias relacionada a pessoas idosas, a promotora informa: “Nas três PJDIAT foram abertas em 2019, 1.330 Notícias de fatos contendo denúncias de várias formas de violências, dos quais 33% ou 450 casos tratava de denúncia de violência intrafamiliar,  os outros 67% mais da metade são denúncias da área da saúde e o restante de questões diversas na área civil”.

Nos casos de violência intrafamiliar, “predominam as denúncias de uso indevido dos recursos financeiros dos idosos, violências psicológicas diversas (conflitos familiares, desrespeito, agressão verbal, chantagem e outras) e abandono por parte de alguns filhos (são casos de idosos dependentes, com muitos filhos, mas só um cuida e por isso tem surgido com muita frequência solicitação de divisão de responsabilidade com todos os filhos)”.

O MPPA integra uma rede de órgãos, organismos, instituições e entidades focadas na defesa dos direitos dos idosos, ou seja, a dignidade, o bem estar e o direito à vida.

Como ressalta a promotora Elaine Castelo Branco, “esta defesa é dirigida por três temas definidos no Estatuto do Idoso: a defesa do idoso na âmbito coletivo, tais como a cobrança de políticas públicas em prol do idoso, a demarcação de vagas reservadas a idosos; a defesa do idoso em casos individuais quando houver situação de risco, ocasião em que se toma diversas medidas de proteção, conforme a situação ou avalição da equipe técnica; a defesa dos idosos institucionalizados, que ocorre através da fiscalização trimestral ou sempre que necessário das instituições de acolhimento à pessoa idosa”.

O desrespeito à integridade dos idosos pode ser denunciado pelo Disque 100 ou por meio eletrônico do MPPA.

“É necessário estar sempre atento, principalmente com os idosos com algum grau de dependência física ou com demência. São eles as maiores vítimas de violência intrafamiliar. E violência não é apenas  violência física, essa inclusive é que menos ocorre, sendo mais frequente a negligência (que é não prover adequadamente os cuidados que o idoso necessita), a violência psicológica e os desvios de proventos. Se observar qualquer indício de que algo não está bem com o idoso, denuncie! Procure ajuda!”, arremata Elaine Castelo Branco.

Sensibilidade

Com 15 anos de atuação, a Pastoral da Pessoa Idosa da Arquidiocese de Belém atende 3.370 pessoas na RMB por mês. “Na pandemia, as visitas domiciliares a pessoas de 60 anos e até centenárias estão sendo por telefone e por recados na Rádio Nazaré FM, sempre orientando quanto à saúde, espiritualidade e nutrição, entre outros aspectos”, destaca Criseida Pereira, 62 anos, coordenadora da Pastoral.

Entre os 700 agentes voluntários da Pastoral está a professora aposentada Girlene Souza, 68 anos, que também é assistida pelo próprio grupo. “Nessa atividade da Pastoral, eu procuro repassar mais ainda às pessoas idosas o carinho e atenção que recebo do grupo da Arquidiocese”, destaca. Para Girlene, “o que a pessoa idosa mais sente falta é de companhia”.

 Atenção

A  terapeuta ocupacional da Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos (SEJUDH), Milenne Afonso representa o órgão no Conselho Estadual. A Secretaria atua por meio da Gerência de Proteção ao Idoso. “A melhor maneira de atingir o respeito aos direitos da pessoa idosa é a informação; desta forma é importante conscientizar a sociedade sobre os direitos da pessoa idosa e falar também sobre as diversas formas de violência que os atinge”.

A SEJUDH recebe denúncias via Disque 100, Ouvidoria do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. “E a negligência é um dos tipos mais recorrentes de denúncia seguido da violência psicológica. São violências que não deixam marcas físicas, por isso muitas vezes não sabemos qual a situação  real que aquele idoso passa; daí a necessidade de denunciar”, diz a terapeuta. Ela nota ser contumaz em Belém o desrespeito ao idoso no transporte público.

Na pandemia, é estrutural a prevenção à doença com relação à pessoa idosa. “A baixa imunidade, associada a doenças crônicas, torna os idosos mais vulneráveis ao vírus e às complicações decorrentes dele”, assinala Milenne. As famílias podem ajudar idosos que moram só adquirindo alimentos e bens de primeira necessidade, para que as pessoas idosas não tenham de sair à rua. A Frente Norte de Fortalecimento a Instituições de Longa Permanência para Idoso (ILPI) atua na divulgação de ações de combate à covid-19.

A SEJUDH tem o projeto “Eu vou envelhecer. E você?” que visa fomentar ações para conscientizar e sensibilizar para o respeito ao idoso. “Segundo o IBGE, estamos em trajetória de envelhecimento da população paraense. O Instituto ressalta que hoje temos 764 mil idosos e que em 2060 seremos 2,7 milhões de idosos, o que significa que 1 em cada 4 paraenses será idoso em 2060”, completa Milenne.