O Brasil que a COP30 precisa enxergar
A COP30 não é apenas a COP na Amazônia, mas a primeira dentro da floresta. Isso carrega um simbolismo poderoso. Pela primeira vez, os debates sobre o futuro acontecem onde a natureza pulsa. O desafio é dar voz às populações que ali vivem, compreender seus modos de vida e descobrir como podem trilhar o caminho do desenvolvimento.
Como amazônida, filha de seringueiro, nascida no Acre e a última de 15 irmãos, sei o que significa viver da floresta, com a floresta, e o quanto as comunidades tradicionais dependem dela para sobreviver. Mas o desafio da sustentabilidade é enorme e precisa de investimentos. Afinal, o desenvolvimento sustentável tem custo alto.
O Brasil se tornou potência no agronegócio não apenas pela fertilidade de suas terras, mas por décadas de investimento público que impulsionaram o setor. Da mesma forma, a sustentabilidade na floresta precisa ser sustentada, porque mantê-la em pé exige pesquisa e desenvolvimento e, claro, a participação ativa do setor industrial.
A indústria, aliás, não é vilã quando se fala em aquecimento global. Pelo contrário: é dela que surgem grandes transformações. O processo de descarbonização começa no chão de fábrica. Na Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), mostramos que é possível alinhar desenvolvimento sustentável com inovação, tecnologia e geração de emprego.
Em Belém, apresentamos exemplos vindos da própria Amazônia. Um deles é o mapeamento da bioindústria da região, que já identificou mais de 11 mil empreendimentos que transformam produtos da floresta em desenvolvimento local. Estamos identificando onde estão esses negócios, quantas famílias vivem deles, o que é extraído e quais são seus potenciais e gargalos. Com isso, poderemos medir o quanto essas cadeias geram de renda e contribuir para políticas públicas mais eficazes.
Ainda há desafios a superar, é claro: infraestrutura, acesso a mercados, investimentos e regulamentações adequadas. Hoje, por exemplo, utilizamos menos de 20% do fruto do açaí — o restante é descartado. Com os investimentos certos, poderemos desenvolver tecnologias que aproveitem esse resíduo, transformando-o em novos produtos e oportunidades para a população.
Nosso pavilhão na COP apresentará ao mundo um café produzido no extremo ocidente da Amazônia brasileira por uma cooperativa de agricultores familiares que utilizam energia solar e cultivam áreas antes degradadas. Com apoio da ABDI, o Complexo Industrial do Café do Juruá agrega valor ao produto local e é um exemplo de que, quando unimos inovação e investimentos públicos, criamos oportunidades reais, fortalecendo toda uma cadeia.
Outro destaque é o Recircula Brasil, reconhecido pela ONU como a única plataforma capaz de rastrear todo o ciclo do plástico — da origem ao retorno à indústria. Por meio de notas fiscais eletrônicas, a plataforma já certificou cerca de 50 mil toneladas de plástico. Agora, expandiremos essa experiência para outros materiais, como alumínio, vidro, tecidos e papel, mostrando que é possível praticar a economia circular “do berço ao berço”.
Esses são exemplos do esforço brasileiro para tornar a indústria mais sustentável. A COP30 acontece em uma Amazônia feita de gente: de mulheres e homens que cultivam, de comunidades que preservam, de povos que carregam saber ancestral sobre o uso equilibrado dos recursos naturais. Essas vozes amazônidas querem - e merecem - estar no centro das decisões, construindo caminhos para um desenvolvimento que não exclui, mas inclui.
Perpétua Almeida
Diretora de Economia Sustentável e Industrialização da ABDI