Arrastão do Boi Faceiro dá o tom da folia em São Caetano de Odivelas
Criado em 1937, festejo é um dos mais tradicionais do Carnaval do nordeste paraense
Considerado um dos mais bonitos do carnaval paraense, o arrastão do Boi Faceiro ganhou as ruas do município de São Caetano de Odivelas, distante 100 quilômetros de Belém, na tarde desta terça-feira (5).
É o mais tradicional arrastão de boi de máscaras do Carnaval do município, localizado no nordeste paraense. No Carnaval, ele se apresenta desde 2006, com o objetivo de fomentar a participação dos bois de máscaras no Carnaval local - e, desse modo, dar uma singularidade à folia em São Caetano de Odivelas.
Este ano, seus integrantes levaram para as ruas uma mensagem sobre “fake news”. Um alerta aos usuários de redes sociais quanto à veracidade das notícias vinculadas na grande rede e os riscos de seu compartilhamento e reprodução, disse Rondi Palha, coordenador do Boi Faceiro.
Segundo ele, o arrastão se propõe a misturar elementos e personagens da cultura popular dos bois de máscaras, como os ‘pirrôs’ mascarados (também chamados de palhaços) e os cabeçudos, com a irreverência e a democracia do movimento do Carnaval.
“A inserção do boi no Carnaval foi uma proposta de dar uma singularidade. Estava muito homogêneo em relação às músicas baianas, ao abadá. A gente percebeu que o boi tinha elementos artísticos e culturais para introduzir no Carnaval. E fazer uma Carnaval com cara própria”, afirmou.
Ele destacou que é uma manifestação popular. “É movido pelo povo mesmo. A população determina a dinâmica do boi, quando ele fica mais bonito ou fica mais fraco”, completou.
FANTASIADOS
Durante o arrastão, as personagens dos bois interagem com foliões vestidos com as mais variadas fantasias e a trilha sonora fica por conta de uma bandinha carnavalesca composta por músicos locais que tocam frevo, marchinhas de carnaval, além de sambas e marchas de boi que são músicas compostas especificamente para a manifestação.
O Boi de Máscaras de São Caetano é o único do Brasil conduzido por duas pessoas, explicou Rondi. É que o boi pesa 80 quilos. São duas pessoas que o conduzem também para dar a ideia de ser um animal de verdade, com quatro patas. No total, seis pessoas carregam o boi, revezando-se. São três duplas.
A concentração para o arrastão do Boi Faceiro começou depois das 16 horas. Como sempre ocorre, a saída foi da travessa Antônio Baltazar Monteiro, no centro da cidade, em frente à casa de Mestre Bené, falecido em 2001 e de quem Rondi é neto. A casa é um ponto de visitação e onde são guardados os materiais do Boi Faceiro.
A estimativa é que duas mil pessoas participem do arrastão, que, iniciado às 17h46, percorre um percurso de 3,5 quilômetros, geralmente feito em uma hora e meia.
BRINCADEIRA
Rondi também explicou as principais características do Boi de Máscara. O boi é o centro da brincadeira. A figura do boi não tem adornos, e tenta lembrar o animal de verdade. O único adereço é uma fita vermelha e amarela no pescoço, que são as cores do município, disse. Tem “Os Cabeçudos”, uma das figuras mais engraçadas da folia. É o cabeçudo do boi de máscaras de São Caetano. Há o Pirrô, com sua roupa multicolorida, com capacete feito de tala e ornado com flores e fitilhos coloridos e a máscara de nariz pontiagudo, que remete ao Carnaval veneziano.
Há, ainda, os “buchudos”. Eles não têm um padrão. Basta seguir a irreverência de quem se veste - pode ser um político, um demônio, uma bruxa, um fantasma. Mas o buchudo tem que estar mascarado. É bem irreverente mesmo. E tem como base a criatividade da pessoa que o está vestindo, explicou.
SAMBA DE BOI
Em relação à sonoridade, existem dois ritmos que conduzem o Boi de Máscaras pelas ruas da cidade: o samba de boi, um ritmo mais cadenciado, que lembra um pouquinho o carimbó, e a marcha de boi, que lembra o frevo. E a orquestra que conduz o boi é formada por instrumentos de sopro e corda.
David Santos, 19 anos, sai há quatro anos no Boi Faceiro. Ele usa a fantasia de “Pirú”, como o jovem chama o “pirrô mascarado”. “Acho mais interessante pra dançar. É a mais divertida”, afirmou.
Maxwell Costa tem 17 anos e há cinco sai de Cabeçudo. “Depois do boi, é o que mais chama a atenção”, disse. Mas admitiu que a fantasia é quente e desconfortável. Mesmo assim, não a troca por outra.
Wellington Renan Martins, 16, sai há cinco anos na perna do boi - na parte da frente. “É divertido”, disse.
Mas o jovem afirmou que a fantasia é pesada. E que é preciso ter habilidade. Dois saem conduzindo cada boi. Para se orientar, Wellington olha pelo buraco da fanstasia. Quando eles se cansarem, outra dupla os substitui.
CABEÇUDOS
Cauã Gabriel sai de Cabeçudo há três anos. “Eu gosto por causa da animação”, disse ele, de 11 anos. Cauã disse que, apesar dos movimentos repetitivos, não fica tonto. “Já estou acostumado “, afirmou. À medida que passava pelas ruas, o Boi Faceiro animava os moradores - crianças, jovens e adultos. E, ao final do desfile, vai haver concurso de fantasias, cuja programação ocorre na orla da cidade.
Rondi Palha explicou que o Boi Faceiro foi o grupo pioneiro na proposta dos arrastões dos bois. Atualmente, mais três grupos de bois de máscaras realizam arrastões durante o carnaval, são o Boi Faceiro Junior, com o Arrastão Infantil, no sábado; o Boi Tinga e a Vaca Louca, com o arrastão no domingo. O Boi Faceiro encerra os arrastões na terça-feira.
Recentemente, o Boi Faceiro participou da gravação do novo single de dona
Onete, o clipe Festa do Tubarão.
Fundada em 1937 pelos senhores Epaminondas de Sousa Chagas (Seu Palmira), naquele momento forte comerciante na cidade, e confeccionado por Candido Zeferino (Seu Dido), o Boi Faceiro foi uma das principais atrações culturais de São Caetano de Odivelas, no período entre 1937 e 1947.
Quando o grupo desapareceu, em virtude da mudança de endereço de ser eu Palmira para Belém, a capital do Estado. Isso aconteceu em virtude das muitas brigas que ocorriam entre os brincantes do Boi Tinga e do Boi Faceiro, na época.
CLUBES
No imaginário popular da cultura de São Caetano de Odivelas, o “Boi Faceiro” fora criado na fictícia Fazenda “São João”, localizada nos campos encantados de Odivelas, às margens do rio Mojuim, e habitadas por “buchudos”, “pierrôs”, “cabeçudos”, vigiada por valentes vaqueiros e admirada por lindas donzelas. A fazenda São João é a própria cidade de São Caetano de Odivelas.
Rondi Palha diz que o bom desempenho do “Faceiro” o tornou uma das maiores expressões culturais do município. Estimulados por preferências esportivas, pescadores ligados ao Marítimo Esporte Clube Odivelense fundaram o boi Tinga, haja vista que o “Faceiro” havia sido criado por “Seu Palmira”, então presidente do Progresso Esporte Clube e naturalmente teve sua imagem ligada ao Progresso Esporte Clube.
Os clubes Marítimo e Progresso eram terminantemente rivais nos campos de futebol.
O resgate do “Boi Faceiro” ocorreu em 5 de junho de 1998, através do Grupo Art da Terra, liderados por Rondi palha, Eudis Aquino e Pedro Edson dos Santos e incentivados por Benedito Cardoso de Aquino (Mestre Bené). Após um ano de articulação e preparativos, realizou-se o sonho de Mestre Bené de reviver o “Boi Faceiro”.
O “boi” foi confeccionado pelo Sr. Antonio dos Reis Viégas (Mestre Dorrêis), o maior artífice na confecção dos bichos em São Caetano. Autor das músicas que embalaram o retorno do “Boi Faceiro” ao cenário cultural, o saudoso pescador e compositor Benedito Cardoso de Aquino, mais conhecido como “Mestre Bené”, foi o maior incentivador e responsável pelo resgate do “Boi Faceiro” e tornou-se, também, exemplo de vida e luta em favor dos “bois de máscaras”.
Em sua retomada aos imaginários campos da cultura odivelense, o grupo já participou de vários eventos e festivais na capital e no interior do Estado, além de reportagens e documentários para a imprensa local e nacional. O grupo participou, ainda, das filmagens, em 2006, do filme de longa-metragem “Sol do Meio Dia”, da diretora Lili Caffé.
FOLCLORE
O “Boi Faceiro” vem sendo tema para folcloristas, estudiosos e universitários que buscam, “in loco”, conhecer a trajetória do grupo. Trajetória esta considerada, pelo jornalista Acyr Castro, como o “Exemplo das lutas folclóricas no Estado...”, por ser uma história tão peculiar de desaparecimento e ressurgimento depois de meio século.
Em 2006, o Boi Faceiro foi o grupo pioneiro na participação no Carnaval de São Caetano de Odivelas com o propósito de alavancar o carnaval local através da introdução dos elementos da manifestação dos bois de máscaras na folia de Momo. Iniciativa essa que tornou o Carnaval odivelense um dos mais peculiares do Estado do Pará.
O Boi Faceiro já se apresentou em grandes eventos como Proje to Paixão do Boi, Arraial da Alegria de Belém, Arraial de Todos os Santos, Bienal de Música de Belém, Seresta do Carmo, Projeto Puxirum, no Projeto Bumbarqueira, Fórum Social Mundial 2009, nas Feiras “Pará de Cores as Cores e Todas as Raças” no shopping Doca Boulevar e “Made in Pará Made in Brazil” na Estação das Docas, Projeto “Música Para Todos” na Praça da República.
E em Abaetetuba, Acará, Ananindeua, Augusto Corrêa, Benevides, Bragança, Bujaru, Capanema, Castanhal,Curuçá, Inhangapi, Icoaraci, Marapanim, Maracanã, Marituba, Santa Izabel do Pará, São Miguel do Guamá, Terra Alta, Vigia, Outeiro.
O Boi Faceiro, hoje, é considerado como um projeto cultural que serve de parâmetro e exemplo para os outros grupos de bois de São Caetano, por seu modelo de organização e o trabalho de preservação realizado em parceria com o grupo mirim Faceiro Jr, que é uma versão voltada para o público infantil, a fim de conscientizar nossas crianças quanto a manifestação dos bois de máscaras, afirmou Rondi Palha.
Em 2017, o Boi Faceiro cumpriu sua “safra” junina nas ruas de São Caetano de Odivelas e realizará sua ‘fugida’ no dia 28 de julho. Importante ressaltar que, na manifestação dos bois de máscaras, o ‘boi’ foge no fim da ‘safra’, e fica escondido no encantado odivelense, para retornar, somente, no ano seguinte e, assim, voltar ao centro da cena pelas ruas da Cidade. Essa característica é sagrada no universo imaginário dos bois de máscaras.
A ‘fugida’ é tão importante quanto o seu retorno para o centro da cena. Com uma estrutura que envolve seus integrantes de forma direta, é uma das mais importantes representatividades da cultura popular dos “Bois de máscaras” de São Caetano de Odivelas. Hoje, o grupo tem como coordenador Rondi Palha e conta na sua estrutura com 15 músicos, duas costureiras e cinco artesãos e cinco coordenadores além da participação direta e indireta de 80 de jovens e adolescentes da comunidade odivelense.
O BOI DE SÃO CAETANO
- Cor do boi: Marrom café;
- Cores da fita: amarelo e vermelho (alusivas ao músico);
- Cores emblemáticas do grupo: Preto, amarelo, vermelho e branco;
- Apelido da Orquestra: Orquestra Show;
- Apelidos: boi de fama; boi de valor; boi chocolate; chifre de ouro; boi brincador; ‘marronzin’.
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