MENU

BUSCA

A Amazônia e o que esperar da COP 30

Gilmar Pereira da Silva

A realização da 30ª Conferência das Partes das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 30), em Belém, representa um divisor de águas para o Brasil e para o mundo. Pela primeira vez, o debate climático mundial se instala no coração da Amazônia. O palco das discussões sobre o futuro do planeta deixa de ser uma ideia distante e se torna o território vivo de um povo que reivindica o direito de falar por si.

Essa proximidade impõe um compromisso essencial, pois a COP 30 não pode repetir o erro histórico de falar sobre a Amazônia sem escutar a Amazônia.

A região é, ao mesmo tempo, o desafio e a esperança do século XXI. O maior bioma tropical do planeta não pode ser reduzido a estatísticas de carbono ou a um estoque de biodiversidade à disposição de interesses externos. Para os povos originários, comunidades ribeirinhas, quilombolas, extrativistas e populações urbanas, a Amazônia é memória, identidade e horizonte. Mas é também um espaço de decisões fundamentais para não seguirmos por um caminho de exploração predatória e desigual, já que é necessário consolidar um modelo de desenvolvimento inovador, sustentável e inclusivo, capaz de unir floresta em pé, prosperidade e justiça social.

Nenhuma solução duradoura para a crise climática será possível sem o protagonismo das populações amazônicas. Essa é a condição indispensável para que a COP 30 tenha impacto real. Projetos impostos de fora para dentro, que ignoram as realidades locais, apenas reproduzem desigualdades e ferem direitos fundamentais. É urgente que o mundo reconheça que a Amazônia não é um vazio geográfico, mas um território habitado, diverso e portador de conhecimentos milenares que dialogam com a ciência contemporânea e apontam caminhos para novas formas de convivência entre humanidade e natureza.

Mais que um bioma, a Amazônia é peça-chave na estabilidade climática global. Mas o legado da COP 30 não pode se encerrar no evento em si. É preciso que dele surjam compromissos concretos, como investimentos consistentes, políticas de cooperação e fortalecimento das instituições locais de pesquisa e inovação.

Nesse contexto, a ciência feita na Amazônia precisa ser reconhecida como voz ativa e instância decisória. Como reitor da Universidade Federal do Pará, a maior instituição pública de ensino superior da região, reafirmo a importância de “cantar as coisas do mundo a partir da nossa aldeia”. Ou seja, precisamos falar com a nossa própria voz às demais partes do planeta. 

A UFPA não ocupa um papel periférico. Ela é estruturante. Com presença em todas as mesorregiões do Pará, mais de 50 mil estudantes e centenas de grupos de pesquisa, a universidade tem levado ensino e ciência de qualidade a jovens que antes estavam à margem dessa oportunidade. Essa nossa iniciativa é, em si, um projeto de desenvolvimento regional, já que forma lideranças, movimenta economias locais e estimula o pensamento crítico sobre os desafios da Amazônia.

Nosso trabalho abrange desde a bioeconomia da floresta em pé até o uso de tecnologias emergentes, como a Inteligência Artificial, passando também pela valorização da nossa cultura. E a produção científica amazônica é inovadora e estratégica para o planeta. Investir nela é investir no futuro climático global. A UFPA acredita que ciência sem compromisso social é incompleta e, por isso, nossos laboratórios e projetos dialogam com as realidades das comunidades da floresta, dos rios e das cidades.

A COP 30 será vitoriosa se for capaz de inverter a lógica tradicional e permitir que o mundo aprenda com a Amazônia. A floresta não é apenas um espaço a ser protegido, é um sujeito coletivo de conhecimento, cultura e futuro. Reconhecer isso significa investir nas pessoas que a mantêm viva e nas instituições, como a UFPA, que transformam essa riqueza em ciência, inovação e políticas públicas.

Que esta conferência global em Belém seja, de fato, um marco de escuta, respeito e compromisso. Até porque a Amazônia não quer ser tema. Ela quer ser voz.

 

Gilmar Pereira da Silva é professor, doutor em Educação e reitor da Universidade Federal do Pará