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2021 já teve mais casos de racismo do que no ano passado

E em apenas quatro meses, quase 25%

Caio Oliveira

Em 3 de julho de 1951, 70 anos atrás, o Congresso Nacional aprovou a primeira lei contra o racismo no Brasil, estabelecendo como contravenção penal qualquer prática de preconceito por cor ou etnia. Com o passar dos anos, muitas outras medidas foram elaboradas na tentativa de combater a discriminação racial no país. Para os movimentos sociais, mesmo décadas depois dessa primeira legislação, ainda há um longo caminho a ser percorrido. De acordo com a Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (Segup), de janeiro a dezembro de 2020, o Pará registrou 5 casos de racismo. Em 2021, apenas de janeiro a abril, foram 6 casos em todo Estado. Os números se tornam mais relevantes ainda quando se observa que o Pará é o estado brasileiro com o maior número de pessoas que se autodeclaram pretas ou pardas no Brasil: 76,7%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Diferente do racismo, que é quando o crime atinge a integralidade de uma raça, os casos considerados como injúria racial pela Justiça são caracterizados quando uma ofensa é direcionada a um indivíduo em específico, e são bem mais comuns. De janeiro a dezembro de 2020, em todo o Pará, foram 232 ocorrências e em 2021, de janeiro a abril, foram 62 ocorrências. Neste 3 de julho, data instituída como Dia Nacional de Combate à Discriminação Racial, ativistas explicam que os números não significam que o Estado esteja tendo mais casos de discriminação racial do que nos anos anteriores, pois a segregação sempre fez parte da vida dos paraenses não-brancos.

“Os casos de racismo não aumentaram, necessariamente. As denúncias de racismo aumentaram, analisando 2021 e 2020, e têm aumentado nos últimos anos”, explica Paulo Victor Squires, ativista e advogado, que atribui o aumento dos registros a uma atenção maior do poder público. “Os casos de racismo acontecem diariamente, mas antes não se tinha um aparato estatal para que nós pudéssemos fazer uma denúncia: não se tinha um disque-denúncia, uma delegacia especializada, e hoje nós já temos. É a estrutura ideal? Não, ainda precisamos melhorar muito. Desde o procedimento policial até o sistema de Justiça, o Estado precisa melhorar sua estrutura, sua análise e seu entendimento a respeito da questão racial. Mas, o que tem melhorado aos poucos, já tem ajudado a dar segurança para que o cidadão negro e negra realize procedimentos de denúncia”, analisa.

Os crimes do tipo são analisados pela Delegacia de Combate a Crimes Discriminatórios e Homofóbicos (DCCDH). A delegada Leilane Reis, responsável pela unidade, reforça que há vários meios de levar ao conhecimento das autoridades os casos de racismo e injúria racial. “Basta a palavra da vítima para nós averiguarmos se há algum indício de crime. Então, a pessoa que se sentir ofendida tem de fazer a denúncia, em qualquer delegacia de bairro. Mas, se ela preferir, pode fazer a denúncia na delegacia especializada”, explica. A DCCDH fica na Rua Avertano Rocha, 417, Cidade Velha, em Belém. A Polícia Civil informa ainda que as notificações também podem ser feitas pelo Disque Denúncia 181, ou por meio de mensagem pelo WhatsApp 91 98115-91881. O sigilo e anonimato são garantidos.

Ainda segundo a delegada Leilane, a Polícia do Pará vem se especializando cada vez mais para estar preparada para atender as denúncias que chegam ao seu conhecimento. “Eu acredito que hoje, com a modernidade, e com novos concursos públicos, temos outro tipo de pessoa na Polícia do Pará, que segue se modernizando. A DCCDH é vinculada à Diretoria de Atendimento a Grupos Vulneráveis (DAV), na qual você percebe que há esse preparo diferenciado, pois a própria cultura das pessoas está mudando bastante”, explica a policial, que explica a importância de denunciar esses casos. “Mais do que qualquer penalidade, isso tem a ver com a mudança da cultura, com o respeito e com a importância de lidar com as diferenças”, ressalta.

Tanto a delegada quanto o advogado concordam que a pandemia contribuiu negativamente nos registros, gerando alto número de subnotificação. Agora, mais do que denunciar os casos de racismo e outros crimes relacionados, é importante que sejam elaboradas medidas que combatam o preconceito na estrutura da sociedade, formando cidadãos mais conscientes para evitar que os episódios de discriminação ocorram. “Há a necessidade urgente da implementação de políticas relacionadas à questão racial. Até a efetivação de uma política educacional, como a da lei 10.639, que é a lei da introdução do estudo afrobrasileiro nas escolas, que existe desde 2003, mas o Estado precisa implementar efetivamente essa política, para que possa haver um conhecimento e um  debate muito maior nas escolas. Todas essas políticas públicas precisam não ser apenas discutidas, mas implementadas. Sair do discurso, do conceito, e serem efetivadas, pois isso vai ajudar muito no combate ao racismo e aumento das denúncias”, defende Paulo Victor Squires.

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