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OVNIs na Amazônia: o mistério sem respostas

Moradores do nordeste do Pará ainda recordam fatos que, 45 anos depois, seguem sem explicação, mesmo após apuração militar na Operação Prato: o que seriam os ataques que, nos anos 1970, teriam ferido pessoas até causado mortes na região?

Caio Oliveira

Em outubro de 1977, Carmen Vale estava em Belém com a família quando começou a ouvir que coisas estranhas estavam acontecendo do céu em Colares, uma pacata cidade do nordeste paraense. Eram relatos de que, no município que ela morava, bem como em outras localidades da Região do Salgado, parte da Amazônia com forte influência do encontro entre a grande foz do Amazonas e o oceano Atlântico, pessoas estavam sendo atacadas pelo fenômeno apelidado de “Chupa-Chupa”. Os ataques vinham do céu, geralmente no escuro da noite, e envoltos em luzes misteriosas e ruídos estranhos. 

Ouça o comentário desta reportagem em inglês:


Logo as histórias se espalharam com velocidade. Como moradora de um dos locais mais afetados, Carmen ficou impressionada e aflita. Depois de muito tempo longe, resolveu voltar para casa, na vila do Ariri, a pequena comunidade hoje acessada por oito quilômetros de estrada, a partir de Colares. Mas naquela época, a jornada parecia ainda mais distante, por conta da viagem de canoa - o único acesso então possível, há quase 50 anos. Chegando à comunidade, ela mesma ouviu da boca de seus vizinhos os dramas que eles enfrentavam.

E depois de se despedir do amigo em um velório, na casa dele, foi a vez dela mesma vivenciar a estranha experiência. ”Viemos de lá por volta de meia-noite. Eu me deitei, coloquei o braço assim [sobre os olhos]. Quando eu fechei meu olho, ouvi aquela zoada estranha. Quando eu vi, a claridade veio e me atracou bem aqui. Aí eu não sei mais. Fiquei amortecida. Queria me mexer e não podia”, conta Dona Carmita, mostrando as marcas em seu braço. 

São evidências físicas que resistiram ao tempo, após os dias de indisposição, depois do ataque. Ela ainda mora no Ariri e é uma das últimas testemunhas do terror que se abateu sobre aquela comunidade. Seus moradores até hoje ainda seguem sem uma explicação satisfatória para o que aconteceu naqueles dias.

Ocorrências chamaram a atenção do mundo

Para muitos dos ufólogos que peregrinam de todo o globo para conhecer de perto a região, não há dúvidas: na década de 1970, o Pará foi um dos locais do planeta com as maiores incidências de visitas de vida extraterrestre. 

Quase 45 anos depois, a Operação Prato, iniciativa das forças armadas brasileiras para averiguar o que eram esses fenômenos, segue sendo a maior missão militar para investigar objetos voadores não identificados (OVNIs) de que se tem notícia no mundo. Mas ainda assim, muito pouco se sabe também sobre o que foi apurado pelos militares.

Hollanda só encerrou os trabalhos no dia 5 de dezembro de 1977, quando se reuniu com o brigadeiro Protásio Lopes de Oliveira, autoridade militar que então estava à frente do 1º Comando Aéreo Regional (Comar 1), de Belém. No encontro, foi reportado mais um relatório. O capitão contou que ele e o sargento João Flávio Costa teriam avistado, dias antes, um objeto voador gigantesco, no formato de uma bola de futebol americano, sobrevoando o rio Guajará-Mirim, em Ananindeua. Depois de ouvir o relato impressionante de seu subordinado, o brigadeiro Protásio mandou suspender toda a operação.

Já aposentado, e promovido a coronel, o próprio capitão Hollanda voltou a falar do caso, em uma famosa entrevista, concedida 20 anos depois desses eventos, ao ufólogo e jornalista Ademar José Gevaerd, editor da revista UFO. Na ocasião, Hollanda relatou seus avistamentos e revelou que toda investigação militar foi amplamente documentada, mas que apenas uma fração do que foi apurado havia sido disponibilizada à consulta pública. 

Dois meses depois de conceder essa entrevista, o coronel Hollanda tirou a própria vida, se enforcando com uma corda do roupão, em seu quarto. O fim trágico do militar adicionou uma aura de mistério ainda maior a todos os fatos e episódios que cercam toda a operação.

Ataques viram manchetes: queimaduras, perfurações, febres e mortes

Carlos Mendes entrevistou cerca de 80 pessoas em seus dias de reportagem sobre os casos sem explicação, que iam mudando de nome conforme as localidades. “Aparelho”; “Luz vampira” e “Chupa-chupa” foram algumas das denominações dadas pelos ribeirinhos para os objetos ou fenômenos presenciados. Mas além das diferenças, o que mais chama a atenção são as similaridades nos relatos de pessoas que viviam em comunidades isoladas, a quase 300 quilômetros de distância uma das outras, bem como os mesmos sintomas físicos e emocionais.

“Após o ataque, as pessoas desmaiavam. E durante o desmaio, acontecia, em alguns casos, aquilo que os ufólogos chamam de abdução”, relata Mendes. Entre os sintomas, os pacientes que davam entrada no posto de saúde de Colares tinham aparência anêmica, apresentando tontura e febre. E, em alguns casos, perfurações e marcas de queimaduras de primeiro grau pelo corpo. 

“As queimaduras eram na região dos seios das mulheres. Diziam que esse raio queimava, e eu vi isso. E vi também como se fossem furadas de agulha. O Seu Newton é uma das testemunhas vivas desse caso. Ele foi atacado, no pescoço. Esse homem ficou sem mexer a cabeça por vários dias”, conta Carlos sobre um de seus entrevistados.

“Eu tinha 18 anos, e esse fato já estava correndo em Colares”, relembra Newton Cardoso, o “Tenente”, que hoje tem 64 anos e é uma das mais conhecidas vítimas do “Chupa-Chupa”. “Eu tava começando a namorar com essa que é minha esposa. Nesse dia, cheguei da pesca, deixei um peixe em casa e fui atrás dela, em Mocajatuba. Eu disse pra ela: ‘olha, tem um negócio correndo em Colares sugando as pessoas’, e ela disse: ‘a mesma coisa tá acontecendo aqui’. Ela amarrou uma rede pra mim, o sono veio e eu dormi. Quando eu vi, veio aquele negócio pra me acabar: aquela temperatura muito alta no meu corpo. Aquilo me deu três sugadas, do lado do meu pescoço. Eu joguei o lençol para trás e pedi socorro pra ela, e eu ouvi ela gritar”, relembra a testemunha. Para ele, aquela noite mudou para sempre a sua vida. 

Newton não tem dúvidas que teve contato com alienígenas. E acredita que o capitão Hollanda também teve - mas na época, teria omitido muito do que presenciou durante seus dias na costa paraense. “Ele [Hollanda] não ia dizer: ‘olha, foi tal coisa que tava chupando o povo’. Ele arrumou as coisas e foi embora pra Belém”, supõe Newton Cardoso, cercado de seus ETs de argila.

Colares ainda vive sob a influência dos estranhos acontecimentos

Jornalistas, documentaristas e ufólogos do mundo todo visitam a ilha de Colares frequentemente, atrás de entrevistas com as testemunhas ainda vivas e suas versões dos episódios vividos nos anos 1970. Um dos que se dedicam a essa investigação independente é Heitor Costa, fundador do grupo Ufologia na Amazônia, coletivo que já fez várias incursões em busca de novas revelações. 

Apesar do nome de seu projeto, Heitor Costa rejeita o título de ufólogo. Diz que se considera mais um investigador - e que não acredita cegamente em fenômenos alienígenas. “Minha função é documentar o assunto. Eu considero outras possibilidades, como eventos terrestres, pois na época estávamos na Guerra Fria”, reitera o paraense, que não descarta que os eventos podem ter sido causados por algum tipo de experimento bélico, enquanto outros estudiosos têm certeza que o caso foi inteiramente causado por interferência alienígena. 

“Para uma parte da ufologia, foi um evento hostil. E para outra, foi de coleta de dados. Com essas pessoas que alegam ter sido atacadas, e que dizem que tiveram sangue retirado, há a possibilidade de ter tido uma pesquisa por parte dessas entidades”, diz o pesquisador. “O que eu posso dizer é que algo extraordinário, de fato, aconteceu ali naquela região. Pessoas foram atacadas, e o desespero tomou conta”, assegura Heitor, que é um importante colaborador de sites e publicações dedicadas ao tema.

Os estranhos fenômenos na década de 1970 em Colares e região ocorreram apenas 16 anos após a ilha ser elevada à categoria de município, desmembrado de Vigia, por lei publicada em 29 dezembro de 1961. A história da ilha se mescla, assim, à da própria Operação Prato - e é praticamente impossível se referir à cidade insular sem falar dos mistérios que a rondam. Hoje, longe do terror que o assunto causava há quase meio século, os moradores da cidade abraçaram a fama de “Terra dos ETs”. E é comum encontrar desenhos de homenzinhos verdes e discos voadores em casas e estabelecimentos, além de esculturas. A fama da cidade tenta abraçar o turismo, ainda que com passos tímidos.

“Vários pesquisadores já vieram aqui. Já teve congresso internacional de ufologia, e tem essa ligação com Colares. Há os sobreviventes que sofreram os ataques. Nossa intenção, como prefeitura, é potencializar mais essa questão, inserir mais no processo cultural e turístico”, afirma o Secretário de Cultura, Turismo, Esporte e Lazer de Colares, Fabiano Furtado. Mas, ainda que os casos da década de 1970 gerem interesse mundial, ainda não há um museu ou centro cultural no município que mantenha viva essa história.

“Faz parte da cultura do município”, explica o artista Eden Corrêa, que além de cabeleireiro e pintor, é o escultor “oficial” do município, criando estátuas feitas de cimento que adornam residências e lojas. Elas servem hoje também como espécie de cartão postal para os visitantes de Colares. “Desde que a Operação Prato veio para cá, os extraterrestres ficaram entranhados. Isso me inspirou, essa questão dos OVNIs que os antigos falavam. Meu pai e minha mãe vivenciaram essa história, e com esses fatos, eu tive essa ideia de criar umas esculturas, para não perder a tradição dos ETs”, justifica o artista. Eden Corrêa já exporta suas obras para outros municípios do Estado. Para ele, Colares foi sim visitada por seres de fora da Terra. 

“Eu acredito, pois meu pai e minha mãe não vão mentir pra mim. Eles vivenciaram isso. Eles falam que, nesse tempo, ninguém dormia. Todo mundo ficava acordado à noite pra ficar em vigília, porque as luzes apareciam e as pessoas soltavam foguete pra afugentar”, diz o escultor. Como artista, ele sonha com o dia em que essa história peculiar do município passe a ser usada como fonte de renda para toda região. “Acho que dá pra investir, pra chamar muito mais turistas. E o município vai ganhar com isso”, sorri.

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