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Pará tem potencial para liderar bioeconomia a nível global, mas ainda precisa superar entraves

Economia baseada na biodiversidade tem gerado cada vez mais renda ao redor do mundo e é o caminho de um futuro sustentável compartilhado

Eduardo Laviano / O Liberal

Muitos debates ganham repercussão ano a ano no Dia Mundial do Meio Ambiente, celebrado em 5 de junho. Poucos deles, porém, são tão abrangentes quanto o conceito de bioeconomia e são tão cheios de possibilidades para um futuro sustentável e de bem estar social, gerando emprego, renda e preservação ambiental.

 

 

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"Hoje, posso afirmar que o açaí é a peça fundamental da nossa bioeconomia, pois envolve a cultura local, a população, padrões internacionais rígidos e renda para comunidades vulneráveis. É um conjunto de valores que interagem entre si", diz Mário Jardim, engenheiro florestal que coordena a área de botânica do Goeldi.

Jardim pesquisa sobre o açaí e o manejo de açaizeiros desde 1988. Segundo ele, que é doutor em ciências biológicas e ecologia, a cadeia produtiva do açaí muda conforme cada município. Apesar do volume grande dos frutos no estado, ele acredita que é preciso pensar no futuro, mesmo que o açaizeiro não possua risco de extinção atualmente.

"Há a questão da manutenção das populações naturais do açaizeiro. É uma planta muito usada para fins comerciais. Outro ponto é valorizar os atores envolvidos. Trabalho há muitos anos com extrativistas na comunidade e vejo que ainda tem muito a melhorar para eles em termos de qualidade de vida. Mais do que bioeconomia, precisamos promover o bioempreendedorismo, com jovens e empresários investindo em produtos naturais com cooperativas, de forma compartilhada. Minha sugestão, neste momento em que se celebra o Dia do Meio Ambiente, é que plantem uma muda de açaí onde quer que seja, para as gerações que estão vindo", alerta Mário.

Consumidores podem apoiar bioeconomia com atos simples

Segundo estudo da Nielsen, realizado em 2019, a sustentabilidade é a terceira maior preocupação do consumidor brasileiro. Sete milhões de lares no país declararam ter hábitos sustentáveis e são eles que concentram quase 20% do faturamento de produtos de higiene e beleza, área na qual a Amazônia também transborda potencial.

O ramo possui indústrias grandes instaladas no Pará, mas os pequenos empreendedores também movimentam o setor de cosméticos na Amazônia. Quando Laura Loisy criou a Eulauea Cosméticos Naturais, o objetivo era resolver um problema pessoal de longa data.

"A marca existe desde 2019. Sou vegetariana há sete anos e sempre fiquei procurando produtos veganos e nunca tive muitas opções, até por conta da falta de dinheiro também. Então comecei a pesquisar como fazer xampu e sabonetes com ingredientes locais. Além disso, sou do candomblé e sempre mexi com ervas. Depois de um tempo as pessoas perceberam que eu usava produtos diferentes e foram se interessando", conta ela, que tem 20 anos.

Os xampus, sabonetes e produtos de cuidado facial desenvolvidos por Laura são um sucesso. Com o tempo, outras preocupações foram surgindo na mente da empreendedora, todas relacionadas à bioeconomia e à sustentabilidade. Ela fez questão, por exemplo, de valorizar fornecedores locais, e de conscientizar consumidores sobre o descarte dos recipientes, que são todos retornáveis. 

"Eu fui percebendo também a questão do lixo, do plástico, do cuidado ecológico. Eu só uso produtos amazônicos também: óleos amazônicos, manteigas amazônicas, desde a compra até a feitura até a pessoa receber, tudo é pensado. A minha principal fornecedora é a Amazon Oil, de Ananindeua, e que infelizmente pouca gente conhece. Além disso, uso alecrim, camomila e outras ervas, tudo comprado no Ver-o-Peso", afirma ela, que faz tudo sozinha e, às vezes, conta com a ajuda da namorada. 

Apesar do alcance que as redes sociais deram ao negócio de Laura, ela acredita que ainda falta incentivo no Pará, apesar do potencial do estado para liderar esta nova economia do mercado de cosméticos baseada na sustentabilidade.

"Vejo muita gente que se interessa, muita gente compra para revender e tem muitos produtores. As pessoas são curiosas em relação a isso. Antes eu tinha um nicho, aqui no centro de Belém, hoje em dia expandiu muito. Mas, alguns químicos para o xampu eu tenho que comprar em São Paulo. Falta diversificação e divulgação também", entende ela, que tem aumentado a produção desde que se mudou para uma casa maior. 

Para Joice Ferreira, da Embrapa, os cidadãos podem contribuir com o fortalecimento da bioeconomia local com atos simples. 

"As pessoas vão ao shopping e olham um produto importado com muito apreço, mas possuem um certo desapreço por aquilo que é local. Valorizar a bioeconomia é valorizar os produtos da nossa biodiversidade. Quando valorizamos as feiras locais, produtores locais e escolhemos os nossos representantes que dão valor à floresta e vão trabalhar no sentido de conservação da floresta, da cultura da gastronomia, tudo isso é incentivar a bioeconomia, ajudando o desenvolvimento do local onde moramos, que é único", aconselha.