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'Payxão': estudo analisa performance da torcida do Paysandu nas arquibancadas

Tese da UFPA estudou o que move o torcedor bicolor e como as manifestações de apoio ao clube são realizadas

Aila Beatriz Inete

Nas arquibancadas, cânticos, bandeirões, faixas e tambores transformam o estádio em palco de um espetáculo coletivo. Em Belém, o esporte ganha uma atmosfera diferente e única com Remo e Paysandu. A paixão do torcedor paraense impressiona não só pela intensidade, mas pela forma como constrói uma identidade própria, que mistura tradição, criatividade e emoção.

Essa relação entre clube e arquibancada virou objeto de estudo acadêmico pela primeira vez. Lucienne Coutinho, professora e pesquisadora, se debruçou sobre o universo da torcida bicolor para entender o que move o torcedor que acompanha o Bicola. A resposta é simples:

"A paixão é o principal elemento que move esse torcedor", destacou a pesquisadora.

Veja a entrevista completa 


Mas essa paixão também está rodeada de outras sensações que envolvem pertencimento, histórias e diferentes sentimentos. Tudo isso é exemplificado em cada jogo, não só com a presença em massa dos torcedores, mas também com as manifestações, que estão presentes nas roupas, fantasias – como o Papa do Paysandu –, músicas e outros elementos.

Para a tese intitulada Corpos Alterados: gesto, performance e paixão entre torcedores do Paysandu, defendida no Programa de Pós-Graduação em Artes da Universidade Federal do Pará (UFPA), Lucienne participou ativamente do universo dos torcedores e, bicolor como é, entrou em uma torcida organizada feminina, fez entrevistas e foi aos jogos para ter a experiência e compreender melhor o fenômeno.

Conforme o trabalho, o torcedor “incorpora” a camisa do clube que ama, o “manto sagrado”, como se fosse sua segunda pele, a “tatuagem” que identifica o pertencimento àquele grupo.

Na pesquisa, Lucienne trabalha os conceitos de Aristóteles, que descreve 14 paixões humanas. A pesquisadora encontrou, em cada manifestação bicolor, exemplos vivos dessas emoções.

“O momento, por exemplo, que está passando agora o time, é o momento em que o torcedor se encontra na cólera, na raiva. Ao mesmo tempo que ele se encontra na raiva, no outro dia ele já perdoou. Não é à toa que é chamado de fiel, a torcida fiel, porque é um relacionamento, esteja na alegria e na tristeza", apontou Lucienne Coutinho.

Energia que movimenta o jogo

Não é incomum encontrar atletas que cheguem a Belém e fiquem chocados com a presença e a festa da torcida paraense, seja de Remo ou Paysandu. Gabriel Bispo, ex-volante do Papão, disse em 2024 que achava "a torcida do Paysandu semelhante à do Flamengo e Corinthians, uma torcida que é fiel, que está sempre ajudando, disposta, apoiando o tempo todo".

A declaração de Bispo é curiosa, pois não é comum times fora dos eixos Sul e Sudeste, especialmente na região Norte e fora da elite do futebol brasileiro, terem torcidas tão presentes e em grande expressão. Mas com a dupla Re-Pa, é diferente.

Mauricio Antônio, zagueiro do Bicola, também se disse impressionado com a força da torcida do clube, que não apenas faz uma grande festa nas arquibancadas, mas é gás e incentivo para os jogadores nas partidas.

"Essa torcida já tinha me impressionado quando eu vim jogar na Curuzu [como adversário]. Com certeza foi a torcida que mais incomodou o time em que eu estava. Agora que vi de perto, sei da força da torcida, que não parou de apoiar nenhum segundo. Vim para ajudar a equipe e dar alegria aos torcedores", declarou o jogador quando chegou ao clube bicolor em abril.

Por isso, o Papão é considerado uma força dentro de casa, especialmente na Curuzu, onde as arquibancadas são próximas do campo e os cânticos e a energia dos torcedores são sentidos a todo momento.

"Eu sempre falo que o jogo é diferente dentro de casa, lá na Curuzu. O elemento diferencial dessa comunidade da torcida é que não é só no jogo que eles vivem essa paixão, esse amor. Eles vivem 24 horas. Então, essa paixão pelo time não é à toa que está atrelada à vida do torcedor. A paixão, o amor que move o torcedor do Paysandu é o diferencial. Não é melhor que os outros, mas ele se diferencia", disse Lucienne. 

Em seu trabalho, a professora descreve o torcedor como um performer espontâneo, que não ensaia, apenas vive. "É uma paixão que move o torcedor, que o leva a pertencer a essa comunidade, essa comunidade de primeira família. Ele sai dessa família e entra nessa comunidade de torcedores."

Em um momento em que o clube atravessa uma fase difícil e luta para não retornar à Série C do futebol brasileiro, a torcida tem um papel importante para incentivar a equipe. Mas já ficou claro que, independentemente da divisão, eles sempre estarão lá.