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#Gratidão: conheça a história de pessoas que atuam no combate à covid-19

Servidores do município contam relatos do dia a dia da jornada contra o vírus nas ruas de Belém

A certeza da gratidão

A Prefeitura de Belém, em parceria com o jornal O Liberal encerra, neste domingo, 29 de agosto, a série especial de três cadernos intitulada “Gratidão”. Ao longo dos meses de junho, julho e agosto, contamos, aqui, histórias que nos encheram de esperança, inspiração, afeto e, claro, gratidão. Histórias de profissionais da saúde, de projetos, de trajetórias… mas, especialmente, de pessoas! Pessoas que se doaram, verdadeiramente, para salvar a vida dos belenenses durante a pandemia de coronavírus. Um trabalho do qual a humanidade precisa se lembrar e agradecer todos os dias. Sem a doação e a entrega desses profissionais, quantos mais não teríamos perdido? Quão pior tudo não teria sido?

Nessa via dolorosa em que se transformou a pandemia, muitos de nós nos tornamos mais fechados e reclusos, devido ao distanciamento social; outros subverteram essa lógica e se entregaram para virar a chave da realidade do mundo, hoje. Como os voluntários que, de forma espontânea, estão trabalhando na campanha de vacinação e ajudando, localmente, o mundo a superar essa fase. A eles e a cada um dos milhares de profissionais da saúde de Belém, nas redes pública e privada, o nosso eterno muito obrigado. Estejam certos de que jamais esqueceremos de seus esforços.

VIVA O SUS!

A gente aprende na faculdade de jornalismo a não escrever nossas matérias em primeira pessoa, evitar os adjetivos ao máximo, sempre ouvir não “os dois”, mas todos os lados das histórias que cobrimos. Com as fontes, dizem as boas práticas, não devemos ter qualquer laço, senão de jornalista e fonte. Mas peço licença aos mestres para fazer, nesse texto, tudo ao contrário.

O primeiro golpe do ano de 2020 chegou na terceira hora do primeiro dia do Ano Novo. O telefone tocou e era a ligação que ninguém queria receber. Minha avó, Terezinha, falecera aos 88 anos, em decorrência de um câncer do tipo linfoma. Matriarca de primeira ordem, fazia questão de acolher a todos o tempo inteiro. Estar, fisicamente, longe desse símbolo é uma dor com a qual todos ainda aprendemos a lidar. Três meses depois, em abril, a rotina de um hospital voltou a fazer parte da nossa casa. Que medo.

O uso de máscaras ainda não difundido contribuiu decisivamente para que meu pai, Josino, contraísse covid, numa dessas horas de desproteção, na rua, no supermercado, em casa… quem sabe? Os sintomas que nos confundiram com uma gripe, virose, eram muito intensos. Como dizem os bons paraenses, “derrubaram” meu pai, pouco habituado a qualquer tipo de enfermidade. À época, procurar hospitais deveria ser só em casos de extrema urgência, o que atendemos. Mas minha tia Fátima, médica pneumologista, foi até nossa casa visitar o irmão. O olho clínico sentenciou o que mais tarde apontaram os exames: covid.

Começa a caçada ensandecida por hospitais. Todos lotados. Sem exceção. Até abrir uma vaga no Hospital Municipal Dom Vicente Zico, na Lomas Valentinas, em Belém. Fui eu quem dirigi até lá, por ruas de uma cidade que começava a entender a importância do isolamento social. Na porta do hospital, papai foi posto em uma cadeira de rodas e levado. Por mais de 10 dias, nossos contatos com ele foram raríssimos. Não fosse a ligação diária da assistente social.

Lá dentro, apesar das dificuldades impostas ao corpo pela doença e da lotação absoluta dos hospitais, papai sempre nos conta que seu período de internação foi bom, que ele não tem do que reclamar. Porque os funcionários dos hospitais “devem ter recebido treinamento para tratar muito bem dos pacientes com covid. As pessoas da limpeza, enfermeiros, enfermeiras, médicos... todos eram ótimos e nos tratavam muito bem. Nos tratavam de forma humanizada”, palavras dele. Toda vez que ouço isso me questiono se de fato houve um treinamento (além de toda a experiência e estudo que esses profissionais empenham) ou se não deu tempo de nada e aquelas pessoas, além de terem sido colocadas ali, providencialmente, não estavam tão somente dando o melhor delas. Quem sabe as duas coisas?

Ao longo dos dias de internação, aqui fora, papai não sabia, mas perdera duas tias, com mais de 90 anos. Ambas de covid. As notícias de morte de pessoas próximas aqui fora eram diárias. Lá dentro do hospital, ele também as ouvia. Alguns pacientes não resistiam à brutalidade da doença no organismo. Tristeza pelos que partiam e medo de ser o próximo, certamente, os aterrorizava. Mas era preciso acreditar na cura. Seu Luís, amigo de quarto do papai, colocava um sonzinho bem baixinho no quarto todas as noites até que todos dormissem. A trilha sonora era bolero. Quem não chorava de saudade, adormecia.

Na enfermaria com papai, além de Seu Luís,  Seu Roseton. Os três viraram amigos que ainda conversam, até hoje, vez ou outra, graças aos aplicativos de tecnologia. Os três entraram e saíram juntos da internação, todos vivos. O que, não tenho dúvida, graças a dedicação de toda a equipe do hospital. Além das orações intensas e energias positivas o tempo inteiro.

Como outras 50 mil pessoas, em Belém, meu pai, felizmente, se curou da covid. Ao SUS, meu muito obrigado. Gabriel.

Voluntários pela vida

Em Belém, cerca de mil pessoas se dedicam a ajudar, sem recompensa financeira alguma, numa corrente de união para livrar o mundo da pandemia imposta pela covid-19 

Vo-lun-tá-rio. Diz o dicionário da língua portuguesa: que não é forçado, que só depende da vontade; espontâneo; que se pode optar por fazer ou não. Em Belém, cerca de mil pessoas optaram pelo “sim”. Sem receber nada em troca, voluntariaram-se para trabalhar na mais importante campanha de vacinação dos últimos 100 anos: a da covid. O trabalho deles é dito como fundamental para ajudar a salvar a vida dos quase um milhão e meio de belenenses que precisam ser imunizados. Um esforço local para ajudar o mundo a se livrar da pandemia.

Estudante do sexto semestre de enfermagem na Universidade Federal do Pará (UFPA), Douglas Galvão, de apenas 20 anos de idade, é um desses mil voluntários. Há 6 meses, o morador do bairro do Atalaia, acorda às 5h da manhã para ajeitar as coisas em casa. Às 6h, já está na rua a caminho do posto de vacinação no bairro no estádio “Mangueirinho”. Dependendo do dia e da grana, vai para o posto a pé, de ônibus, ou conta com a carona de colegas que passam pela Augusto Montenegro.

Chegando lá, por volta das 7h, começa a maratona que já chegou a durar 15 horas, em um único dia. Organizar o espaço para receber o público é a primeira tarefa dele e dos colegas. Um trabalho que exige, diariamente, uma nova estratégia. “Cada dia, a gente recebe um grupo lá no posto. Se forem grávidas, a gente arruma o espaço de um jeito, se forem pessoas com dificuldades de locomoção, a gente faz de um jeito que elas não precisem fazer grandes esforços para fazer o registro e a vacinação”, conta o futuro enfermeiro que, desde o início da pandemia, contabilizou perdas muito doloridas na família e em amigos próximos.

“Ver as pessoas indo pra casa com a esperança de dias melhores, se vacinando, comemorando, se emocionando (e me emocionando também) é o que me deixa mais grato. A campanha de vacinação é a esperança”, diz Douglas.

Esperança e emoção compartilhadas por outra voluntária, ainda mais nova que Douglas. Fernanda Teresa tem apenas 18 anos de idade. Faz curso técnico de Enfermagem e é caloura do curso de Enfermagem da UFPA, em Belém. Desde 26 de junho, ela atua na parte dos registros, no mesmo posto Mangueirinho em que é possível encontrar Douglas. A ida dela para o voluntariado tinha um propósito: queria ganhar experiência já que, com a pandemia, as aulas práticas do curso técnico diminuiram muito. Mas ter sido tão bem acolhida pela equipe do posto a fez “não conseguir mais deixar de ir”, nas palavras dela. Quer ficar por lá até acabar a campanha de vacinação.

Esforço que não tem preço

E se você acha a Fernanda muito novinha, a paixão dela pela área da saúde já vem de muito tempo. ”O voluntariado só confirmou essa paixão”, disse. E se amor é para ser compartilhado, ela não brincou com o serviço. Arrastou com ela mais 10 colegas do curso técnico para endossar o corpo de voluntários da campanha.

Sair do bairro de Águas Brancas, em Ananindeua, todos os dias, pouco depois das 6h30 da manhã para contribuir com a campanha, tem suas vantagens. Sentir-se grata, por exemplo, foi o sentimento que teve no que, para ela, foi um dos dias mais especiais até aqui: a vacinação de pessoas com deficiência. Uma amiga dela que tinha conhecimento na Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) foi decisiva para que elas conseguissem registrar pessoas surdas, por exemplo, e encaminhá-las para vacinação.

“Essa gratidão é um sentimento inexplicável... mas eu diria que tem a ver com poder fazer parte de algo tão importante. Porque cada pessoa que se disponibiliza para se vacinar e as pessoas que se vacinam são heróis! Então, nós também estamos à serviço de heróis. Receber um obrigado, um sorriso… isso paga qualquer coisa, não tem preço”.

Alberth Lima, de 22 anos, morador do bairro do Guamá, o mais populoso de Belém, sabe bem do que a Fernanda tá falando. Gratidão é dessas coisas que não têm preço e que se expressam pelo olhar, já que o sorriso está tapado por trás das máscaras. “A gente recebe muitos ‘obrigados’, vê pessoas chorando de felicidade, ou porque conseguiram resistir até aqui quando algum parente não teve a mesma sorte. É muito gratificante ver de perto o ser humano na sua melhor forma”, conta.

O posto de vacinação que ele trabalha fica na Igreja Quadrangular, na Barão de Igarapé-Miri, pertinho da casa dele. Às vezes, o trabalho começa ainda em casa, quando imprime alguma plaquinha para organizar a posição das pessoas na fila, por exemplo. E quando chega ao posto, já encontra gente na fila! “São pessoas que chegam muito cedo porque sabem a importância da vacina e porque precisam trabalhar!”, conta.

O estudante do sexto semestre do curso de enfermagem da UFPA, diz que no início da pandemia, quando não havia vacina, e o vírus era desconhecido, muitas vidas foram perdidas e ser voluntário foi a forma que ele encontrou “como cidadão e estudante de Enfermagem, de reduzir internações e perdas de pessoas… antes eu não podia fazer nada pelas pessoas, mas hoje posso”.

Consultório na Rua faz a inclusão vacinal  

Equipes de saúde e assistência social se unem para imunizar as pessoas em situação de rua

Foram as equipes do Consultório na Rua que saíram por Belém, durante dois dias, cadastrando pessoas em situação de rua para que pudessem receber a primeira dose da vacina contra a covid-19. Entre os pontos visitados, estão a orla de Icoaraci, Entroncamento, Porto da Palha, complexo de feiras do Jurunas, praça e feira da Cremação. As buscas das equipes aconteceram com o auxílio de duas vans que circularam pelos locais.

"As equipes volantes, que estão na vans, vão a alguns pontos da cidade em que as pessoas em situação de rua costumam ficar. Em seguida, fazem a sua avaliação em relação ao grupo, para ver se não estão alcoolizados. Se não estiverem, é feito o cadastro e eles são vacinados", explica a coordenadora da estratégia Consultório na Rua, Rita Rodrigues.

Dois dias após o primeiro cadastro, já era tempo de comemorar. 535 pessoas receberam a primeira dose. As vacinas foram aplicadas, com o apoio da Fundação Papa João XXIII (Funpapa), nos Centro Pop de São Brás, Icoaraci e no Mercado Antônio Bolonha.

Dona Severina da Silva, de 62 anos, foi uma das vacinadas e não escondia o alívio. Teve covid-19 duas vezes. "Foi muito ruim, eu achava que ia morrer, fiquei muito cansada, tossi muito, passei noites sem conseguir respirar e fui parar no hospital. Já tô bem, graças a Deus, mas fiquei com sequelas".

Dona Severina está, agora, na expectativa pela segunda dose. Sabe que só assim a imunização vai estar completa. "Eu já estava me perguntando se não iria chegar o meu dia de vacinar, estava agoniada. Agora eu estou sentindo um alívio, mas só vou ficar sossegada mesmo quando tomar a segunda dose", disse.

Enquanto uns vivem na ansiedade, Seu Edmilson Damasceno, de 56 anos, precisou ser convencido. Não queria se vacinar, mas mudou de ideia graças à abordagem da equipe do Consultório na Rua. "Essa doença estava dando em muitas pessoas, então tomei agora a minha primeira dose para combater essa doença".

Mas a campanha continua. Por meio do Consultório na Rua, a Sesma tem como estratégia fazer uma nova chamada para a vacinação de pessoas em situação de rua até que todos sejam imunizados.

A segunda dose de dona Severina e seu Edmilson estão confirmadas para a segunda semana do mês de setembro, quando vão se juntar às mais de 306.508 pessoas que já receberam a segunda dose em Belém.

(Com informações da Agência Belém)

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