Empreendedores 60+: maturidade e experiência a serviço do próprio negócio
Paraenses contam quais benefícios o empreendedorismo traz para a vida após os 60
Mãos que um dia carregaram caixas, bateram ponto ou cuidaram da casa agora se reinventam no gerenciamento do próprio negócio. No Brasil, empreender após os 60 anos tem deixado de ser uma exceção para se tornar movimento. Histórias como a da paraense Sandra Nascimento, de 61 anos, mostram que a maturidade pode ser uma aliada poderosa na hora de abrir um novo caminho profissional.
Após enfrentar um câncer e se ver impossibilitada de voltar ao antigo trabalho, Sandra encontrou, dentro de casa, a chance de recomeçar. Com sobras de semijoias e algumas pedras que guardava, ela começou a montar pequenas peças e divulgar para pessoas próximas. O retorno positivo a encorajou a buscar uma identidade própria para o que produzia, e foi no crochê com fio de cobre que ela encontrou seu estilo. Hoje, Sandra transforma os fios e pedras, como ametista, turmalina e turquesa, em joias artesanais.
“Faço brincos, colares, broches, anéis, bolsas e até colares de mesa”, explica. Os preços variam de R$ 49 a R$ 690, dependendo da composição e dos materiais utilizados. O negócio, além de garantir renda, devolveu a ela algo ainda mais valioso: o sentimento de utilidade e realização. “Eu me achava bem capaz de ser produtiva ainda. Isso trouxe a vantagem para ter minha própria renda, buscar autonomia, me sentir útil. Foi muito bom pra mim”, afirma.
Sandra conta que o trabalho com as mãos e a concentração exigida na produção das peças tiveram papel fundamental em sua recuperação emocional. Além disso, a exposição nas redes sociais e o contato com o público ajudaram o negócio a crescer. Participar de feiras, receber elogios e pedidos de fora do Estado, e até uma venda internacional simples, feita para uma cliente na Suíça, contribuíram para o sentimento de valorização e abertura para novas possibilidades. “Eu comecei a sonhar com coisas que nunca imaginei. E mesmo com mais de 60, sonhar não tem idade”.
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Dados mostram avanço dos empreendedores 60+ no Brasil
A história de Sandra é reflexo de um cenário nacional em transformação. De acordo com dados do Sebrae, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), o Brasil fechou 2024 com 4,3 milhões de empreendedores com 60 anos ou mais, um crescimento de 53% em 12 anos.
Mais escolarizados, diversos e preparados, esses seniores representam um público cada vez mais ativo. Em comparação com 2012, houve uma redução de 22 pontos percentuais na proporção de empreendedores sem ensino médio completo, e aumento de mais de 10 p.p. na presença daqueles com ensino médio completo, além de 8 p.p. no grupo com ensino superior incompleto ou mais.
Apesar de dedicarem menos horas semanais ao negócio, os empreendedores 60+ mantêm um dos melhores rendimentos médios entre as faixas etárias e comandam empreendimentos mais duradouros. Também houve crescimento na participação de mulheres (29,9%) e de pessoas negras, que aumentaram sua presença em 2,1 pontos percentuais em relação a 2023.
Segundo o gerente da Agência Metropolitana do Sebrae/PA, Igo Silva, hoje, muitos empreendedores da terceira idade buscam no empreendedorismo uma forma de complementar a renda, manter-se ativos e realizar sonhos antigos. "A experiência de vida, o conhecimento acumulado e a rede de contatos construída ao longo do tempo são diferenciais importantes. Além disso, a busca por autonomia financeira e flexibilidade tem atraído, cada vez mais, esse público para o mundo dos pequenos negócios".
Apesar disso, Igo pontua que é essencial fazer um planejamento detalhado antes de abrir um empreendimento. "O empreendedor da terceira idade deve avaliar suas habilidades, identificar um segmento com o qual se identifique e conhecer bem seu público. A formalização como Micro Empreendedor Individual (MEI) pode ser um bom começo. Também é importante cuidar da saúde financeira, separar as finanças pessoais das do negócio e buscar capacitação".
O Sebrae Pará oferece cursos durante todo o ano que atendem todos os perfis de empreendedores, inclusive os seniores. Para ter acesso às capacitações, os interessados podem conferir a loja virtual da instituição ou ir pessoalmente em uma das 13 agências do Sebrae espalhadas pelo Estado.
Expectativa com a COP 30
Com a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 30) marcada para ocorrer em Belém, em 2025, Sandra já se prepara para um novo salto. Ela e o marido têm reformulado as peças e adaptado etiquetas e valores para atender ao público estrangeiro.
“Nossas embalagens agora são biodegradáveis, mudamos nossos cartões de visita também e estamos colocando informações em português, inglês e espanhol. Os preços também estarão em real, dólar e euro. Queremos acolher quem vier para cá. As pessoas de fora valorizam muito o que vem da Amazônia. Por isso, me apresento como artesã da Amazônia", afirma.
Outra história, outro recomeço
Assim como Sandra, outros paraenses têm feito da maturidade um ponto de virada. É o caso de José Arlindo, de 66 anos, morador de Ananindeua que montou uma pequena marcenaria após se aposentar como servidor público. “Eu sempre gostei de fazer coisas manuais. Hoje, faço móveis com madeiras. Não é só renda. É saúde mental", resume.
José produz cadeiras, prateleiras e escrivaninhas. Suas peças variam entre R$ 200 a R$ 800 reais e hoje, seu negócio é um complemento da aposentaria. "Eu me sinto em movimento quando estou trabalhando. Sinto que a idade não pode me parar e impedir de continuar criando coisas", complementa.
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