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Lula pode voltar ao País sem atrair chineses para ferrovia bioceânica

Construção da ferrovia é um dos pontos mais importantes para o plano de integração sul-americana que visa ligar Atlântico e Pacífico

Estadão Conteúdo

Se nada mudar nas próximas horas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve retornar ao Brasil da viagem a Pequim sem conseguir um de seus principais objetivos: atrair o capital chinês para a obra da ferrovia bioceânica. A delegação brasileira já deu sinais de que essa meta tão perseguida na visita de Estado pode ficar para depois, e pediu que estatais da China deem um sinal verde em 30 dias.

A construção da ferrovia é um dos pontos mais importantes para o plano de integração sul-americana que visa ligar Atlântico e Pacífico e criar uma rede integrada de escoamento de produtos brasileiros para a China - e vice-versa - além de outros mercados na Ásia.

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A rota de escoamento visa criar a infraestrutura necessária para diminuir o tempo e custos de transporte, e tem na ferrovia seu trecho mais complexo, por atravessar a cordilheira dos Andes.

A visita de Estado foi precedida de viagens de ambos os lados. Chineses analisaram os projetos em Brasília, e ministros brasileiros como Rui Costa (Casa Civil) e Simone Tebet (Planejamento) liderando delegações em Pequim.

Mas, segundo integrantes do Palácio do Planalto, os chineses indicaram que ainda não vão entrar no projeto estratégico do Corredor Bioceânico. Eles suspeitam que haja algum entrave geopolítico.

O corredor é um dos focos da carteira de projetos do Novo PAC, e o Brasil ainda insiste para que seja abraçado pela China, dentro do acordo de sinergia com a iniciativa chinesa Nova Rota da Seda (Belt and Road Initiative).

A China continua pressionando o Brasil a aderir a seu projeto, que já reúne 150 países, muitos na América Latina, e deve agora receber o ingresso da Colômbia.

No entanto, o governo Lula se dividiu sobre uma adesão formal e rejeitou, em novembro passado, essa opção. Houve descontentamento dos chineses.

Uma razão foi a sensibilidade política e o sinal diplomático de que o Brasil estaria se alinhando demais a Pequim. Os dois países então optaram por lançar um plano que sintonize PAC e Nova Rota da Seda.

O megaprojeto de infraestrutura global financiado e construído pela China ao redor do mundo passa dos US$ 2 trilhões, e entrou na mira dos EUA e de Donald Trump. Após ameaçar tomar o Canal do Panamá, ele conseguiu pressionar o governo de José Raúl Mulino a abandonar a estratégia chinesa.

"O Brasil quer fazer parcerias com todos e não aceita veto de ninguém", disse Rui Costa, ao ser indagado sobre o potencial de retaliação dos americanos. "O Brasil prega o multilateralismo, não funciona na base da ameaça e da tensão de nenhum país."

Um diplomata chinês disse ao Estadão que o Brasil precisa de um plano, e que pode ainda demorar algum tempo, como é tradição, para que as empresas chinesas tomem uma decisão tão vultosa.

Segundo o ministro Rui Costa, os chineses têm alertado também que o Brasil precisa formar uma cadeia de suprimentos para ver as obras deslancharem, com formação de pessoal.

O titular da Casa Civil indicou que as obras da Ferrovia de Integração Centro-Oeste (FICO), em Goiás, no segundo trecho, podem ser atrativas aos chineses, assim como o terceiro trecho da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (FIOL), que parte de Ilhéus (BA). Depois, há o desafio da travessia para chegar ao Pacífico, o projeto de engenharia mais desafiador.

"Uma ligação bioceânica não é simples, é um arranjo gigantesco de investimento, com o pequeno detalhe de atravessar a cordilheira dos Andes. Não é trivial", afirmou Costa, sem estimar um prazo para que os chineses decidam. "O que queremos de antemão é chamá-los para participar desse projeto em construção no Brasil."

Rui Costa disse que os chineses têm um processo decisório mais lento e que por isso o governo brasileiro planeja fazer fóruns de apresentação antecipada dos projetos que serão leiloados em infraestrutura (estradas, ferrovias, portos e aeroportos) a fim de que possam de fato aparecer nas concorrências. Os editais, lembrou ele, tem duração de 100 dias.

Já a ministra Simone Tebet pediu uma decisão de investimentos pelos chineses, a respeito da ferrovia do corredor bioceânico, em 30 dias - a tempo da prevista visita de Xi Jinping ao Rio de Janeiro, em julho, para a Cúpula do Brics. Ela apelou aos empresários chineses e autoridades do governo dizendo que o Brasil não tem recursos orçamentários suficientes para tocar o projeto sozinho e depende da parceria. Mesmo os investimentos privados nacionais são insuficientes para as ferrovias, afirmou a ministra.

"Nós temos hoje uma conversa com o governo chinês, especialmente no que se refere à ferrovia, e temos um prazo de, nos próximos 30 dias, estamos vendo a oportunidade de fazermos um projeto ferroviário interligando o Atlântico ao Pacífico, rasgando o Brasil em ferrovia na área considerada o celeiro do Brasil. Nós estamos falando de interligar a Bahia, a região de Matopiba, centro-oeste, o celeiro do Brasil, com o maior investimento chinês na América do Sul, que é o porto de Chancay", disse Tebet.

"Todos os investimentos, rodovias, portos, aeroportos, cabotagem, conectividade, segurança de fronteira, alfândega, nós temos recursos necessários pelo lado do Brasil e no que se refere à América do Sul, nós temos hoje uma carteira que ainda está em aberto de 10 bilhões de dólares para que todos os países possam se financiar e fazer essa integração. O que falta para o Brasil? Nós precisamos de parceria com a China para fazermos aquilo que há de mais caro: ferrovias. Dentro de 30 dias esperamos ter um sinal verde, no sentido brasileiro, no caso da China, vermelho, no sentido de sermos financiados com o projeto executivo daquela ferrovia que apresentamos."

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