CONTINUE EM OLIBERAL.COM
X

Belém tem aumento de 42% no número de trabalhadores por aplicativos em 2025;em 3 anos, número dobrou

Crescimento do setor em Belém é ofuscado por aumento da concorrência, queda nos rendimentos e condições de trabalho precárias, com jornadas de até 15 horas diárias.

Jéssica Nascimento
fonte

A região metropolitana de Belém conta com 10 mil trabalhadores por aplicativo que usam moto ou bike para entregas e corridas em 2025. O número é 42,85% maior que o do ano passado, quando a região metropolitana da capital paraense contava com 7 mil trabalhadores, segundo Ronald Pereira, trabalhador por aplicativo e vice-presidente da Amba (Associação de Moto e Bike de Aplicativos do Pará). De 2022 a 2025, o número de trabalhadores da categoria dobrou, visto que há 3 anos, a região metropolitana da cidade contava com 5 mil, segundo a entidade.

De 2022 a 2024, houve um aumento de 40% em Belém, maior que a média nacional no mesmo período. No Brasil, o número de pessoas que atuam por meio de aplicativos incluindo motoristas e entregadoresaumentou 25,4% em dois anos, de acordo com dados divulgados na última sexta-feira (17/10) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

No país, esse contingente alcançou quase 1,7 milhão de trabalhadores em 2024, ante 1,3 milhão em 2022, representando um acréscimo de 335 mil pessoas. Segundo a pesquisa do IBGE, os chamados “plataformizados” corresponderam a 1,9% dos brasileiros com 14 anos ou mais empregados no setor privado em 2024 — um universo de 88,5 milhões de pessoas. 

Embora o total de ocupados também tenha crescido em relação a 2022 (85,6 milhões), a expansão foi bem menor proporcionalmente: 3,4%. Para efeito de comparação, o número de trabalhadores de aplicativos em 2024 ultrapassa a população inteira de capitais como Recife (1,6 milhão), Goiânia (1,5 milhão), Belém (1,4 milhão) e Porto Alegre (1,4 milhão).

image (Foto: Cristino Martins)

Jornada mais longa, rendimento por hora menor

O IBGE destacou que, embora essas plataformas ampliem as possibilidades de renda e permitam que empresas atinjam novos mercados, também impõem “desafios importantes” quanto às condições de trabalho.

Em média, o rendimento por hora dos trabalhadores plataformizados foi de R$ 15,40 em 20248,3% inferior ao dos trabalhadores não vinculados a aplicativos (R$ 16,80).

Por outro lado, os trabalhadores de apps apresentaram jornadas mais longas: em média, 44,8 horas por semana, 5,5 horas a mais do que a carga horária média dos demais ocupados (39,3 horas).

Essa dedicação maior resultou em um rendimento mensal mais elevado: em 2024, a média de ganhos mensais dos trabalhadores de aplicativos foi de R$ 2.996, segundo a pesquisa.

Renda real X jornada de trabalho

A promessa de uma renda média de R$ 3 mil para motoristas e entregadores por aplicativo em Belém não condiz com a rotina de muitos trabalhadores. Para alcançar esse valor, os profissionais enfrentam jornadas exaustivas que podem chegar a 12 ou até 15 horas de trabalho diárias.

“Ela reflete um pouco, mas desse valor em si existem longas jornadas de trabalho. Para conseguir chegar a esse dinheiro, o trabalhador tem que trabalhar muito. Hoje, na região metropolitana de Belém, temos cerca de 10 mil trabalhadores por aplicativo de moto e bike, tanto de entregas quanto de corridas”, explica Ronald Pereira.

image Ronald Pereira. (Foto: Cristino Martins)

Durante a pandemia, os trabalhadores conseguiam tirar entre R$ 150 e R$ 200 por dia, mas esse valor caiu drasticamente.

“Hoje em dia, o valor caiu para cerca de R$ 100 a R$ 110 por dia, em média. Isso é reflexo do aumento do número de trabalhadores, já que muitas pessoas que perderam seus empregos durante a pandemia se voltaram para as plataformas", afirma.

A jornada de trabalho intensa tem gerado sérios impactos na saúde física e mental dos profissionais. De acordo com Ronald, o desgaste é visível e preocupante.

“Passar de 12 horas diárias é um fator que pode levar a acidentes. O Ministério Público do Trabalho já está ciente dessa situação e realiza discussões sobre o impacto da carga excessiva de trabalho”, aponta. 

Além disso, ele menciona que o Ministério Público está atento aos esforços para regulamentar as condições de trabalho desses profissionais. “Em Brasília, há discussões sobre uma regulamentação para melhorar as condições dos entregadores”, complementa.

Flexibilidade ou exploração?

Embora os aplicativos promovam a ideia de flexibilidade no trabalho, a realidade dos entregadores é bem diferente. A "liberdade" de escolher os horários de trabalho se perde diante de algoritmos que, na prática, controlam as atividades dos motoristas e entregadores.

“A flexibilidade é uma fantasia. O trabalhador pode até ligar ou desligar, mas os algoritmos controlam tudo. Muitas vezes, somos forçados a pegar corridas longas e exaustivas. Isso faz com que o trabalhador passe ainda mais tempo nas ruas, sem uma alternativa real de escolha”, critica o vice-presidente da Amba.

Custos e falta de suporte

Além da exaustiva jornada de trabalho, os custos de manutenção de motos e bicicletas ficam por conta dos próprios trabalhadores.

“Os aplicativos não oferecem nenhum tipo de suporte. O custo com pneus, celular, créditos de internet, tudo isso é de responsabilidade do trabalhador”, revela Ronald. 

Segundo ele, os aplicativos apenas disponibilizam a plataforma, deixando os trabalhadores sozinhos para arcar com todos os custos operacionais.

Em busca de melhores condições para os trabalhadores por aplicativo, a Amba tem se articulado com outras entidades do Brasil. A associação também integra a Aliança Nacional dos Entregadores por Aplicativos (Anea), que luta por direitos trabalhistas mínimos, como acesso à previdência social e segurança no trabalho.

“A Amba está em constante diálogo com outras associações no Brasil para fortalecer a luta por direitos trabalhistas mínimos. Nosso objetivo é garantir uma regulamentação que traga mais segurança e dignidade para os trabalhadores”, conclui Ronald.

Longas jornadas e cansaço físico e mental

Para muitos entregadores e motoristas, as horas dedicadas ao aplicativo são intensas. Jardel Alves conta que sua rotina de trabalho é pesada.

“Saio das 8h até as 13h e depois das 17h30 até as 23h. É cansativo, mas é a forma de trabalho que afeta um pouco tanto a saúde quanto o corpo como mentalmente”, detalhou.

A exaustão também é destacada por Breno Tavares, que trabalha em Belém.

“Rodamos em média de 10 a 12 horas por dia e temos que aproveitar todas as entregas para tentar bater a meta diária. Afeta muito a nossa saúde mental e física, com o desgaste no sol, na chuva e no trânsito”, disse.

Elson Moraes, que já chegou a trabalhar exclusivamente por aplicativo, hoje voltou a um emprego formal.

“Eu costumava rodar 12 horas por dia. A saúde mental e a física ficam bastante desgastadas”, revelou.

Israel Santos, que tem outra fonte de renda além do aplicativo, afirma ter uma rotina mais curta:

“Trabalho de 6h a 8h por dia, nunca mais do que isso. Mas tem entregadores que precisam trabalhar 12h ou até mais de 14h por dia”, contou.

Concorrência crescente e queda nos ganhos

A expansão do número de trabalhadores por aplicativo no Pará tem impacto direto na renda dos entregadores e motoristas. Jardel percebeu um aumento significativo.

“Um grande aumento. Creio que em torno de 70%. Isso afeta a demanda de corridas, entregas e também a renda”, avaliou.

Breno Tavares confirma o cenário:

“A alta demanda de entregadores tem afetado muito as praças de Belém e região pela alta concorrência e a baixa demanda de pedidos.”

Para Elson, essa foi uma das principais razões para buscar outra ocupação:

“Antes eu conseguia sustentar minha família somente com a renda do aplicativo, mas agora, com o crescimento de entregadores e as mudanças no aplicativo, ficou complicado”, lamentou. 

Israel reforça que o número de entregadores cresce todos os dias:

“Todos os dias a plataforma coloca mais e mais entregadores. Com isso, a demanda de corrida acaba sendo dividida.”

Custos elevados e pouca compensação

Além da concorrência, os custos de manutenção pesam no bolso dos trabalhadores. Jardel cita gastos constantes com pneus e peças para bicicleta.

“Infelizmente os valores das corridas e a distância não estão suprindo as manutenções tanto para quem roda de bike como de moto”, queixou-se. 

Breno destaca que, mesmo trabalhando muito, muitas vezes sente que “está trocando dinheiro”. 

“Os custos com combustível, pneus e manutenção do veículo estão altos. Os valores baixos pagos pelas plataformas não compensam”, analisou.

Para Elson, que também usava bicicleta, a situação se agravava em dias de chuva.

“Tinha que fazer manutenção na bike e no celular. Hoje, para um pai de família, eu não indicaria rodar um aplicativo”, declarou. 

Israel resume a relação financeira com as plataformas: “Os custos do veículo são todos do entregador. A plataforma não ajuda em nada.”

Assine O Liberal e confira mais conteúdos e colunistas. 🗞
Entre no nosso grupo de notícias no WhatsApp e Telegram 📱
Economia
.
Ícone cancelar

Desculpe pela interrupção. Detectamos que você possui um bloqueador de anúncios ativo!

Oferecemos notícia e informação de graça, mas produzir conteúdo de qualidade não é.

Os anúncios são uma forma de garantir a receita do portal e o pagamento dos profissionais envolvidos.

Por favor, desative ou remova o bloqueador de anúncios do seu navegador para continuar sua navegação sem interrupções. Obrigado!

ÚLTIMAS EM ECONOMIA

MAIS LIDAS EM ECONOMIA