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Pragas desafiam agricultura no Pará e acendem alerta em produtores e autoridades; entenda cenário

Adepará monitora ameaças como a ferrugem asiática da soja e o cancro da pitaya, enquanto o avanço de pragas quarentenárias pode comprometer a exportação e encarecer alimentos no estado.

Jéssica Nascimento

Com impacto direto no bolso do produtor e do consumidor, a presença e o risco de novas pragas agrícolas no Pará preocupa autoridades sanitárias e especialistas. A atuação da Adepará (Agência de Defesa Agropecuária do Pará), em conjunto com as diretrizes do Ministério da Agricultura e das cadeias produtivas, tem sido fundamental para manter sob controle pragas como a mosca da carambola e a vassoura de bruxa da mandioca. No entanto, a chegada de novas ameaças pode comprometer a produção e até barrar exportações para mercados exigentes. 

Risco constante: pragas sob vigilância no Pará

A agricultura paraense convive com uma realidade desafiadora. Embora pragas de alto impacto como a monilíase do cacau, o cancro cítrico e o greening ainda estejam ausentes no estado, outras já são motivo de atenção — como o cancro da pitaya e a ferrugem asiática da soja, esta última amplamente disseminada e de difícil controle.

De acordo com Núbia Vasconcelos, engenheira agrônoma da Gerência de Pragas de Importância Econômica (GPIE) da Adepará, o monitoramento constante é essencial para proteger as cadeias produtivas. 

“As pragas têm ciclos e modos de ataque distintos, podendo afetar desde o início da safra até a pós-colheita”, explica.

Pragas quarentenárias: o perigo pode estar nos estados vizinhos

Algumas ameaças ainda não chegaram oficialmente ao território paraense, mas já circulam em estados próximos, mantendo os sistemas de vigilância em alerta. É o caso da fusariose da bananeira (Raça 4 Tropical) e do amarelecimento letal das palmeiras, pragas devastadoras que podem comprometer cultivos de grande importância econômica como banana e dendê.

Uma situação delicada envolve a praga vassoura de bruxa da mandioca, registrada na aldeia Bona, no Parque do Tumucumaque, em uma área isolada de floresta. A região, embora sob jurisdição do Pará, tem indígenas que exercem cidadania no Amapá, tornando o controle ainda mais desafiador.

Impactos diretos no produtor e no consumidor

O ataque de pragas encarece toda a cadeia produtiva. Para evitar perdas, os agricultores precisam investir em tratamentos fitossanitários, o que aumenta os custos e, por consequência, o preço final dos alimentos para o consumidor.

No setor de exportação, o cenário é ainda mais delicado. Cada país comprador estabelece protocolos específicos e a presença de pragas pode significar a rejeição de cargas inteiras. 

“Se uma praga for proibida nesses protocolos, o produtor paraense perde a oportunidade de exportar. Para retomar as vendas, será preciso adotar sistemas de mitigação de risco, que também aumentam os custos de produção”, alerta Núbia Vasconcelos.

Culturas mais ameaçadas

Algumas das principais culturas do estado enfrentam riscos elevados com o surgimento ou agravamento de pragas. Estão entre elas:

  • Cacau e cupuaçu (ameaçados pela monilíase, ainda ausente);
  • Bananeira (ameaçada pela fusariose Raça 4T);
  • Citros como laranja, limão e tangerina (vulneráveis ao cancro cítrico e ao greening);
  • Soja e milho (alvos da ferrugem asiática e do amaranthus);
  • Pitaya (já afetada pelo cancro);
  • Mandioca (sob vigilância contra a vassoura de bruxa).

Frutas populares como manga, acerola, goiaba, taperebá e tomate também podem ser hospedeiras da mosca da carambola, praga presente em Almeirim, mas atualmente controlada.

Responsabilidade compartilhada

A engenheira agrônoma explica que a atuação contra essas pragas depende da classificação delas:

“Pragas quarentenárias, por exemplo, têm potencial de emergência fitossanitária e demandam ações integradas entre órgãos estaduais e federais. Já as de importância econômica exigem principalmente o cumprimento de legislações e medidas cautelares.”

A maior parte da responsabilidade, no entanto, recai sobre os próprios produtores. Um exemplo é o combate à ferrugem asiática da soja, que exige o respeito ao calendário de plantio e ao vazio sanitário. “Se o produtor planta fora do período permitido, corre o risco de perder toda a safra, além de ser penalizado”, alerta Núbia.

Foco confirmado em área indígena no Pará

Segundo Benedito Dutra, engenheiro agrônomo e diretor-presidente de uma empresa especializada na produção de sementes de mandioca e feijão caupi, a praga conhecida como vassoura de bruxa da mandioca, causada por um fungo que afeta o crescimento da planta e compromete o desenvolvimento das raízes, teve seu o caso confirmado no Pará em julho de 2025, em uma área indígena no município de Almeirim, região Norte do estado

O foco está em uma zona de difícil acesso, no entorno do Parque do Tumucumaque, e exige vigilância reforçada por conta da proximidade com o estado do Amapá, onde a situação já é crítica.

De acordo com Benedito Dutra, o cenário é alarmante:

“O estado do Amapá já tem 8 municípios contaminados, ou seja, cerca de 50% do território estadual. Em algumas regiões, a população indígena já substituiu a farinha de mandioca por arroz, o que mostra o impacto direto da praga na segurança alimentar.”

A mandioca no centro da agricultura paraense

De acordo com Dutra, o Pará é o maior produtor de mandioca do Brasil em área plantada, com cerca de 300 mil hectares cultivados, número que pode variar entre 270 mil e 330 mil ha conforme a safra. A cultura é base alimentar em grande parte dos lares paraenses e tem importância estratégica tanto para a agricultura familiar quanto para o mercado de insumos agroindustriais.

A praga, caso se espalhe, pode provocar uma redução de até 15% na produção, com prejuízo estimado em R$ 400 milhões nos próximos três anos, segundo Dutra.

“Essa é uma ameaça real. A praga pode se expandir de forma silenciosa e comprometer áreas produtivas rapidamente. Se não agirmos agora, perderemos muito mais do que a safra: perderemos alimentos, renda e empregos”, alerta.

Necessidade de pesquisa e parceria

Para conter o avanço da vassoura de bruxa da mandioca, o setor clama por uma mobilização imediata. Conforme Dutra, a proposta é que se estabeleça uma parceria entre o setor público e a iniciativa privada com foco na pesquisa de variedades resistentes à praga.

“Precisamos iniciar, com urgência, pesquisas que desenvolvam variedades de mandioca resistentes à vassoura de bruxa. Só assim conseguiremos garantir a continuidade da produção e a segurança alimentar do povo paraense”, defende o agrônomo.

Sustentabilidade como estratégia de defesa contra pragas no cultivo do cacau

Na região do Baixo Tocantins, onde a produção de cacau fino vem ganhando destaque nacional e internacional, a preocupação com o avanço de pragas como a monilíase ainda ausente no Pará, mas já presente em estados vizinhos — tem mobilizado empresas, agricultores familiares e especialistas a adotarem estratégias de prevenção e resiliência no campo. 

Um exemplo vem de Abaetetuba, onde uma empresa de chocolates de origem, em parceria com a Fazenda Santa Rita, implementa um modelo agroecológico para proteger a lavoura e garantir a qualidade do produto.

“A produção de cacau de qualidade depende diretamente da saúde e da vitalidade das plantações. Por isso, nossa preparação contra ameaças de pragas não se limita a medidas pontuais, mas sim a uma estratégia integrada”, afirma Antonio Marcos de Sena, fundador e administrador da empresa.

Agroecologia, biodiversidade e prevenção como pilares de proteção

Na Fazenda Santa Rita, situada na zona rural de Abaetetuba, o cultivo do cacau segue princípios agroecológicos, combinando tradição agrícola local com conhecimento técnico. O sombreamento equilibrado, o plantio consorciado com outras espécies e o uso de bioinsumos naturais — muitos produzidos com resíduos do próprio cacau — são práticas centrais para fortalecer a resistência natural da planta.

“A biodiversidade é uma grande aliada no controle natural de pragas, porque cria um ambiente equilibrado entre predadores e agentes nocivos. Além disso, fazemos um monitoramento constante das áreas produtivas, o que nos permite agir com rapidez se necessário”, explica Antonio.

Essa abordagem proativa visa evitar o uso excessivo de defensivos químicos, priorizando o manejo integrado de pragas (MIP) com foco em alternativas sustentáveis. “Cuidar da plantação contra pragas é também proteger a identidade do terroir da região, que confere características únicas aos nossos chocolates”, destaca o produtor.

Fortalecimento da cadeia produtiva: capacitação e preço justo aos produtores

Para além da produção própria, a empresa atua diretamente com os produtores locais do Baixo Tocantins, promovendo capacitação técnica, encontros agrícolas e assistência constante. O objetivo é expandir as boas práticas agrícolas, reduzir a vulnerabilidade das lavouras e criar uma cadeia mais resiliente.

“A praga não afeta apenas a lavoura, mas impacta toda a economia da região. Por isso, também oferecemos preços justos na compra do cacau, mesmo em safras desafiadoras. Isso ajuda a manter a renda das famílias e incentiva práticas sustentáveis”, afirma Antonio.

A estratégia da empresa é fortalecer a produção local com parcerias duradouras e suporte técnico, criando uma rede de produtores mais estável e colaborativa, capaz de enfrentar riscos climáticos e fitossanitários sem comprometer a sustentabilidade financeira das comunidades.

Biodiversidade é a melhor defesa contra pragas nos cultivos amazônicos, alerta Latinamazon

Para Ben Hur Borges, presidente da Latinamazon (Associação Latino-Amazônica de Extrativistas, Produtores, Comercializadores e Processadores de Frutos Amazônicos), o caminho para prevenir pragas é manter o equilíbrio natural promovido pela biodiversidade da floresta.

“Não temos, até agora, qualquer notícia de infestações nos frutos amazônicos. E para continuar assim, é preciso não desprezar a importância da biodiversidade”, afirma Ben Hur. “A floresta tem suas próprias leis de equilíbrio, muito bem estabelecidas.”

Um dos pilares da atuação da entidade é a prevenção de pragas em cultivos intensivos, um modelo crescente em diversas regiões, mas que, segundo Ben Hur, precisa ser encarado com responsabilidade.

“A monocultura de qualquer vegetal irá nutrir suas próprias pragas e ainda livrá-las dos predadores naturais. Isso resulta, inevitavelmente, na proliferação descontrolada desses organismos”, disse.

Ben Hur destaca ainda que o modelo extrativista tradicional, baseado no uso sustentável da floresta em pé, garante não apenas a preservação dos recursos naturais, mas também a segurança fitossanitária de muitos frutos nativos que ganham espaço no mercado nacional e internacional.

“Os extrativistas que respeitam o tempo da floresta e colhem de forma equilibrada não têm do que temer. O perigo está na quebra desse equilíbrio”, afirmou.

Monilíase ameaça produção de cacau no Pará e exige ações urgentes, alerta senador Zequinha Marinho

Enquanto autoridades sanitárias e o setor produtivo do Pará se mobilizam para conter pragas como a ferrugem asiática da soja e o cancro da pitaya, outro risco crescente paira sobre uma das culturas mais estratégicas da região: o cacau. Segundo o senador Zequinha Marinho (Podemos-PA), a monilíase do cacaueiro é uma das maiores ameaças à lavoura cacaueira brasileira atualmente — e o Pará, maior produtor nacional, está em alerta máximo.

“A cultura do cacau é essencial para a economia, o meio ambiente e a inclusão social em estados como o Pará, Bahia, Espírito Santo, Rondônia e Amazonas. Ela gera emprego, renda e promove a conservação ambiental por meio de sistemas agroflorestais sustentáveis”, destacou o parlamentar.

Segundo ele, a monilíase já está presente em países vizinhos e teve casos confirmados no Brasil, nos estados do Acre e Amazonas, ampliando o risco de sua chegada ao território paraense. Altamente agressiva, a praga pode reduzir em mais de 80% a produção de frutos, afetando diretamente milhares de famílias que vivem da produção e processamento do cacau.

“Essa cadeia produtiva está ameaçada. Os impactos socioeconômicos podem ser devastadores nas regiões produtoras”, alertou Zequinha.

Pressão por plano emergencial e reforço à Ceplac

Na condição de membro da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) do Senado, Zequinha Marinho afirmou que o tema já foi debatido em audiência pública, onde especialistas cobraram medidas imediatas do Governo Federal para conter o avanço da praga.

Entre as propostas apresentadas estão:

  • Campanhas educativas para orientar produtores sobre como evitar a disseminação da monilíase;
  • Desenvolvimento de cultivares resistentes à praga;
  • Criação de um plano emergencial nacional, coordenado pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa);
  • Reforço orçamentário e realização de concurso público para a Ceplac, órgão técnico responsável pelo apoio à cadeia do cacau.

“Estamos acompanhando o desenrolar disso e fazendo pressão para que essas ações sejam tomadas, de forma a evitar que a monilíase se alastre pelo Brasil”, afirmou o senador.