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Falta de confiança do empresário industrial no Brasil reflete no Pará e afeta exportações; entenda

Com 46,2 pontos, setembro é o nono mês consecutivo de falta de confiança, a maior sequência negativa desde o início da série histórica

Eva Pires | Especial para O Liberal

A confiança de empresários brasileiros da indústria e do comércio registrou nova queda em setembro, sinalizando um ambiente de cautela que afeta decisões de investimento, contratações e expansão. No ParáDeryck Martins, diretor executivo da Associação das Indústrias Exportadoras de Madeira do Estado do Pará (Aimex), avaliou que os reflexos já são sentidos especialmente no setor exportador de madeira, que depende fortemente da credibilidade internacional e da previsibilidade para manter investimentos em tecnologia e sustentabilidade.

De acordo com a Confederação Nacional da Indústria (CNI), o Índice de Confiança do Empresário Industrial (Icei) ficou em 46,2 pontos em setembro de 2025, praticamente estável em relação a agosto (46,1 pontos), mas ainda abaixo da linha divisória de 50 pontos, o que indica falta de confiança. O resultado representa o nono mês consecutivo de pessimismo, a maior sequência negativa desde o início da série histórica.

No comércio, a retração foi ainda mais expressiva. Segundo a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), o Índice de Confiança do Empresário do Comércio (Icec) caiu 5% em setembro e alcançou 97,2 pontos, nível considerado de insatisfação (abaixo de 100 pontos). O resultado é o pior desde maio de 2021, no auge da pandemia de covid-19, quando o índice estava em 94,7 pontos.

Clima de incertezas

Na indústria, o recuo foi puxado pelo Índice de Condições Atuais, que caiu para 41,9 pontos. A piora da percepção das empresas (-1,3 ponto, chegando a 45,2) superou a leve melhora da avaliação da economia nacional (+0,5 ponto, para 35,3). Já o Índice de Expectativas teve pequeno avanço, de 0,5 ponto, chegando a 48,3, mas ainda no campo negativo.

Segundo Marcelo Azevedo, gerente de análise econômica da CNI, a estagnação reflete a dificuldade de recuperação. “Os empresários continuam com falta de confiança desde o início do ano. Isso significa que, em vez de ampliar investimentos, a tendência é adiar decisões de produção, contratações e modernização”, afirmou.

Azevedo destaca ainda que a taxa básica de juros (Selic) é um dos principais fatores que contaminam a confiança. “São nove meses de percepção negativa. Esse tempo prolongado tende a ter impacto mais forte nas decisões do empresário, refletindo em cortes de produção e investimentos”, explicou.

O comércio vive situação semelhante. A CNC aponta que em setembro 46% dos varejistas esperavam piora da economia, o maior percentual desde julho de 2020 (49,2%). O pessimismo afetou todos os componentes do índice: avaliação das condições atuais (-5%), expectativas (-7%) e intenções de investimentos (-2,6%). A queda mais acentuada ocorreu na intenção de contratação de funcionários, que recuou 4,2%.

De acordo com Fabio Bentes, economista-chefe da CNC, a combinação de juros altos e consumo em retração ajuda a explicar o movimento. “A Selic em patamar elevado desestimula investimentos, enquanto o enfraquecimento do mercado de trabalho e a redução da intenção de consumo das famílias freiam o comércio. Não por acaso, a intenção de contratação foi o subitem com maior queda em setembro”, afirmou.

Pressão sobre o setor madeireiro paraense

No Pará, onde estão 70% das florestas certificadas do Brasil, a queda de confiança tem impacto imediato no setor exportador de madeira. Segundo o diretor executivo da Associação das Indústrias Exportadoras de Madeira do Estado do Pará (Aimex), Deryck Martins, a instabilidade nacional repercute nas expectativas das empresas e na credibilidade junto a compradores internacionais.

“A incerteza econômica e a redução da confiança no mercado internacional levam as empresas a serem mais cautelosas em suas operações e investimentos”, avaliou.

Deryck lembra que os entraves burocráticos internos seguem como desafio adicional. “Problemas nos sistemas de licenciamento e barreiras no processo de exportação elevam custos de forma exponencial. Além disso, as oscilações na demanda internacional reduzem a previsibilidade e impactam planos de produção”, explicou.

Modernização em risco e caminhos possíveis

A falta de confiança também afeta investimentos em tecnologia e sustentabilidade. Martins aponta que muitas empresas evitam aplicar recursos em processos mais eficientes e sustentáveis, temendo não obter retorno em meio às incertezas.

“O setor já adota práticas como rastreabilidade e manejo florestal sustentável, mas ainda não há uma valorização internacional consistente desses diferenciais competitivos. Esse reconhecimento pode ganhar força à medida que cresce a pressão por sustentabilidade, mas hoje não é suficiente para compensar os riscos”, disse.

Para enfrentar o cenário, a Aimex defende políticas públicas que incentivem a ampliação das concessões florestais, certificação de produtos sustentáveis, desburocratização de processos e investimentos em infraestrutura logística. Do lado privado, Martins aposta em parcerias para inovação e capacitação, consideradas fundamentais para preservar a competitividade mesmo em períodos de baixa confiança.

No comércio, a CNC alerta que a tendência de retração pode comprometer a retomada do setor no fim do ano, tradicionalmente impulsionada pelas vendas de Natal. Para a indústria, a CNI reforça que sem uma recuperação consistente da confiança, os investimentos em modernização e expansão devem continuar represados.