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Com emprego e transferência de renda, rendimento sobe 70% e pobreza cai ao piso em 30 anos

Os avanços foram turbinados pelo aquecimento do mercado de trabalho e pela expansão e maior eficácia de programas de transferência de renda.

Estadão Conteúdo

Em três décadas, a renda média dos brasileiros cresceu cerca de 70%. A fatia da população sobrevivendo em situação de pobreza extrema baixou de 25% em 1995 para 4,8% em 2024, e a fatia na pobreza caiu de 61,2% para 26,8%, ambas em pisos históricos. Os avanços foram turbinados pelo aquecimento do mercado de trabalho e pela expansão e maior eficácia de programas de transferência de renda.

Os dados são da nota técnica "Pobreza e desigualdade no Brasil no curto e no longo prazo", divulgada nesta terça-feira, 25, pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O estudo analisa as mudanças na distribuição de renda no País entre 1995 e 2024, tendo como base informações de pesquisas domiciliares do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

"No longo prazo, os indicadores de renda, desigualdade e pobreza apresentaram avanços expressivos, embora o progresso tenha se concentrado em apenas dois períodos: os anos entre 2003 e 2014 e a retomada pós-pandemia, entre 2021 e 2024.

Ainda assim, o Brasil registrou, em 2024, os melhores números da série histórica das pesquisas domiciliares. Por meio de decomposições, mostramos que os ganhos distributivos dos últimos anos foram impulsionados, em igual medida, pelo aquecimento do mercado de trabalho e pela expansão das transferências assistenciais, que se tornaram mais efetivas no combate à pobreza e à desigualdade", ressaltaram os pesquisadores Pedro Ferreira de Souza e Marcos Hecksher, na nota do Ipea.

O coeficiente de Gini da renda domiciliar per capita de todas as fontes - indicador que mede a desigualdade de renda, numa escala de 0 a 100, em que, quanto mais perto de 100 o resultado, maior é a concentração de riqueza - recuou quase 18% em três décadas, passando de 61,5 em 1995 para 50,4 em 2024.

O estudo usou como referência as linhas de pobreza e extrema pobreza calculadas pelo Banco Mundial. A pobreza extrema é caracterizada por uma renda familiar per capita disponível inferior a US$ 3 por dia, o equivalente a um rendimento médio mensal de R$ 267 por pessoa em 2024, na conversão pelo método de Paridade de Poder de Compra (PPC) - que não leva em conta a cotação da taxa de câmbio de mercado, mas o valor necessário para comprar a mesma quantidade de bens e serviços no mercado interno de cada país em comparação com o mercado nos Estados Unidos. Já a população que vive abaixo da linha de pobreza é aquela com renda disponível de US$ 8,30 por dia, o equivalente a R$ 738 mensais por pessoa em valores médios de 2024.

"A combinação recente de crescimento econômico e menor desigualdade produziu progresso considerável contra a pobreza, que alcançou em 2024 o menor patamar da série histórica", apontaram os pesquisadores do Ipea. "Para as duas linhas, a rápida redução da pobreza desde o pior momento da pandemia decorreu da combinação virtuosa dos dois efeitos, isto é, do crescimento da renda média e da redução da desigualdade de renda entre 2021 e 2024."

A renda domiciliar per capita subiu 69,2% em três décadas, de R$ 1.191 em 1995 para R$ 2.015 em 2024.

"A recuperação da renda média nos últimos anos acompanhou a do PIB (Produto Interno Bruto) per capita, que voltou a crescer mais no Brasil do que no resto do mundo em 2022, 2023 e 2024, o que não ocorria desde 2013", observou a nota.

O emprego aquecido e o maior alcance das políticas de transferência de renda foram "igualmente importantes para esse excelente desempenho dos indicadores sociais nos últimos anos", apontaram os pesquisadores.

"Os avanços pós-pandemia estão associados a uma reversão no mercado de trabalho, que voltou a contribuir de forma decisiva para a redução da desigualdade e da pobreza, e à expansão das transferências assistenciais. No entanto, como o ciclo de expansão do PBF (Programa Bolsa Família) terminou, a contribuição dinâmica da assistência social perdeu fôlego no biênio 023/2024, refletindo somente mudanças marginais na focalização dos benefícios e sobretudo a expansão mais recente do BPC (Benefício de Prestação Continuada), cujas transferências são infelizmente mal captadas pela PNADC (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, do IBGE)".

Houve melhora considerável no Coeficiente de Gini no pós-pandemia, uma queda de 3,9 pontos entre 2021 e 2024: 49% dessa redução da desigualdade partiu do aquecimento do mercado de trabalho e 44% das transferências de renda.

"Os benefícios previdenciários e as outras rendas desempenharam papel apenas residual. Esse padrão muda se olharmos apenas para o último biênio da série: cerca de metade da redução de 1,2 ponto de Gini continua associada ao mercado de trabalho, mas a contribuição das transferências assistenciais foi bem menor (-0,2 ponto de Gini, ou 16% da queda), ficando atrás dos benefícios previdenciários (-0,3 ponto, ou 22%)", frisou o estudo.

O levantamento estima que o ritmo de melhora dos indicadores sociais possa arrefecer nos próximos anos, diante do fim do ciclo recente de expansão das transferências assistenciais. Nesse cenário, os avanços ficariam mais dependentes da evolução do mercado de trabalho.

"Todos os nossos resultados foram obtidos com base em pesquisas domiciliares, que são a melhor fonte para o monitoramento anual da distribuição de renda, mas também possuem limitações bem conhecidas. Por um lado, pesquisas domiciliares mundo afora tendem a subestimar os montantes transferidos por benefícios assistenciais, e isso ocorre também no Brasil. Por outro, essas pesquisas subestimam fortemente os rendimentos dos mais ricos. Não fizemos nenhum ajuste para mitigar esses problemas devido à falta de informações e de métodos amplamente aceitos. O aprimoramento das estatísticas sobre a distribuição de renda é um desafio premente não só para o Brasil, mas também mundo afora", ponderaram os autores.