Alepa apresenta plano com 60 propostas para enfrentar crise do açaí e garantir acesso ao alimento
Relatório do Grupo de Trabalho da Assembleia Legislativa do estado propõe políticas públicas para regular mercado, fortalecer produtores e tornar o açaí acessível para a população mais vulnerável.
Será apresentado nesta quinta-feira (8/10), na Assembleia Legislativa do Pará (Alepa), o relatório final do Grupo de Trabalho sobre a Crise do Açaí. O documento reúne 60 recomendações para enfrentar os principais desafios da cadeia produtiva do fruto mais simbólico da cultura paraense, que vai da produção à comercialização e à segurança alimentar. Entre as propostas estão a criação de um fundo estadual, políticas de segurança fluvial, preço mínimo, inclusão do açaí na cesta básica via voucher e ações para conter os efeitos das mudanças climáticas nos açaizais.
O Grupo Liberal teve acesso exclusivo ao relatório final e conversou com nesta terça (7/10) com o deputado estadual Carlos Bordalo (PT), presidente da Comissão de Direitos Humanos, Defesa do Consumidor, Defesa das Pessoas com Deficiência, da Mulher, da Juventude, da Pessoa Idosa e das Minorias (CDHDC) da Alepa.
Açaí: cultura alimentar ameaçada
Segundo Bordalo, o Pará vive um paradoxo. Apesar de produzir mais de 90% do açaí consumido no Brasil e exportado para o mundo, enfrenta anualmente uma crise de abastecimento na entressafra, que eleva os preços e afasta o fruto da mesa da população de baixa renda. A escassez levou a Assembleia Legislativa do Estado (Alepa) a criar um grupo de trabalho que agora apresenta um conjunto de medidas concretas para resolver o problema.
“A primeira grande conclusão do relatório é que estamos diante de uma cultura alimentar gigantesca que virou commodity. Mas com isso vieram crises recorrentes de preço e inacessibilidade”, afirma o deputado e coordenador do GT do Açaí.
Efeitos do clima e pressão sobre os açaizais
O relatório aponta que as mudanças climáticas vêm afetando diretamente a produção de açaí no estado. Os açaizais plantados, que hoje representam a maior parte da produção, exigem irrigação constante, mas muitos produtores não têm acesso a recursos para lidar com os períodos de estiagem.
“O verão forte e a falta de água estão levando produtores a perder plantações inteiras”, alerta Bordalo. “Por outro lado, há também risco de abandono dos açaizais nativos, que são fundamentais para a biodiversidade.”
A proposta é criar o Fundo Estadual do Açaí, com recursos para irrigação, capacitação técnica, compra de equipamentos e incentivo à produção sustentável.
Propostas para o campo e para a cidade
O relatório está dividido em três eixos temáticos: produção, comercialização e temas transversais. Cada um aborda pontos críticos da cadeia do açaí e propõe soluções coordenadas.
Eixo 1 – Produção
- Criação do Programa Estadual de Segurança Rural e Fluvial;
- Implantação do Plano de Formação Técnica do Açaí;
- Acesso a linhas de crédito específicas para pequenos produtores;
- Incentivo a miniusinas comunitárias;
- Fiscalização contra o trabalho infantil na produção.
A insegurança nas regiões produtoras também preocupa. Segundo Bordalo, a valorização do açaí atraiu assaltantes e grupos criminosos.
“As comunidades ribeirinhas, especialmente no Marajó e Baixo Tocantins, reclamam da insegurança nas rotas fluviais”, diz. Como resposta, o relatório sugere a expansão de bases fluviais da polícia.
Eixo 2 – Comercialização
- Criação de Política Estadual de Preço Mínimo;
- Inclusão do açaí nos programas federais PAA e PNAE;
- Criação do Defeso do Açaí, com compensação na entressafra;
- Implantação de pontos de venda padronizados com refrigeração;
- Apoio a plataformas digitais de comercialização.
Para Junior Lima, que possui um ponto de venda de açaí em Belém, as propostas podem ajudar a organizar o setor. “A legalização dos pontos de venda é urgente. Na entressafra, tem gente que fecha as portas. Toda ajuda é bem-vinda”, afirma.
O relatório também denuncia a ausência de estoques reguladores no Estado.
“A indústria produz polpa para o mercado externo, e o consumo interno fica desabastecido. O resultado: falta açaí para comer”, resume Bordalo.
Eixo 3 – Segurança alimentar, cultura e governança
- Inclusão de 250 ml de açaí por dia na cesta básica, via voucher social;
- Criação de um órgão estadual específico para a cadeia do açaí;
- Implantação do Museu do Açaí, como espaço de memória e educação;
- Formação de um Comitê de Monitoramento com participação social.
A ideia do voucher, segundo Bordalo, é garantir que famílias de baixa renda tenham acesso diário ao alimento.
“O açaí pode ser um estabilizador nutricional. Com uma tigela de açaí por dia, proteína e farinha d’água, temos uma das dietas mais completas do mundo”, defende o deputado.
Caminho para transformar propostas em lei
A maior parte das recomendações do GT do Açaí deve ser apresentada como projetos de lei ou programas de governo. Para Bordalo, o objetivo é tirar o Pará da lógica da crise pontual e construir uma política pública permanente para a cadeia do açaí.
“Estamos oferecendo ao poder público um compêndio de propostas que vão do campo à mesa. Não dá mais para enfrentar essa crise de forma improvisada. Precisamos garantir produção sustentável, segurança para quem colhe e acesso justo para quem consome”, conclui.
Palavras-chave